A inflação pode ser definida como o processo de aumento contínuo e generalizado dos preços dos bens e serviços negociados no país. “Ser contínuo e generalizado são palavras-chaves a destacar com os alunos. Contínuo porque tal aumento pode se dar em semanas, meses ou décadas. E generalizado porque precisa abranger simultaneamente a maioria dos bens para ser inflação – do cafezinho ao aluguel”, explica o docente da Pós-Graduação em Educação Matemática da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Amarildo Melchiades.

O tema pode ser trabalhado dentro de educação financeira e não exige conceitos sofisticados. “Podem ser usadas operações aritméticas, álgebra e porcentagem”, lista o professor. O assunto também pode ser abordado na perspectiva da estatística. “Com a elaboração de tabelas e gráficos com ou sem uso de tecnologias”, destaca a professora das redes estadual e municipal de Agudo (RS) Suziane Dias Almansa.

Leia também: Ensino de educação financeira não se restringe à matemática

Para desenvolver o pensamento financeiro, Melchiades recomenda introduzir o tema de forma lúdica já nos anos iniciais do ensino fundamental. “Para o aluno entender o que é essa coisa chamada dinheiro, que pode ser física ou não, e como usá-la a seu favor, já que vivemos em uma sociedade voltada ao consumo”, justifica.

O tema retorna no 9º ano do ensino fundamental e no 3º ano do médio, quando a classe terá conhecimento para análises mais sofisticadas.“Neste último, os alunos já estão pensando no mercado de trabalho, acompanham notícias e veem a aplicação no seu cotidiano”, enfatiza a mestra em Ensino de Ciências e Matemática e professora da rede pública do Rio Grande do Sul Aline Reissuy de Moraes.

Vigilantes do preço

Melchiades recomenda aos estudantes entrevistarem adultos sobre como era viver com a hiperinflação das décadas de 1980 e 1990.“Podemos também criar situações para analisarem se uma atitude foi boa, regular ou ruim. Por exemplo, devo pagar aluguel ou financiar uma casa que necessita reforma em momento de inflação alta? Ou quanto precisaria de dinheiro para morar sozinho?”, sugere.

“Pode-se analisar o que um salário mínimo compra e se uma família consegue suprir suas necessidades apenas com ele”, indica Moraes, que ainda indica perguntas disparadoras para debates ou pesquisas: “Por exemplo: quais são os principais problemas econômicos relacionados à inflação? Qual foi a pior inflação do Brasil? Porque a inflação está alta em 2022? O que é o IPCA e qual sua relação com a inflação?”.

Almansa desenvolveu o projeto escolar “Vigilantes do preço”. “Atuava em uma escola de periferia e as famílias vulneráveis sentiam o aumento da cesta básica em seu orçamento”, lembra. A docente iniciou o trabalho perguntando o que os alunos conheciam sobre o tema, a partir de suas experiências de vida e das observações do cotidiano familiar. “Questionei: o que seus pais mais se queixam em relação às despesas domésticas? A partir das respostas, expliquei que a desvalorização do salário era porque existia um aumento dos preços”, conta.

“O projeto começou no 9º ano, com o monitoramento dos preços do produto da cesta básica e elaboração de tabelas e gráficos. Com as turmas seguintes, esses itens foram revistos e ainda incluídos combustível e produtos de higiene e limpeza”, lembra a professora. Os alunos foram, ainda, incentivados a participar do planejamento do orçamento doméstico da família e a assistirem pelo menos um jornal por dia.

Temas correlatos

Em seu projeto, Almansa viu a necessidade de diferenciar os três tipos de inflação para explicar as causas do fenômeno. “Inflação de custo é quando, por exemplo, o aumento dos combustíveis impacta o frete dos produtos e encarece os seus preços”, esclarece. O mesmo exemplo ajuda conceituar a inflação inercial. “Nela, existe uma relação de dependência e controle. Quando o barril de petróleo sobe de preço nas refinarias internacionais, gera um aumento automático nos combustíveis no Brasil e esses reajustes são controlados e repassados pela Petrobrás por meio de políticas próprias. Ao final, o aumento é repassado pelos postos de combustíveis aos consumidores”, explica.

Por fim, a inflação de demanda está ligada à oferta e à procura de bens consumíveis, principalmente devido a sua sazonalidade. “Se há escassez de produtos, o preço aumenta. Quando temos produtos em excesso que não foram vendidos, o preço tende a diminuir — é o que acontece na maioria das promoções”, descreve.

Melchiades também recomenda abordar outras causas e consequências da inflação. “Ela pode ser gerada por um conflito em outra região do mundo, o que influencia na importação de um bem, ou por fatores climáticos que prejudicam a produção de alimentos”, pontua.

A desvalorização da moeda e diminuição do poder de compra são consequências. “Se a moeda de outros países se torna mais cara, isso influencia nas importações”, explica o professor. “Desemprego e clima de incertezas causam problemas no planejamento familiar e na economia do país. A nação com inflação é vista com desconfiança pelo mercado internacional devido ao risco de não honrar compromissos”, acrescenta.

Ensino interdisciplinar

No Projeto Vigilantes do Preço, houve a participação da disciplina de Ciências. “A professora aproveitou a temática da cesta básica para trabalhar alimentação saudável”, conta Almansa.
O tema pode ser relacionado à História do Brasil e às tentativas de combater a inflação nas décadas de 1980 e 1990, como os “fiscais do Sarney” – política de controle de preços do comércio pelo cidadão comum instituída pelo então presidente José Sarney (1986).

“Os professores da área das ciências humanas têm maior propriedade para falar sobre as questões sociais relacionadas ao assunto”, justifica Moraes, que recomenda como material de apoio o livro Conexões (Editora Moderna). Ele destaca que um capítulo aborda a inflação e temas que tangenciam o assunto, assim como fatos históricos, índices e pesquisas estatísticas.

Para uma abordagem leve, Melchiades orienta ao professor não utilizar educação financeira como justificativa para ensinar mais matemática. “É o inverso”, esclarece. “Evite transformar em uma disciplina com avaliação por prova”.

Almansa explica que os alunos tendem a ficar mais estimulados quando entendem que os índices de inflação impactam no seu dia a dia. “Como nos contratos de aluguel, tarifas (energia elétrica, água e telefone), taxas (IPVA e IPTU), mensalidades (de escola e convênio médio) e, principalmente, nos reajustes salariais”, lista.

Veja mais:

Plano de aula – Matemática financeira: juros compostos

Plano de aula – Educação financeira: taxa de juros

Plano de aula – Matemática financeira: Imposto de renda

Programa NET Educação – Educação financeira pode ser inserida em todas as disciplinas

Opinião – Educação financeira para os pequenos

Opinião – Cinema para ensinar economia

Atualizado em 18/04/2022, às 13h41

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