Publicado em
29 de julho de 2015
“As desigualdades sociais impactam diretamente na garantia do direito à educação” (Crédito: divulgação)
A educação precisa superar as desigualdades sociais herdadas do passado e ainda se alinhar às inovações do futuro. Esta é a opinião de Maria Alice Setubal, socióloga e presidente do conselho de administração do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). “O Brasil já tem um caminho a seguir nos próximos dez anos: o Plano Nacional de Educação (PNE). Ele é fruto de ampla participação social e oferece um mapa dos principais problemas a serem enfrentados”, descreve. Confira abaixo a entrevista exclusiva para o NET Educação.
NET Educação – Como você avalia atualmente o Brasil em termos de educação e políticas públicas?
Maria Alice Setubal – Houve avanços, mas ainda há muito por fazer. Historicamente, as desigualdades sociais impactam diretamente na garantia do direito à educação no país. As pesquisas e os indicadores educacionais demonstram que aqueles que estão fora da escola, em situação de atraso escolar ou nos níveis mais baixos de proficiência nas avaliações externas são os pobres, negros, filhos de pais com baixa escolaridade e moradores do campo e das periferias dos grandes centros urbanos. Precisamos de uma educação que supere os problemas básicos não resolvidos do século 20 e aponte, ao mesmo tempo, para as inovações necessárias do século 21. Essa é uma tarefa gigante que exige a mobilização de toda sociedade.
NET Educação – O que destacaria entre as desigualdades a serem enfrentadas?
Maria Alice – O Brasil ainda tem entre a população com 15 anos ou mais um dos maiores contingente de analfabetos da América Latina, em números absolutos. As escolas de periferia, por exemplo, têm inúmeras demandas que são de saúde e de assistência social. Essas demandas precisam sair do âmbito da escola, para ela se concentrar na educação. Por outro lado, você precisa apoiar mais as escolas situadas em territórios vulneráveis, dar mais para quem tem menos. Se você dá bônus apenas para quem vai bem, só aumenta a desigualdade.
NET Educação – Para onde se deve “direcionar o barco” do país quando se fala em educação?
Maria Alice – O Brasil já tem um caminho a seguir nos próximos dez anos: o Plano Nacional de Educação (PNE). Ele é fruto de ampla participação social e oferece um mapa dos principais problemas a serem enfrentados. Apesar das críticas ao plano, sua aprovação indica um grande desejo da sociedade civil por políticas de estado, e não de governo. Por isso, o PNE pode e deve ser o principal norteador das ações em todas as esferas do governo. Não se trata de uma tarefa simples, pelo contrário, exige mais recursos, gestão eficaz e controle social.
NET Educação – E estamos fazendo isso?
Maria Alice – Não há muito que comemorar um ano após a aprovação do PNE. Estamos imersos em um cenário de crise econômica e política, com graves impactos na educação. O corte de R$ 9,42 bilhões no orçamento do MEC [Ministério da Educação] traz dúvidas sobre o lema “Pátria Educadora” (https://www.neteducacao.com.br/noticias/home/brasil-patria-educadora). O Brasil cumpriu parcialmente o prazo para que municípios e estados aprovassem seus planos de educação, que expirou em junho [de 2015]. O MEC não apresentou até agora um conjunto de medidas que induzam estados e municípios a se comprometerem com as metas.
NET Educação – Quais são os desafios em termos de recursos, já que o país entrou em uma situação econômica delicada?
Maria Alice – O ajuste fiscal não pode paralisar as políticas educacionais, cujos resultados são de médio e longo prazo, sob o risco de prejudicar o futuro de milhares de alunos. Um em cada quatro professores em exercício não tem curso superior. As redes de ensino não cumprem a lei do piso e o rendimento médio dos nossos docentes ainda representa 60% dos demais profissionais com a mesma formação. Sem ampliar os recursos, não é possível superar esses gaps. Precisamos discutir o CAQi (Custo Aluno Qualidade Inicial). Ele é um instrumento fundamental que define o investimento mínimo na educação para o enfrentamento das desigualdades.
NET Educação – Quais devem ser hoje as prioridades?
Maria Alice – Além da elaboração e aprovação dos planos estaduais e municipais, há outras metas importantes que precisam ser cumpridas neste e no próximo ano, como a implementação do CAQi, o Sistema Nacional de Educação, a política nacional de formação de professores e universalizar, até 2016, a educação infantil, a pré-escola para as crianças de quatro a cinco anos de idade e o ensino médio para jovens de 15 a 17 anos.
NET Educação – Como acredita que deva ser a escola do futuro?
Maria Alice – Os jovens reclamam da falta de sentido e da desconexão entre o que aprendem em sala e aquilo que vivenciam fora dela. Esse cenário revela um grande desafio para a educação contemporânea: oferecer uma escola aberta às questões da atualidade, às novas tecnologias e à comunidade, que seja um espaço do encontro e do diálogo, que priorize a construção coletiva do conhecimento e que seja, portanto, um centro irradiador de novos saberes.
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