Seja por dor, sensibilidade ou para uma avaliação preventiva, uma consulta ao dentista já foi ou será necessária a toda criança e adolescente. No consultório, os materiais e procedimentos utilizados revelam processos químicos que podem ser explorados nas aulas de química do ensino médio.
“A química está presente na odontologia na limpeza dentária, na estrutura dos dentes, nos materiais restauradores, no clareamento dentário, na esterilização de materiais, nos materiais de moldagem, na revelação de filmes radiográficos, nos anestésicos locais, entre outros”, resume a química e mestra em educação em ciências Greyce Arrua Storgatto, coautora do artigo “A química na odontologia” (2017).
Segundo a mestranda em química Gabriela Fagundes Correia, entre os conteúdos curriculares do ensino médio que a química na odontologia pode trabalhar estão reações químicas. “Em específico, reações orgânicas e a de mineralização e desmineralização, bem como equilíbrio químico. Outras possibilidades são os tópicos como acidez, basicidade, pH, soluções e concentração”, lista.
Saúde bucal
Trazer para a sala de aula o tema da química na odontologia também é uma oportunidade para trabalhar saúde bucal com os alunos.
“Para grande parte dos estudantes de escola pública, o acesso a especialistas se dá por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) e, por inúmeros motivos, nem sempre ele acontece. Ao trazer o tema para a sala de aula, é possível esclarecer dúvidas e refletir sobre a necessidade de atentarmos aos sinais da nossa saúde bucal e de buscar esses profissionais”, reforça Correia.
A seguir, confira cinco temas presentes na ida ao dentista que podem ser relacionados a conteúdos de química no ensino médio.
1) Cáries
O tema pode ser trabalhado junto ao tópico de equilíbrio de reações químicas, conforme aponta Correia no artigo “Química na odontologia: uma proposta para o ensino de pH e soluções para o ensino médio” (2023).
“Caso das reações de mineralização e desmineralização que ocorrem nos nossos dentes o tempo todo e que possuem suas velocidades afetadas por diferentes fatores. Assim, trabalhe com os estudantes o motivo pelo qual comer doces e não fazer a correta higienização pode causar cárie, ou seja, favorecer a reação de desmineralização do dente”, diz Correia.
Dentro desse tópico, destaque a importância do pH para a saúde bucal.
“A reação de desmineralização é impactada pelo pH bucal. Um pH baixo, ou seja, um meio mais ácido, favorece essa reação que, por sua vez, danifica o esmalte do dente, deixando-o mais exposto, desprotegido e suscetível a bactérias”, ensina Correia, que sugere uma atividade com alunos para medir o pH de diferentes alimentos e bebidas.
“A partir do valor encontrado, discutir como cada um pode influenciar na saúde e na reação de desmineralização”, relaciona.
“Vale ainda avaliar os rótulos de diferentes marcas de cremes dentais e enxaguantes e convidar um profissional da área para palestrar sobre esse tema”, completa Correia.
2) Restauração
A obturação é aquele procedimento que preenche cavidades nos dentes causadas por cáries para restaurar sua forma e função. Entre os materiais utilizados no procedimento estão amálgama (liga metálica), resina e compósitos de cerâmica.
“Por meio deles, podemos trabalhar características dos metais, nomenclatura de sais e óxidos, polímeros e reações de polimerização”, opina Storgatto.
“É possível discutir reações químicas, balanceamento e estequiometria, além de substâncias orgânicas e inorgânicas”, complementa Correia.
3) Radiografia
Esse exame de imagem é realizado com raios X, que visualizam a estrutura dos dentes e ossos da mandíbula. Assim se detectam problemas como cáries, infecções e alterações nos dentes e ossos invisíveis a olho nu.
Storgatto indica explorar o uso de filmes ou sensores digitais que reagem aos raios-X para criação da imagem radiográfica.
“Relacione a radiografia ao tema de reações químicas; nomenclatura e estrutura de funções orgânicas; composição química do revelador, do fixador, do filme radiográfico; pH, reações de oxirredução e ácidos e bases”, adiciona.
Além disso, por ser o raio x uma forma de radiação eletromagnética, Correia sugere trabalhar o assunto de forma interdisciplinar ao lado da disciplina de física.
4) Anestesia
É a técnica utilizada para impedir a sensação de dor durante procedimentos cirúrgicos, geralmente via injeções de substâncias como lidocaína, prilocaína, mepivacaína, bupivacaína, entre outras. “Relacione a temática aos compostos orgânicos e estruturas químicas, nomenclatura e grupos funcionais”, recomenda Correia.
5) Enxaguante bucal
O produto é um bom ponto de partida para falar de reações, estruturas de cadeias e identificação de funções orgânicas
“Apresente aos estudantes a cadeia do mentol (C10H20O), constituinte do óleo essencial da hortelã. A identificação de álcool no mentol pode ser feita utilizando reagente de Jones (CrO3/H2SO4)”, pontua Storgatto.
Já Correia recomenda trabalhar as características do flúor e seu papel na saúde bucal, assim como soluções e cálculos da sua concentração em produtos.
“Explore e compare o rótulo dos enxaguantes e busque outras aplicações para os compostos presentes. O mentol não está necessariamente presente em todos os enxaguantes, e a razão disto também pode ser explorada com a turma”, finaliza Correia.
Veja mais:
Química decolonial: professores relacionam currículo com saberes africanos e indígenas
Como utilizar a culinária afrodiaspórica no ensino de química?
Química verde: ambiente virtual e oficinas temáticas ajudam a apresentar tema no ensino médio
Química na prática: atividades com fabricação de perfume e sorvete podem motivar alunos
Química e artes: tintas, corantes e jogos de tabuleiro são opções para projetos interdisciplinares
Crédito da imagem: Tom Werner – Getty Images