O ano de 2017 marca o centenário da Revolução Russa. Em fevereiro de 1917, revoltas populares finalmente derrubaram o Czar Nicolau II e instauraram uma república. Já em outubro, o governo socialista soviético foi implementado.
Segundo o mestre em História pela Universidade Russa da Amizade dos Povos, Henrique Canary Rodrigues, a Revolução Russa pode ser considerada o principal fato histórico do século 20. “Se você observar, todos os demais acontecimentos marcantes da história remetem a ela”, justifica.
A lista inclui a Segunda Guerra Mundial, a Guerra Fria, a Revolução Cubana, a corrida espacial e o desenvolvimento tecnológico promovido por ela. Confira a entrevista completa com o historiador a seguir.
NET Educação – Qual a importância histórica da Revolução Russa? 
Henrique Canary Rodrigues – Ela é o principal fato histórico do século 20. Se você observar, todos os demais acontecimentos marcantes da história remetem a ela. Na Segunda Guerra, por exemplo, o nazismo tentou esmagar a todo custo a “ameaça comunista”. Falamos hoje bastante dos ataques da Alemanha ao Ocidente, mas esquecemos de que os principais esforços de guerra de Hitler eram direcionados contra a URSS. Além disso, diversas revoltas sociais no mundo tiveram como horizonte a Revolução Russa. Ela inspirou povos oprimidos, nações e operários.
NET Educação – Qual foi a importância da Revolução Russa em relação ao capitalismo? 
Rodrigues – Uma parte do mundo passou a pensar um tipo de sociedade, economia e política que era diferente do que era praticado até então. A Revolução Russa demonstrou, na prática, uma alternativa ao capitalismo. Que não era necessária a existência de uma classe dominante. Que pessoas simples, do povo, com consciência política e organizadas, poderiam governar e promover uma sociedade mais igualitária.
NET Educação – Qual foi o principal ensinamento deixado?
Rodrigues – O de que o capitalismo não era a única possibilidade. Além disso, a ideia de que um país atrasado, com profundos problemas sociais, com altos índices de analfabetismo, conseguiu se transformar na segunda maior potência política e industrial do mundo em 20 anos. A Revolução Russa demonstrou ser um projeto político, econômico e filosófico superior ao capitalismo por possibilitar um desenvolvimento social, conquistado a partir da distribuição de terra aos camponeses e da estatização das empresas nacionais.
NET Educação – As conquistas tecnológicas da Rússia também podem ser consideradas frutos da revolução? 
Rodrigues – Sim. Ao se tornar uma potência, a URSS foi o primeiro país a lançar um objeto no espaço [Sputnik, em 1957], a mandar um ser vivo para o espaço [1959], e um ser humano em segurança ao espaço [Iuri Gagarin, em 1961], além de uma sonda a outro planeta [para Vênus, em 1965].
NET Educação – Quais foram as problemáticas herdadas? 
Rodrigues – A Revolução Russa se distingue por dois momentos diferentes entre si. Em 1917, há uma etapa gloriosa, na qual se conquistou ganhos positivos. Se tornou um regime superior ao capitalismo, porque houve crescimento econômico e o estímulo a programas sociais e culturais que ajudaram a URSS a superar o seu atraso. Porém, a URSS se tornou uma potência isolada. Ao contrário do previsto, a revolução não aconteceu em outros países. Isso permitiu uma reviravolta no poder. Foi quando se criou uma casta de governadores privilegiados e um regime feito apenas para manter seus benefícios. Nesse segundo momento, ela se transforma em uma contrarrevolução: um regime totalitário que, inclusive, perseguiu os próprios revolucionários. Um exemplo foi a perseguição de [Leon] Trotsky por [Joseph] Stalin.
NET Educação – Tivemos recentemente a morte de Fidel Castro. Como pensar a Revolução Cubana sob o prisma da Revolução Russa? 
Rodrigues – Cuba também conseguiu resolver a totalidade dos seus problemas sociais. Como sistema econômico e social, suas conquistas são indiscutíveis. Mas não houve liberdade política, ou seja, ficou uma tarefa incompleta. Um projeto socialista precisa pensar esses dois aspectos.
NET Educação – Assistimos uma mitificação dos termos “comunismo” e “comunista”, principalmente em setores mais conservadores da sociedade. Como você analisa isso?

Rodrigues – Primeiramente, essa demonização do termo “comunismo” mostra como as ideias socialistas ainda têm força, e o medo, por parte de setores mais conservadores, em relação a elas. Além disso, existe uma campanha ideológica para liquidar no imaginário popular não o socialismo em si, mas a ideia de igualdade de oportunidades, de condições e de possibilidades. Ideias essas que nem são socialistas, mas de justiça e de igualdade social. A atual ascensão da “direita raivosa” em diversos países combate a ideia de igualdade entre homens e mulheres, negros e brancos e de políticas compensatórias. Como se tivéssemos que nos contentar com a sociedade da forma que está posta.

Veja mais:
– Plano de aula: Da Guerra Fria ao mundo atual
– Por que é importante discutir política na escola?

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