As músicas são instrumentos de sensibilização na educação ambiental escolar, como explica o pesquisador da pós-graduação em meio ambiente e desenvolvimento regional da Universidade Anhanguera-Uniderp João Paulo Abdo.

“As canções que retratam temas ambientais podem criar fortes relações de pertencimento entre os educandos, que passam a perceber melhor a relação humana com o ambiente e a necessidade de conservá-lo”, destaca.

“A música   também ajuda a atribuir significados à realidade, contestando a irresponsabilidade humana frente ao equilíbrio ambiental do planeta, gerando engajamento socioambiental e desenvolvendo o senso crítico dos discentes”, complementa.

Geógrafa e doutora em ciências, Eltiza Rondino Vasques lembra que o potencial pedagógico das músicas é amplo na educação ambiental: podem ser apresentadas em todas as etapas de ensino e focando em diferentes temas.

“Geralmente, elas dialogam com temas como água, ar, solo, fauna e flora, além de formas de preservação”, lista.

“Há ainda mudanças climáticas, história, cultura, sustentabilidade, desenvolvimento sustentável, degradação ambiental, resíduos e poluição”, acrescenta a pós-doutora em meio ambiente e desenvolvimento regional pela Universidade Anhanguera-Uniderp Giselle Marques de Araujo.

Além disso, a interdisciplinaridade prevista na educação ambiental pode ser explorada.

“Em língua portuguesa, pode-se trabalhar interpretação de texto; em biologia, abordar intervenções nos ecossistemas e seus impactos nos seres vivos, assim como a importância da preservação e conservação da biodiversidade; em geografia, avaliar os impactos de diferentes modelos socioeconômicos no uso dos recursos naturais e na promoção da sustentabilidade econômica e socioambiental do planeta”, exemplifica Vasques.

Atividades de reflexão e criação

Como atividades, Vasques propõe trabalhos em grupo nos quais os estudantes podem ouvir a música, avaliar pontos das letras e discuti-los entre si. “A partir daí, eles conseguem propor ações que minimizem os impactos negativos trazidos pelas canções e expor seus resultados aos colegas”, acrescenta.

Outra opção é pedir aos alunos que tragam músicas que dialoguem com uma questão ambiental previamente estudada.

“Isso faz com que eles sejam protagonistas, pois buscam, a partir do tema, aquilo que lhes parece mais real e, consequentemente, constroem seu próprio conhecimento, incorporando as informações adquiridas”, enfatiza.

Biólogo e professor da pós-graduação em meio ambiente e desenvolvimento regional da Universidade Anhanguera-Uniderp, Ademir Morbeck sugere também que os próprios alunos produzam letras e músicas. “Quando em grupo, a atividade de construção de uma canção favorece a cooperação”, pontua.

Para Vasques, é importante que os alunos gerem um resultado final da atividade. “Como a elaboração de um mapa conceitual, um texto ou um desenho que configure o que foi estudado e que permita que o aluno assimile o que foi aprendido”, orienta.

Confira abaixo nove canções que podem ser trabalhadas nas aulas de educação ambiental.

1) “Planeta Água”, de Guilherme Arantes

A canção exalta a importância da água no ecossistema terrestre, enfatizando sua trajetória desde a nascente até se transformar em correntezas e reservatórios. Também sugere a ambivalência desse elemento: sustenta a agricultura e hidrata os humanos, mas também pode ser um elemento devastador por meio das inundações. “Assim, pode servir como base para discussão sobre os recursos hídricos”, lembra Morbeck.

“Destaque para o trecho: ‘Gotas de água da chuva/ Alegre arco-íris, sobre a plantação/  Gotas de água da chuva / Tão tristes, são lágrimas na inundação /  Águas que movem moinhos / São as mesmas águas que encharcam o chão / E sempre voltam humildes pro fundo da terra ‘’’”, acrescenta o professor.

2) “Rio Paraguai”, de Geraldo Roca

A música pode ser inserida durante o ensino sobre o bioma pantanal. Ela homenageia o Rio Paraguai e a sua relevância sobre o desenvolvimento histórico da região. Incluindo também processos coloniais; guerras; tradições culturais como o banho de São João. “É fonte de recurso para comunidades que habitam sua margem”, explica a pesquisadora da pós-graduação em meio ambiente e desenvolvimento regional da Anhanguera-Uniderp Rosemary Matias.

“A canção também faz crítica à indústria poluidora das águas do rio e aos impactos ambientais negativos devido à exploração ambiental intensa na região do Pantanal”, complementa Abdo.

3) “Amor e Guavira”, de Tetê Espíndola e Carlos Rennó

A música pode ser utilizada durante as aprendizagens sobre o Cerrado. Araujo explica que é possível situar elementos da flora desse bioma, no qual o objeto de destaque é um fruto nativo da região: a guavira. “Há ainda referências que ressaltam a grandiosidade do cerrado”, diz.

4) Bichos do mar, Lenine

Vasques indica essa música para trabalhar a fauna. “Destaque para a conservação das tartarugas”, explica. Também é possível abordar o papel dos animais nos equilíbrios dos mares e oceanos. Entre os trechos que podem ser trabalhados com os alunos está: “Vi o camarão limpando o oceano, enquanto as pessoas iam só sujando”.

5) “Passaredo”, de Chico Buarque

“A música traz diversas espécies de pássaros e suas ameaças pelas ações humanas”, sintetiza Vasques. “Voa, bicudo / Voa, sanhaço / Vai, juriti / Bico calado/ Muito cuidado/ Que o homem vem aí”, diz um trecho.

6) “Planeta Azul”, de Chitãozinho & Xororó.

“A música alerta para as mudanças que estão ocorrendo no planeta Terra devido às interferências dos homens, com trechos como ‘Os peixes morrendo nos rios / estão se extinguindo espécies animais’”, diz Vasques. Há ainda referências às mudanças climáticas: “Se invertem as estações do ano / Faz calor no inverno e frio no verão”.

7) “Xote Ecológico”, de Luiz Gonzaga

A canção aborda a poluição causada no planeta e suas consequências. No artigo “O xote ecológico de Luiz Gonzaga e a educação ambiental na escola: uma experiência com alunos do ensino fundamental” (2012), o professor de geografia Joel Maciel Pereira Cordeiro utilizou algumas perguntas para a discussão com os alunos, que foram previamente divididos em grupos. Entre elas:

  • Quais elementos presentes na letra da música “Xote ecológico” estão relacionados com o tema meio ambiente?
  • Como podemos garantir o desenvolvimento sustentável sem que haja a degradação ambiental?
  • O que se pode fazer, na concepção do grupo, para garantir a qualidade de vida e a preservação ambiental no planeta?
  • A partir do entendimento do grupo sobre meio ambiente, adquirido com o auxílio da música e das discussões realizadas em sala de aula, comente a expressão “pensar globalmente e agir localmente”.
  • Quais elementos que aparecem na letra da música podem ser relacionados ao espaço local vivenciado pelo grupo?
  • Na opinião do grupo, quem são os principais responsáveis pelos danos ambientais presentes no espaço local?
  • Que atitudes podem ser tomadas para amenizar a degradação ambiental no espaço local?

8) “Sobradinho”, de Sá e Guarabira

“A música traz a história da construção da hidrelétrica de Sobradinho (BA) e suas consequências”, aponta Vasques. Um trecho que pode ser abordado é “Adeus, Remanso, Casa Nova, Sento-Sé / Adeus, Pilão Arcado, vem o rio te engolir / Debaixo d’água, lá se vai a vida inteira / Por cima da cachoeira, o gaiola vai subir/ Vai ter barragem no salto do Sobradinho / E o povo vai-se embora com medo de se afogar”.

9) “Quede água”, de Lenine e Carlos Rennó

Esse plano de aula utiliza a música “Quede água” como ponto central para analisar os impactos das mudanças climáticas locais, como o agravamento das estiagens, assim como as consequências sociais dessas transformações.

Veja mais:

Como trabalhar as mudanças climáticas de forma interdisciplinar?

Livros didáticos abordam mudanças climáticas de forma deficitária, acredita pesquisadora

Educação ambiental decolonial: o que é e como trazê-la para a escola?

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