Ensinar escrita criativa de poesia pode ter particularidades em relação à prosa.
“A diferença pode estar no uso dos recursos que o poeta norte-americano Ezra Pound propõe no livro ABC da literatura (2006). Segundo ele, os recursos da poesia são: melopeia, fanopeia e logopeia, correspondendo respectivamente ao ritmo, imagem e ideia”, aponta a professora de Teoria Literária da Universidade Federal do Pará (UFPA) Giselle Ribeiro.
Para a professora de língua portuguesa da rede estadual de Pernambuco Thárcia Kiara Lopes Pereira Silva, um desafio é mostrar ao aluno que o olhar poético pode ser lançado para diferentes objetos da realidade, de uma música a um fato cotidiano.
“Ensinar isto é mostrar que os estudantes são capazes de olhar além, nas entrelinhas, captar pelo olhar poético e materializá-lo por meio do poema”, analisa Silva.
A seguir, conheça sete atividades que ajudam a ensinar escrita criativa de poesia aos estudantes da educação básica.
1) Jogos de leitura
Indicação de Giselle Ribeiro, os jogos de leitura – como pular corda recitando poesia – aproximam as crianças desse gênero literário por meio do lúdico.
“Isso resgata memórias de infância, quando brincamos com as rimas. Sem sabermos, no começo de tudo, a poesia fazia festa nas nossas vidas”, aponta.
No primeiro jogo, alunos são convidados a pular corda enquanto os outros repetem: “Um homem bateu à minha porta e eu abri. Senhoras e senhores, o que ele queria? Senhoras e senhores, era poesia. Senhoras e senhores, o que o homem queria?”.
“A corda para de girar e o fôlego do aluno que estava pulando vai ser testado. Para isso, ele deverá abrir o livro escolhido e ler um poema em voz alta”, sugere a professora.
Um segundo jogo é “Um lance de dados jamais abolirá o acaso”. “Esse é um jogo de escrita automática. Nele, os dados apresentam palavras ou frases em cada um de seus lados. Por exemplo: o cão; sem nada; no abismo; e a chuva; pirlimpar; não”, detalha Ribeiro.
Seis jogadores formam um círculo. Cada um joga o dado, enquanto alguém de fora anota as palavras na ordem que o dado determinou. “Assim, jogada por jogada, o poema vai nascendo”, descreve a docente.
2) Desenhar poemas
Ribeiro indica a leitura de poemas que apresentam descrições primorosas de personagens ou ambientes.
“Vende os olhos dos alunos e leia um poema que favoreça a recriação de imagens. Depois, retire a venda dos olhos e peça que eles desenhem as imagens ou personagens do poema, ou descrevam com as suas palavras o que viram e sentiram”, indica.
3) Descrições poéticas
Silva sugere pedir aos alunos para que façam descrições poéticas do espaço escolar, como professores, funcionários e ambientes.
“Outra possibilidade é pedir para que eles definam sentimentos por meio da poesia, como amor, saudade, tristeza e alegria. Eles podem também ler uma reportagem ou trazer uma foto que marcou suas vidas e a transformar em poesia”, recomenda.
A atividade também pode ser utilizada para ajudar a turma a condensar pensamentos e sentimentos em poucas palavras.
“Peça aos alunos que descrevam um sentimento ou situação em apenas cinco palavras. Depois, transformem essas palavras em um verso ou estrofe. Exemplo: saudade – vento, vazio, silêncio, memória, ausência. Ou proponha que escreva um parágrafo sobre algo importante para eles e depois o retome em uma frase poética”, orienta Silva.
4) Transforme temas sociais em poesia
“Gosto de trabalhar temas críticos no âmbito social, como o Dia da Consciência Negra. Apresento o tema, degustamos músicas, documentários, filmes e crônicas sobre ele, ao mesmo tempo que faço a sondagem do conhecimento prévio do aluno sobre o assunto”, compartilha Silva.
“Por fim, sugiro que eles possam transformar nosso debate em um poema que retrate tudo que nós compartilhamos. E as criações são incríveis”, afirma.
5) Promova leituras em voz alta
Ribeiro explica que a leitura em voz alta ajuda a transformar as palavras em imagens e a alcançar o recurso da melopeia, o ritmo na poesia. Para isso, ela recomenda ler um poema repetidas vezes. “O próprio poema vai dizer como o leitor deve lê-lo”, explica.
Para explorar o ritmo, ela sugere ler em voz alta o poema Trem de ferro, de Manuel Bandeira.
“Os alunos conseguem se aproximar do ritmo de um trem em movimento. Examinando palavra por palavra, eles são conduzidos pelo próprio poema a reduzir ou aumentar a velocidade do trem de ferro”, opina.
Para Silva, ler em voz alta ajuda a explorar a sonoridade das palavras. “É possível perceber como os verbos interagem. Palavras duras ou suaves podem criar atmosferas diferentes”, adiciona.
6) Poesia concreta ajuda a ilustrar aspectos visuais
“O aspecto visual tem grande importância quando trabalhamos com a poesia concreta, Haikai ou sonetos”, sugere Silva.
7) Apresente poetas para inspirar os alunos
Ribeiro indica apresentar a obra de Manoel de Barros. “É o mestre da simplicidade poética”, justifica. “Se o público for infantil, sugiro os livros Poeminha em língua de brincar (2007) e Exercícios de ser criança (1999)”.
Silva recomenda Adélia Prado, Carlos Drummond de Andrade e Carolina Maria de Jesus, bem como sonetos de Vinícius de Moraes, poemas autobiográficos de Cora Coralina e poemas concretos de Ferreira Gullar.
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Crédito da imagem: trigga – Getty Images