O judô surgiu no Japão a partir do jiu jitsu (JuJutsu), luta marcial de origem indiana. Sua sistematização foi realizada em 1882 pelo professor Jigoro Kano, que introduziu princípios filosóficos a uma luta que já era popular na região. No Brasil, a prática foi trazida por imigrantes japoneses que desembarcaram no Paraná aproximadamente em 1908.
“Kano, seu criador, tinha conhecimentos de políticas sociais, filosofia e incorporou elementos do pensamento oriental, como budismo, zen budismo, taoísmo e confucionismo”, explica o professor e judoca José Edson Rodrigues Ferreira. Os princípios filosóficos que norteiam o judô são: o melhor uso do corpo-mente (Seiryoko-Zen’yo); prosperidade e benefícios mútuos (Jita-Kioyei) e suavidade (Ju). Assim, a cooperação e o melhor uso da energia ganham destaque.
“O judô entende o indivíduo na sua essência social, colaborador e cooperativo no meio em que vive. Prevê o uso mínimo de força com máxima eficácia. Além de princípios de amizade e de respeito ao adversário”, pontua Ferreira. Por conta desse forte embasamento filosófico, muitos praticantes não o consideram, propriamente, uma arte marcial.
“O judô é uma prática corporal que, diferentemente de muitas lutas orientais, não foi desenvolvida primordialmente para a guerra”, justifica o pesquisador Marco Antonio Lima Rizzo na dissertação “As apropriações e objetivações do conteúdo judô nas aulas de educação física escolar” (2011).
Em termos de lógica corporal, utilizam-se braço, quadril e perna. “A luta possui um conjunto de técnicas de projeção (Nague-Waza), de domínio no solo (Katame-Waza) e de amortecimento de queda (Ukemi), devendo ser ensinadas juntamente com os princípios éticos”, resume Rizzo.
Desequilíbrio é diferencial
As técnicas elaboradas para a prática do judô visam desequilibrar o oponente, de modo a usar a sua força contra ele próprio. Quem se desequilibra, perde. Dessa forma, podem ser trabalhados jogos e atividades de desequilíbrio nas aulas de educação física escolar. Porém, sem queda e solicitando que alunos permaneçam atentos às reações do seu companheiro de atividade.
“Nas brincadeiras e jogos de desequilíbrio, não precisa cair no chão: o desequilíbrio pode ser dar um passo atrás”, orienta o professor de educação física e pesquisador de lutas na educação física escolar Luiz Gustavo Rufino. Outro cuidado é que o judô exige a “pegada” no adversário por meio do quimono. Como não haverá vestimenta adequada, o ideal é evitar esse contato.“Porém os alunos podem experimentar as entradas de golpes segurando no antebraço e ombro, ou no antebraço e cintura escapular do companheiro”, sugere Rizzo em sua dissertação.
Outros ganhos são trabalhar com os alunos aspectos culturais do judô, como o vocabulário em japonês e a saudação Ritsu-rei, que os alunos fazem em uma postura de inclinação a 30˚ e com as mãos sobre as coxas. Exemplos de ambos podem ser encontrados na cartilha online “As instruções básicas do judô”, disponibilizada pela Confederação Brasileira de judô.
“Eu brinco que não temos o costume de reverenciar o Charles Miller, criador do futebol, em cada jogo. Porém, reverenciamos o mestre Jigoro Kano, criador do judô, antes de cada prática”, conta Rufino.
Para completar, ele gosta de destacar com a classe a capacidade do judô de aceitar diferentes biotipos corporais e estruturas físicas. “Muitos alunos que sonham em jogar basquete ou vôlei são impedidos por conta da altura. Nesse ponto, o judô é inclusivo, podendo ser adaptado para diferentes corpos. Procuro, por exemplo, apresentar os campeões de cada categoria de peso, que são bem diferentes entre si”, compartilha.
Confira, a seguir, sete jogos e atividades que ajudam a introduzir princípios de desequilíbrio e cooperação do judô nas aulas de educação física escolar.
1. Pular equilibrando-se
Faça cinco marcas no chão com uma distância em que os alunos consigam pular de uma a outra usando apenas uma perna. Outra variação é elevar o joelho assim que o pé chegar na marca, como ensinado em vídeo pelo professor Robson Furlan.
2. Auto desequilíbrio
“No judô, há situações chamadas de queda do sacrifício, quando você se desequilibra para poder desequilibrar o parceiro”, diz Rufino. Para desenvolver o auto desequilíbrio, uma alternativa é utilizar o exercício criado pelo diretor de teatro Antunes Filho. De pé, o aluno joga o peso para o calcanhar e desloca o corpo para frente até o momento que naturalmente se desequilibrar. Antes de cair, ele volta o peso para o calcanhar. Um exemplo pode ser visto no vídeo do professor Dionísio Neto, que recomenda fazer dez minutos da atividade.
3. Jogo do cotonete
Indicado por Rizzo em sua dissertação, o jogo consiste em um duelo entre dois alunos. Cada um fica em pé em um banco ou suporte baixo segurando um “cotonete”, que será um colchonete enrolado e fixado por uma faixa ou corda. Um adversário deve usar apenar o cotonete para tentar desequilibrar e derrubar o outro do banco, tentando atingir suas costas e glúteos.
O jogo é indicado para ajudar o aluno a “ler” os movimentos do oponente. “No judô, é importante manter uma distância para não deixar a guarda aberta e estudar o adversário, os recursos que ele tem. Assim, eu posso me aproximar ou distanciar visando desequilibrá-lo”, explica Ferreira.
4. Sumô
Cada dupla de alunos fica dentro de um círculo e o objetivo é empurrar o seu oponente para fora dele. Na monografia “Judô: desafios e possibilidades na educação física escolar” (2018), Eduardo Leiria De Mattos sugere trabalhar uma dupla de alunos por vez, de modo a observar com mais atenção se há ou não o uso de força excessiva.
5. Estoura balão
Nessa atividade os alunos amarram um balão no tornozelo. Em duplas, dentro de um círculo delimitado e em uma média distância, cada um deve tentar estourar o balão do oponente. “Durante a atividade, houve uma variação, onde colocamos mais de uma dupla dentro do círculo, desenvolvendo assim a organização espacial e temporal dos alunos”, conta Mattos em experiência com alunos do 4º ano do ensino fundamental
“Pode-se variar essa brincadeira para uma competição por dupla, onde dois alunos frente a frente, segurando nos braços um do outro, tentam pisar no balão do seu adversário, sem deixar que pisem no seu”, sugere.
6. Conquista do pano
Em duplas, os alunos devem pegar um pano da cintura do seu oponente, simulando um combate. “O aluno teria que proteger o seu colete e ao mesmo tempo tentar pegar o colete do adversário utilizando o desequilíbrio, que no judô consiste na ação de puxar e empurrar o oponente”, narra Mattos. Mattos sugere como variação amarrar o pano na perna, o que exigiria novas estratégias.
7. Jogo do Código de Ética
Indicado por Rizzo, esse jogo busca elucidar aos alunos como os conhecimentos de um Samurai eram passados de geração em geração. Divida a turma em dois times. Uma parte do time fica no centro da quadra enquanto a outra permanece em uma área mais distante e fixa.
O objetivo é que os alunos que estão na quadra joguem uma bola de mão em mão até ela ser entregue aos companheiros do grupo que estão no posto fixado. Quem está com a posse da bola não pode andar ou correr, devendo apenas arremessá-la ao seu companheiro de time. Já a equipe adversária deve interceptar a bola apenas durante o arremesso.
Além disso, antes de iniciar a partida, a parte do time que está no centro da quadra formula uma frase, que seria o código de ética. Após terem completado o objetivo de entregar a bola ao grupo no posto fixo, a criança que passou a bola conta ao receptor a frase formulada, que deve repeti-la em voz alta.
“Uma finalidade do jogo foi o desenvolvimento do coletivo entre os praticantes, pois a bola deveria ser entregue em mãos aos alunos que estavam do outro lado. E também quem estava com a posse de bola não podia andar. Passar a bola para os demais companheiros da equipe era fundamental para o cumprimento do objetivo”, narra Rizzo em sua pesquisa.
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Atualizado em 02/12/2022, às 10h06