O cinema permite aos alunos criarem uma imagem sobre o passado, ainda que ficcional.  “No caso específico da história do Brasil, o audiovisual consegue trazer para o presente e aproximar figuras e episódios com os quais os estudantes já têm contato por serem lembrados em feriados, nomes de rua ou estarem presentes nos livros didáticos”, explica o professor do mestrado profissional de história na Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) e autor do livro “História das Américas através do cinema”, Flávio Vilas Boas Trovão.

Em termos curriculares, a história do Brasil é trabalhada durante todo o ensino fundamental II e aprofundada no ensino médio.

“No primeiro caso, a melhor opção didática pode ser passar trechos dos filmes ou dividi-los em diferentes exibições do que [exibi-los] inteiros, em único momento”, complementa. “Além disso, o recorte de trechos pode ser uma opção caso o filme tenha uma classificação indicativa superior ao ano em que o conteúdo será trabalhado”, acrescenta Trovão.

Diferentes pontos de vista

Doutor em história e professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Alcides Freire Ramos indica apresentar aos alunos mais de um filme sobre o mesmo período histórico. Caso, por exemplo, das produções sobre a inconfidência mineira: “Tiradentes, Mártir da Independência” (1977); “Rebelião em Vila Rica” (1958); “Ladrões de cinema” (1977) e “Os Inconfidentes” (1972).

“A principal contribuição é facilitar a compreensão a respeito da historiografia da inconfidência mineira e o modo como ela foi revisitada, de diferentes formas, pelos cineastas, de acordo com distintas concepções políticas e ideológicas”, justifica Ramos.

“Assim, oferecem ao educador e aos alunos uma excelente oportunidade para pensar a respeito das diferentes concepções de história e das formas de usar as fontes primárias”, acrescenta.

Nessa mesma perspectiva, Trovão indica utilizar o filme “Getúlio” (2014) aliado a “Olga” (2004).

“O primeiro é uma cinebiografia que problematiza o lado heroico do ex-presidente Getúlio Vargas, enquanto o segundo – sobre a militante comunista alemã e judia Olga Benário – mostra o alinhamento de Vargas com o regime nazista, que culmina com a entrega de Olga Benário aos alemães”, contextualiza.

Já o doutorando em história social e mestre em história da Arte pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Roney Jesus Ribeiro também recomenda trabalhar filmes que abordam a mulher em contextos distintos na história do país.

“Por exemplo, em ‘Desmundo’ (2005), as mulheres são produtos de troca por meio das artimanhas da igreja católica e da coroa portuguesa. Em ‘Carlota Joaquina’ (1995), a mulher já ocupa um lugar de poder, como a princesa do Brasil. Em ‘Xica da Silva’ (1976), uma mulher escravizada se casa como um homem que tem prestígio social e sai da margem para uma vida mais digna e de luxo”, lista.

Fontes históricas

Os filmes sobre história do Brasil podem ser associados a outras fontes históricas.

“Por exemplo, a cartas, diários, jornais, documentos oficiais e outras fontes primárias, que são materiais escritos ou visuais produzidos durante o período em questão. O mesmo vale para entrevistas e testemunhos que viveram os eventos retratados ou visitas a museus e exposições”, orienta Ramos.

Trovão recomenda utilizar fotografias, cartografias e documentos oficiais disponíveis no site Domínio Público ou materiais da Plataforma de Recursos Educacionais do Ministério da Educação (MEC).

“Ao abordar a colonização do Brasil, dá para trazer trechos da carta de Pero Vaz de Caminha e pinturas feitas pelos artistas que visitaram a colônia. Em relação à escravidão, os filmes podem ser associados às fotografias que retrataram os últimos escravos antes da Lei Áurea”, orienta Trovão.

Conheça abaixo oito filmes para trabalhar a história do Brasil no ensino fundamental II e médio.

1) A missão (1986)

No século XVII, um ex-mercador de escravos se torna padre e se alia a um jesuíta interessado em defender os indígenas. “A produção enfoca as missões jesuítas guaranis na região de Foz de Iguaçu (PR). Por meio do filme, é possível problematizar o papel da igreja na colonização e o intenso comércio de indígenas, nem sempre abordado em livros didáticos”, recomenda Trovão. Classificação indicativa: 14 anos.

2) Carlota Joaquina: princesa do Brasil (1994)

Narra a história de Carlota Joaquina, esposa do Rei Dom João VI, que, para fugir da invasão napoleônica, transfere em 1807 a corte portuguesa para o Rio de Janeiro. Assim, a obra ajuda a trabalhar o processo que culminou na independência do Brasil

“O filme é uma sátira e uma caricatura dos personagens do período, e esse humor ajuda a despertar o interesse dos alunos sobre o tema”, afirma Trovão. Classificação indicativa: 12 anos.

3) Getúlio (2014)

O filme acompanha os últimos 19 dias da vida de Getúlio Vargas, então presidente do Brasil, enquanto enfrenta uma crise política. Ele é acusado de ter ordenado o atentado contra o jornalista Carlos Lacerda. Classificação indicativa: 12 anos.

4) Quanto vale ou é por quilo? (2005)

Faz uma analogia entre o antigo comércio de escravos e a atual exploração da miséria pelo marketing social. Trovão indica a produção para trabalhar a escravidão no Brasil e suas consequências atuais. “O filme ajuda o estudante a estabelecer relações entre o passado e o presente, além de permitir problematizar o racismo estrutural também”, completa. Classificação indicativa: 14 anos.

5) Desmundo (2003)

Baseado na obra literária da autora Ana Miranda, narra um momento do período colonial que marca a chegada de uma nau portuguesa trazendo moças órfãs de Portugal. “O objetivo era constituir casamento com os colonos e manter a sociedade branca com filhos gerados dessas relações. Esse projeto do Estado português em parceria com a igreja católica visava impedir a união dos colonos brancos com as mulheres indígenas e as negras escravizadas”, explica Ribeiro.

Em ‘Desmundo’, pode-se explorar a desigualdade de gênero, raça e status social; condições indignas dos indígenas e dos negros escravizados; multiplicidade linguísticas e trocas culturais”, acrescenta. Classificação indicativa: 14 anos.

6) Xica da Silva (1976)

Na segunda metade do século XVIII, Xica da Silva era uma escrava que, após conquistar o coração do contratador de diamantes João Fernandes, ascendeu à posição de dama da sociedade em Diamantina (MG).

“É possível trabalhar o choque cultural na relação entre homem e mulher de raça e status social distintos”, aponta Ribeiro.  Classificação indicativa: 16 anos.

7) Tiradentes, o Mártir da Independência (1977)

Cinebiografia do alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, célebre personagem do processo de independência brasileira. Segue a sua vida desde os primeiros momentos da insurreição comandada por ele até a morte na forca. Classificação indicativa: 10 anos.

8) Os Inconfidentes (1972)

Narra a conspiração de padres, poetas, políticos e militares para libertar o Brasil dos portugueses no século XVIII, que culmina na condenação à morte de Tiradentes, que se torna o principal nome da inconfidência mineira. Classificação indicativa: 12 anos.

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Crédito da imagem: Grafissimo – Getty Images

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