Iniciada em 1939, a Segunda Guerra Mundial terminou no dia 2 de setembro de 1945 com a assinatura oficial dos documentos de rendição pelo Japão. Os desdobramentos do conflito atravessaram as décadas e que podem ser observados inclusive em questões contemporâneas, como aponta a professora do colégio de aplicação e do mestrado profissional em ensino de história da Universidade Federal de Sergipe (UFS/Brasil) Andreza Maynard.

“A Organização das Nações Unidas (ONU) foi criada para assegurar a paz mundial. Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada pela entidade. Contudo, ela sofre críticas por não conseguir evitar genocídios e guerras civis, como na Síria, no Sudão e na Palestina; bem como por sua estrutura desigual de poder”, aponta.

A atuação de Israel na Palestina é outra consequência das redefinições geopolíticas do pós-guerra. “Com o fim da Segunda Guerra, o mundo ficou impactado ao saber do Holocausto, e a opinião pública internacional apoiou a criação do Estado de Israel por intermédio da ONU e sob a égide dos Estados Unidos, mesmo diante da resistência árabe palestina, que perdeu território. A reparação histórica aos judeus, com a criação do Estado de Israel, em 1948, deu início a ciclos de violência e impasses na região, que é alvo de disputas”, destaca a docente.

Confira, a seguir, a entrevista completa.

Instituto Claro: Qual a importância histórica do final da Segunda Guerra?

Andreza Maynard: A Segunda Guerra Mundial foi o evento mais devastador e traumático do século XX, cujos números impressionam até hoje: envolveu mais de 70 países e resultou na morte de dezenas de milhões de pessoas, entre militares e civis. Além disso, deixou como legado uma experiência de desumanização nacionalizada. O uso da bomba atômica e o Holocausto escancaram a crueldade humana em seu nível mais organizado.

Assim, não se trata apenas de lembrar o que aconteceu para honrar a memória das vítimas, o que já seria justo, ou de examinar os erros do passado para evoluirmos; as consequências do fim da Segunda Guerra ainda se fazem sentir na contemporaneidade, por isso é importante entender o que aconteceu.

Quais problemáticas contemporâneas podem ser relacionadas a esse evento?

Maynard: A lista de problemas contemporâneos relacionados ao fim da Segunda Guerra é longa: a desigualdade econômica global, os refugiados, a questão da bomba atômica, as disputas entre Israel e Palestina, o ressurgimento do racismo e da eugenia, as disputas pela memória da Segunda Guerra, com o negacionismo histórico do Holocausto por parte de grupos de extrema direita, e até mesmo as mudanças climáticas podem ser atribuídas à reconstrução acelerada do pós-guerra, com o uso indiscriminado dos recursos naturais e o modelo de industrialização implantado. Em termos de conflitos bélicos, podemos afirmar que a guerra na Ucrânia e as tensões entre China e Taiwan têm suas raízes na ordem bipolar que se estabelece com o fim da Segunda Guerra (entre capitalismo e socialismo). A Organização das Nações Unidas (ONU) foi criada após o fim da Segunda Guerra para assegurar a paz mundial. Contudo, sofre inúmeras críticas por não conseguir evitar genocídios e guerras civis, como na Síria, no Sudão e na Palestina; bem como por sua estrutura desigual de poder.

Como o final da Segunda Guerra está relacionado ao início da guerra fria?

Maynard: O fim da Segunda Guerra marcou o início de uma ordem mundial bipolar, com Estados Unidos e União Soviética (URSS) em lados opostos. As duas superpotências mantiveram uma disputa geopolítica e ideológica que durou do fim da guerra até 1991. Durante décadas havia o temor de que os dois países, ambos detentores da bomba atômica, pudessem se enfrentar diretamente, o que nunca chegou a acontecer. A Guerra Fria foi marcada pelas guerras da Coreia, do Vietnã e do Afeganistão, conflitos financiados por EUA e URSS, que se enfrentavam de forma indireta, e deixaram consequências que vemos até hoje.

O final da Segunda Guerra pode ser relacionado ao conflito entre Israel e Palestina?

Maynard: Sim, esse conflito é uma consequência das redefinições geopolíticas do pós-guerra. Com o fim da Segunda Guerra, o mundo ficou impactado ao saber do Holocausto e a opinião pública internacional apoiou a criação do Estado de Israel por intermédio da ONU e sob a égide dos Estados Unidos, mesmo diante da resistência árabe palestina, que perdeu território. A reparação histórica aos judeus, com a criação do Estado de Israel, em 1948, deu início a ciclos de violência e impasses na região, que é alvo de disputas por razões políticas, religiosas e econômicas.

Qual a relação do final da Segunda Guerra com a Declaração Universal dos Direitos Humanos?

Maynard: A Guerra revelou atrocidades como o Holocausto, campos de concentração, limpeza étnica, uso de alvos civis e outras violações graves. Os crimes, que foram cometidos por vários países, levaram a comunidade internacional a criar um documento para reafirmar os Direitos Humanos. Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada pela ONU. O documento afirmava que todos as pessoas nascem livres e são iguais em dignidade e direitos.

Quais tratados após a Segunda Guerra passaram a nortear conflitos e guerras?

Maynard: A Carta das Nações Unidas e os Tratados de Paz de Paris foram os principais acordos que passaram a nortear conflitos, guerras e as relações internacionais de um modo geral.  A Carta das Nações Unidas assinada em 1945, em São Francisco, estabeleceu a ONU, com o intuito de resolver conflitos, prevenir guerras futuras e estimular a cooperação diplomática entre os países. Já os Tratados de Paz de Paris foram assinados em 1947 com os países derrotados (Itália, Romênia, Hungria, Bulgária e Finlândia).

Os desdobramentos do fim da Segunda Guerra podem ser abordados em que etapas de ensino e disciplinas?

Maynard: O conteúdo curricular está previsto para o nono ano do ensino fundamental e normalmente é retomado no terceiro ano do ensino médio, mas não é ensinado apenas no Brasil. A Segunda Guerra permanece como uma das bases mais importantes do ensino de história em vários países por ser concebida como um instrumento capaz de contribuir com a formação de cidadãos conscientes, críticos e empáticos. Outro ponto relevante diz respeito à necessidade de preservar a democracia, sobretudo diante da onda fascista que tem ganhado força nas últimas décadas.

Como o professor pode trabalhá-lo em sala de aula?

Maynard: Debates, visitas físicas e virtuais a museus, exibição de filmes e séries, análise de fontes primárias como notícias de jornal e fotografias, jogos físicos e virtuais, histórias em quadrinhos (HQ), literatura, música, dentre outros.

O incentivo para que os alunos estudem a partir de fotos, cartas e depoimentos de vítimas do Holocausto pode ajudar a criar uma percepção mais profunda e humana do que foi a Segunda Guerra.

O Diário de Anne Frank, que é a história da adolescente alemã de origem judaica que precisou viver escondida dos nazistas, é um documento que pode ser explorado junto ao público juvenil para a abordagem do Holocausto na sala de aula. Tem alto potencial para sensibilizar os alunos e promover uma aprendizagem significativa.

A quais outras informações os professores devem estar atentos ao ensinar esse conteúdo?

Maynard: O tema desperta a curiosidade dos alunos, que são muito bons em fazer buscas na internet, mas nem sempre encontram informações confiáveis. Há vários sites e perfis falsos em redes sociais que divulgam conteúdos intencionalmente modificados sobre a Segunda Guerra. No meio digital há fake news, disputas de memória, revisionismo e negacionismo. Por trás dessas iniciativas geralmente estão grupos de extrema direita. Por sua vez, o ensino da história da Segunda Guerra nas escolas mantém o compromisso com a veracidade dos fatos e com a promoção de valores democráticos, mas nem sempre se apresenta de uma forma atraente para um público que está imerso no mundo digital.

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Crédito da imagem: Johncairns – Getty Images

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