O mestrado profissional é uma modalidade de pós-graduação voltada para a qualificação do magistério da educação básica. “Era previsto pelo Ministério da Educação desde 1965, mas regulamentado somente em 1998. Havia uma carência de profissionais em relação ao projeto de universalização da educação básica”, contextualiza o coordenador do mestrado profissional do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), Sandro Vinícius Sales dos Santos.

A partir de 1999, foram criadas as redes de programas de abrangência nacional que são oferecidos por diferentes universidades. Caso, por exemplo, do Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional (ProfMat); Programa de Mestrado Profissional em Letras (ProfLetras) e do Mestrado Profissional em Ensino de História (ProfHistória).

Essa modalidade difere do mestrado acadêmico em relação à produção de conhecimento. “Enquanto o profissional é direcionado ao chão da escola e aos desafios da sala de aula, o acadêmico se volta à pesquisa de questões filosóficas e mais amplas”, explica a professora de Linguística da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro do Conselho Superior do ProfLetras Luciane de Paula.

O mestrando, junto ao seu orientador, desenvolve uma pesquisa aplicada na sala de aula que poderá ser um produto, uma nova tecnologia, um material ou sequência didática. “Há um senso comum que pressupõe que o mestrado profissional é inferior ao acadêmico, quando são apenas diferentes em termos de objetivo. Tanto que é comum, nas universidades, os mesmos docentes estarem nos dois programas”, desmistifica Santos. Ambas as modalidades são stricto sensu, garantindo aos pesquisadores a possibilidade de seguir os estudos em um doutorado acadêmico, se desejarem.

Como escolher?

Se a intenção do professor é caminhar para a pesquisa e seguir carreira na universidade, a melhor opção é o mestrado acadêmico. “Se o interesse é permanecer na rede de educação básica e há curiosidade de refletir sobre o cotidiano escolar e soluções para os desafios do dia adia, opte pelo profissional”, recomenda Santos.

Antes de escolher o programa, ela aconselha pesquisar sua nota no site da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), instituição que avalia as pós-graduações no país. A nota mínima é 3 e a máxima, de excelência acadêmica, é 5.

Vale ainda optar por um programa próximo à cidade de moradia ou trabalho, por questões de descolamento. “Há programas no Pará, por exemplo, que o curso mais próximo pode exigir oito horas de barco de professores do interior”, lembra de Paula. Vale pesquisar também a forma de ingresso, que varia de programas, estados e cidades. “Podem exigir ou não projeto de pesquisa na seleção. De toda forma, visualize o que gostaria de estudar antes de se inscrever”, orienta Santos.

Para pleitear o mestrado profissional de redes nacionais, o professor deve lecionar na educação básica na área de ensino do programa. No caso do ProfLetras, por exemplo, é necessário ter atribuições de aula em Língua Portuguesa, não Inglesa. “Não é permitido desligamento da docência ao longo do curso”, reforça de Paula.

Para ela há ainda diferenças no perfil dos candidatos dos tipos de mestrado. Enquanto recém-formados e com experiência em iniciação científica optam pelo acadêmico, professores já no mercado de trabalho tendem ao profissional. “Mas não é uma regra”, garante.O perfil do aluno também determina se vale a pena cursar um mestrado profissional presencial ou virtual. “Se o professor não tem prática com pesquisa científica e está muito tempo afastado da universidade, poderá não se beneficiar com uma pós-graduação à distância (EAD)”, adverte a docente.

Sobrecarga é desafio

A atribuição de aulas em diferentes redes e escolas para complementar renda dificulta a escolha pelo mestrado acadêmico. Já o profissional traz os módulos obrigatórios em grades flexíveis e que variam por programa. “As aulas podem se concentrar em um dia da semana, no fim de semana, no período de férias escolares, entre outros”, assinala Santos.

A necessidade de se manter financeiramente e conciliar cargas horárias deixou a pedagoga Emily Maiolino longe do sonho do mestrado acadêmico. “Vi no profissional a oportunidade de aliar trabalho e pesquisa, além de me sentir acolhida. Achava que a universidade se afastava da realidade da escola pública. De repente, vi-me fazendo parte daquilo”, alegra-se ela, que cursou o mestrado profissional em educação na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

A historiadora e professora da rede pública Fabiolla Falconi Vieira chegou a ingressar em um mestrado acadêmico logo depois de formada. A necessidade de trabalhar e ao mesmo tempo cumprir os créditos do programa acabou lhe rendendo uma depressão. “Achei que minha sanidade valia mais e desisti do curso. Quando vi o edital do mestrado profissional em História, enxerguei uma oportunidade de retornar”, conta ela, que integrou a primeira turma do ProfHistória da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em 2016.

Além da jornada intensa de trabalho, há redes que não liberam os professores para as aulas da pós-graduação. “É comum a perseguição por parte de diretores e da secretaria, ou professores que precisam de atestado médico para conseguir finalizar o curso”, conta de Paula.

Bolsas escassas

Outro problema é o corte das bolsas de estudos pelo governo federal. A docente da Unesp relata que, a partir de 2019, as bolsas para os 20 mestrandos da turma passaram a ser oferecidas a apenas 30% da classe. “O que não faz sentido, já que o objetivo do mestrado profissional é justamente dar oportunidades para que o professor da rede publica se qualifique. É um investimento no profissional e na rede”, lamenta.

Nas redes que dispensam os professores para as aulas presenciais, há o abatimento do dia de trabalho, o que faz diferença no holerite do docente ao final do mês. Essa situação deixou a formação complementar da professora de ensino fundamental 1 da rede de São Paulo Elizabeth Aparecida Silva desgastante.

“Meu salário como professora é limitado. No meio do mestrado, meu carro quebrou, e era pesado lecionar em diferentes escolas e estar na universidade usando transporte público. Os horários eram intercalados e eu não tinha tempo de almoçar. Sem contar os gastos com a pesquisa, que pagamos do bolso”, relata ela, formada no mestrado profissional em Educação da Unicamp.

Troca com colegas

Para a professora Fabiolla Falconi Vieira, um benefício da modalidade profissional foi a troca de experiências com os colegas de turma. “Era um diálogo visando buscar soluções e marcar território na academia que, por vezes, nos desqualifica”, revela. A coordenadora de Paula aponta o embasamento teórico como outro ganho para os professores da rede pública. “Não raro, eles descobrem que aquilo que já praticam em aula tem uma teoria por trás, um nome”, explica.

Vieira concorda. “Eu já refletia antes sobre minha prática mas, agora, estou embasada em mais conhecimento e convencida da importância de minha função social”, explica. “Passei a utilizar mais fontes históricas em aula e compreendi algo que já suspeitava, mas não tinha subsídios para discutir: ensinar vai além de repassar conteúdos”, exemplifica.

Para Maiolino, houve o despertar de um lado pesquisadora até então desconhecido. “Reflete no trabalho pedagógico porque observo e escuto mais meus alunos e os vejo como parceiros. Também descobri ferramentas que posso usar”, comemora. Silva se diz mais empoderada profissionalmente. “Como posso ser um exemplo para meu aluno se paro de estudar? Vi na pesquisa um compromisso político, ainda que o governo federal não invista na escola pública”, pontua. Para completar, ela se considera mais empática agora. “Hoje, entendo que um estudante com dificuldade de aprendizagem ou relacionamento tem uma história fora da escola, cabendo a mim um olhar sensível e transformador”, conclui.

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