O teatro é uma ferramenta importante para o ensino da educação ambiental na escola, explica a mestra em ciências ambientais e conservação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Amanda Batista da Silva Vitório.

“O processo de montagem da peça, que inclui criação, roteiros e ensaios, é intenso e traz reflexões e questionamentos. Quando essa peça fala especificamente de questões ambientais, ela direciona todo esse potencial para o modo como lidamos com a natureza. E a partir desses questionamentos, é possível transformar a realidade”, analisa.

Por meio dessa manifestação artística, diferentes temas podem ser trabalhados com a turma visando conscientização, incluindo: justiça climática e ambiental; racismo ambiental; água e saneamento básico; lixo e resíduos sólidos; fauna, flora e biodiversidade; desmatamento; uso e ocupação do solo; agricultura sustentável; agroecologia; povos e comunidades tradicionais, entre outros.

“Há ainda os temas atualidade, como emergência climática, consumo exacerbado dos recursos naturais, a produção de resíduos, formas de reaproveitamento e reciclagem. Esta última podendo ser incorporada aos cenários, figurinos e adereços utilizados na peça”, afirma a professora da licenciatura em ciências naturais e biológicas na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) Lia Maris Orth Ritter Antiqueira.

“Além disso, conteúdos de artes e de diferentes disciplinas que dialogam com a educação básica também podem ser ensinados”, acrescenta o professor do curso de Licenciatura em Teatro da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) Alexandre Falcão de Araújo.

Os docentes entrevistados listam 13 dicas para usar o teatro no ensino da educação ambiental.

1) Parta da realidade local para escolher o tema da peça

“É importante observar a natureza e o entorno dos alunos. Assim, pergunte como é o saneamento básico, coleta de lixo, separação de lixo, qualidade do ar ou se há árvores na rua deles”, orienta Vitório.

2) Dinâmicas ajudam a identificar os temas

Araújo recomenda levantar os temas a partir de uma metodologia chamada Oficina do Futuro, desenvolvida pelo Instituto Ecoar para a Cidadania. “Nela, os estudantes usam Árvore dos Sonhos e seu Muro das Lamentações em relação à realidade socioambiental local. Na sequência, realizam-se jogos teatrais a partir dos temas levantados nessas atividades”, ensina.

Uma segunda alternativa são as rodas de conversas com alunos e demais membros da comunidade escolar. “Identifique as dificuldades que precisam ser enfrentadas, assim como os pontos fortes que devem ser considerados e reforçados de forma positiva”, sugere Antiqueira.

3) Relacione os temas locais com questões globais

Vitório explica que, a partir de questões locais, pode-se investigar respostas globais. “Assim, fazemos um caminho do local até chegar em uma escala urbana da cidade, do estado, do país e também planetária”, completa.

“Ensinar sobre a importância da Amazônia é tão relevante quanto economizar a água das torneiras na escola e em casa”, exemplifica Antiqueira.

4) Monte a dramaturgia com os alunos

A partir dos temas identificados, Araújo recomenda trabalhar a improvisação teatral. Após as cenas serem levantadas, elas podem ser “amarradas” em uma história.

“Em minha experiência, isso funciona melhor do que montar textos dramatúrgicos existentes, uma vez que o tempo é escasso e a montagem pode ser tediosa para crianças e adolescentes”, compartilha.

5) Utilize diferentes jogos teatrais

“Em relação às metodologias teatrais, o Sistema de Jogos Teatrais – da pedagoga teatral estadunidense Viola Spolin –, pode ser um bom caminho para os anos iniciais e finais do ensino médio, assim como o drama como método de ensino, linhagem britânica que no Brasil foi bastante desenvolvida pela professora Biange Cabral”, indica Araújo.

Para os anos finais e ensino médio, o professor recomenda as técnicas do Teatro do Oprimido, sistematizadas por Augusto Boal.

“Considero adequada a técnica de Teatro Fórum para trabalhar com conflitos socioambientais. Use também o Teatro Jornal, que parte de reportagens recentes ou antigas disponíveis na internet”, destaca.

6) Inspire-se em livros e textos com temáticas socioambientais

Araújo explica que ainda há poucas dramaturgias publicadas na temática socioambiental. Ele recomenda a peça infantojuvenil “O bicho homem e outros bichos”, de Ary Pára-Raios, do grupo Esquadrão da Vida (Brasília/DF).

“Outra sugestão são as produções do Coletivo Alma, de São Paulo. Neste caso, alguns textos podem ser encontrados em minha dissertação de mestrado”, indica.

“Outra opção é inspirar-se em livros infantis ou infantojuvenis de temática socioambiental e, a partir de improvisações, criar cenas, coreografias etc.”, complementa.

“No caso de montagens escolares de textos, não é preciso se preocupar com direitos autorais, pois são montagens sem fins lucrativos e a legislação garante o direito de uso dos textos nesses casos”, explica Araújo.

7) Aproveite a interdisciplinaridade do projeto

Por ser a própria educação ambiental uma área interdisciplinar, diversas disciplinas podem ser envolvidas em um projeto de montar uma peça de teatro com os alunos.

“Língua portuguesa pode estar relacionada ao processo de escrita da dramaturgia; artes, na montagem de cenário; geografia para contextualizar o local em que a peça está; biologia, sobre o tipo de ecossistema que existe ali, entre outras”, sugere Vitório.

8) Língua portuguesa: trabalhe contagem de histórias e comparações entre gêneros

“No caso de língua portuguesa, é previsto nos anos iniciais do ensino fundamental o conteúdo de contagem de histórias, que pode ser trabalhado”, orienta Araújo.

“Nos anos finais e ensino médio, há o conteúdo ‘reconstrução da textualidade e compreensão dos efeitos de sentidos provocados pelos usos de recursos linguísticos e multissemióticos’. Pode-se comparar as abordagens de determinada situação socioambiental da grande imprensa com outra peça, assistida ao vivo ou em vídeo, sobre o assunto”, completa.

9) Geografia: investigue paisagens e estar no mundo

Em geografia, nos anos iniciais, Araújo sugere trabalhar na peça a unidade temática “O sujeito e seu lugar no mundo”. É possível criar pequenas cenas, a partir de jogos teatrais, demonstrando os modos de vida de crianças em cidades pequenas, metrópoles, aldeias indígenas, na zona rural etc.”, sugere.

Nos anos finais e ensino médio, o professor sugere a unidade temática “Natureza, ambientes e qualidade de vida”. “É possível criar cenas – usando o Teatro Fórum ou Teatro Jornal – inspiradas nos conflitos socioambientais relacionados à transformação da paisagem”, diz Araújo.

10) História: cenas sobre espaços públicos e privados

Na disciplina, para os anos iniciais do ensino fundamental, Araújo recomenda trabalhar, por meio da criação de cenas e jogos teatrais, a unidade temática “A cidade, seus espaços públicos e privados e suas áreas de conservação ambiental”.

Nos anos finais e ensino médio, explore a unidade temática “Os conflitos do século XXI; pluralidades e diversidades identitárias na atualidade”. “É possível trabalhar as pautas dos povos indígenas no século XXI e suas formas de inserção no debate local, regional nacional e internacional. Sugiro a técnica de Teatro Jornal, conforme sistematização de Augusto Boal”, acrescenta.

11) Explore a ludicidade na peça

“Trabalhar com teatro é permitir também a imaginação, a metáfora, a fabulação e a ficção. Assim é possível ‘humanizar’ animais ou elementos da natureza para que assumam protagonismo em cena”, indica Araújo.

“Porém, isso não significa retirar a responsabilidade dos seres humanos em relação à degradação ambiental e à necessidade de proteger e recuperar o meio ambiente”, acrescenta.

12) Além da atuação, use também bonecos

“O teatro de fantoches é interessante de captar a atenção das crianças menores, que se sentem cativadas pelos personagens que ganham vida para tratar os diferentes temas”, indica Antiqueira.

13) Conheça coletivos artísticos que trabalham com a questão ambiental

Araújo recomenda aos professores pesquisarem como grupos teatrais trabalham com a questão ambiental. Ele indica o Coletivo Estopô Balaio e Coletivo Aliança Libertária Meio Ambiente (Alma), ambos de São Paulo (SP); Grupo Experimental de Teatro Vivarte, de Rio Branco (AC); Cia Arteatro, de Boa Vista (RR); Árvore Casa das Artes, de Vitória (ES); Esquadrão da Vida, de Brasília (DF); Cia Vitória Régia, de Manaus (AM); Coletivo 2×3 Poéticas de Aproximação, de São Leopoldo (RS).

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Crédito da imagem: Freepik.com

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