Em 9 de novembro de 2024 são relembrados os 60 anos da morte de Cecília Meireles (1901-1964), referência na poesia brasileira do século XX, mas que deixou obra em outros gêneros literários também.

“Ela exerceu com excelência o ofício de cronista, jornalista, educadora, crítica e estudiosa de arte. Deixou conferências sobre literatura e arte; correspondência a escritores; peças teatrais; traduções de autores como Virgínia Woolf, Li Po, Tu Fu, Tchekov, Tagore, Garcia Lorca e Charles Dickins; memórias de infância (Olhinhos de Gato, 1939), pesquisas sobre o folclore brasileiro, desenhos e livros infantis”, lista a professora do Mestrado de Letras/Estudos Literários da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes/Fapemig) Ilca Vieira de Oliveira.

“Ela também esteve à frente da primeira biblioteca pública infantil brasileira, fundada em 1934 no Pavilhão Mourisco, no Rio de Janeiro (RJ)”, relata.

Temas de destaque

Para o professor do Profletras da Universidade Federal do Sergipe (UFS) Alexandre de Melo Andrade, a obra de Cecília Meirelles traz a efemeridade da vida como um tema de destaque.

“Ela dialogou com outras culturas e tempos, buscando o sentido da eternidade na transitoriedade dos fatos e das coisas”, analisa.

“As águas do mar, que são um símbolo recorrente na obra de Meireles, metaforizam o mistério, a espiritualidade e algum elemento de permanência”, acrescenta Andrade.

Oliveira explica que a autora também abordou temas do seu tempo. “Reflexões sobre a natureza; as destruições causadas pelas guerras; as crianças órfãs; o papel do professor e educador e da arte na formação do humano e discussões sobre o passado histórico do país, principalmente no Romanceiro da Inconfidência (1953)”, diz.

Além disso, Oliveira destaca a viagem e discussões sobre o mundo interior como importantes na narrativa da autora. Exemplo dos livros Viagem (1939), Vaga música (1942), Mar absoluto e outros poemas, Retrato natural (1949), Doze noturnos da Holanda (1952) Romanceiro da Inconfidência (1953), Poemas escritos na Índia (1953), Poemas italianos (1968) e Crônicas de viagem v.1 ao 3 (1998).

“A viagem é evocada no sentido do deslocamento e para o mundo do vago e do fugidio”, analisa a professora.

Uso na alfabetização

Cecília Meireles teve uma relação íntima com a educação. “Ela começou a lecionar no ensino fundamental ainda adolescente e atuou da imprensa, exercendo a sua voz de educadora e crítica da educação no país entre 1930 e 1933. Para Cecília, o educador deve ter liberdade de ação, e a educação tinha que ser capaz de formar estudantes para atuar no mundo de maneira crítica”, compartilha Oliveira.

A professora indica aos docentes da educação básica a leitura de as Crônicas de educação (2001). “Mostram a atuação de Meireles como uma educadora que estava engajada em um projeto de uma educação humana e igualitária”, justifica.

Por conta da experiência na educação, crianças dos anos iniciais do ensino fundamental, em fase de alfabetização e letramento, podem se beneficiar ao terem contato com a obra de Cecília Meireles.

“Ela utilizou a poesia como forma de levar os alunos à compreensão dos fonemas, das sílabas e das palavras”, indica Andrade.

“Parte significativa da sua produção se aproxima do universo infantil, por meio da cantiga, das repetições e dos jogos sonoros, em uma aliança entre som e sentido que favorece a aquisição da linguagem”, completa o professor.

Entre os livros para esta etapa, Oliveira indica Criança meu amor (1924), A festa das letras (1937) e Ou isto ou aquilo (1965).

“Neste último, a autora explora a linguagem de forma lúdica, com aliterações, assonâncias e repetições, atribuindo um ritmo fluido e harmônico aos versos. Os elementos do cotidiano infantil são marcados por imagens e brincadeiras, proporcionando uma experiência de leitura muito próxima da vida das crianças”, recomenda Andrade.

Como atividade, ele indica promover leituras em voz alta para explorar a sonoridade dos poemas de Meireles.

“A declamação é um modo de, por meio dos processos de entonação, interpretar e dar sentido aos textos”, recomenda.

Relação com história

Para os anos finais do ensino fundamental, Andrade indica Viagem e Vaga Música.

“O tom reflexivo contata o leitor com sua sensibilidade e subjetividade, sem que se perca a musicalidade, a fluidez rítmica e certo encantamento com o mundo e com as palavras”, opina o docente.

“Por meio destes livros, pode-se discutir com os estudantes o conceito de literatura e de poesia, começando pela ideia de imaginação criadora e chegando em como a literatura pode dialogar com as questões do tempo presente”, orienta Andrade.

Já para o ensino médio, as indicações são Mar Absoluto (1945) e o Romanceiro da Inconfidência.

“O primeiro possibilita um trabalho apurado com as simbologias que são características de Meireles, além das oposições entre a finitude e a infinitude, a materialidade e a fluidez”, aponta Andrade.

Já Romanceiro pode ser abordado de forma interdisciplinar com história. “Parte-se de como os fatos históricos se deram, até o entendimento de como eles são filtrados e refletidos pela subjetividade de Cecília Meireles”, explica Andrade.

O cruzamento da poesia com as questões históricas também pode ser abordado no primeiro livro da autora, Espectros (1919), que apresenta personagens como Cleópatra, Judite, Sansão, Dalila, Joana D’Arc e Maria Antonieta.

Veja mais:

Estudar em casa: entenda o contexto de ‘Romanceiro da inconfidência”, de Cecília Meireles

Livro Aberto: 50 anos sem Cecília Meireles, a pastora das nuvens

21 escritores de língua portuguesa para apresentar aos alunos

Crédito da imagem: rudi_suardi – Getty Images

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