Margarina, sorvete, chocolate, salgadinho, bolo e outros alimentos processados são exemplos de produtos que levam óleo de palma na composição. Conhecido no Brasil como óleo de dendê, o ingrediente também está em cosméticos, biocombustíveis e ração animal. Se a maioria dos consumidores nem percebe o uso do óleo nesses produtos, menos ainda têm conhecimento de sua relação com o desmatamento de florestas tropicais.
“O óleo de palma tem sido empregado na indústria alimentícia como alternativa às gorduras vegetais hidrogenadas por não apresentar teores significativos de gordura trans. Também é estável a altas temperaturas e durante sua estocagem, possui textura cremosa, além de odor e sabor neutros”, justifica a docente do curso de engenharia de alimentos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Klicia Sampaio. Essas qualidades fizeram com que grandes marcas de chocolate se rendessem à matéria-prima. “E é um óleo barato, refletindo no preço do produto”, acrescenta.
Em 2020, foram produzidos mais de 73 mil toneladas de óleo de palma no mundo, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos. No Brasil, a mesma instituição apontou a produção de 545 toneladas, sendo 82% delas no Pará e 16% na Bahia. O dendê é ainda responsável por cerca de 40% da atual demanda de óleos vegetais em todo o mundo, segundo artigo de Erik Meijaard, da Universidade de Kent, no Reino Unido. Se a produção brasileira corresponde a cerca de 1% do óleo de palma no mundo, a Indonésia e a Malásia são responsáveis por 80% desse montante. É nessas regiões que a produção tem sido vinculada ao desmatamento de florestas tropicais. Meijaard aponta, em sua pesquisa, que a contribuição do dendê para o desmatamento florestal varia de 3% na África Ocidental a 50% na Malásia.
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Focos de incêndio
Em 2019, uma pesquisa investigativa da Rainforest Action Network (RAN) seguiu a palma plantada em terras desmatadas da Reserva Rawa Singkil Wildlife, na Indonésia, que abriga espécies ameaçadas de extinção. No mesmo ano, o Greenpeace alertou que o desmatamento por queimada havia provocado infecção respiratória em 900 mil pessoas na região, além de liberar 465 megatoneladas de CO2 na atmosfera.
Professora da Escola Asiática de Meio Ambiente, Janice Lee ressalta a dificuldade de rastreamento da palma na cadeia de produção alimentícia, o que atrapalha a responsabilização das empresas por danos ambientais. “Se a base de fornecimento delas inclui atores terceirizados, como agricultores independentes, é desafiador controlar o que acontece nessas plantações”, esclarece. “Os consumidores individualmente podem se educar e apoiar o óleo de palma sustentável, mas não devemos responsabilizá-los pelo problema. Precisamos que financiadores e comerciantes intensifiquem suas políticas de fornecimento sustentável”, enfatiza.
Palma brasileira
No Brasil, a produção de óleo de palma tem impacto na floresta amazônica, na microrregião de Tomé-Açu (PA). Segundo a doutora em Ciências do Desenvolvimento Socioambiental pela Universidade Federal do Pará (UFPA) Susane Cristini Gomes Ferreira, a cadeia produtiva brasileira foi beneficiada com o Programa de Produção Sustentável do Óleo de Palma (PPSOP), de 2010.
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“Estudos recentes apontam diminuição da pegada florestal da palma em plantações corporativas e de pequenos proprietários a partir do lançamento do PPSOP. Entretanto, também destacam fragmentação florestal atrelada a essas plantações”, observa Ferreira. Em pesquisa ainda não publicada, ela identificou que municípios que mais desmataram no nordeste do Pará foram os com menor área de plantação de palma. “Entretanto, em 2013, áreas plantadas com palma tenderam a aumentar o desmatamento em relação ao ano anterior”, adianta.
Outros fatores também podem influenciar nos dados. “Trata-se de uma monocultura que tem como produto principal uma commodity ligada às dinâmicas e variações do mercado global. Além disso, o Brasil enfrenta um momento de enfraquecimento da legislação ambiental e dos órgãos de fiscalização”, ressalta Ferreira.
Por sua vez, a contaminação do solo e dos corpos hídricos pelo uso de agrotóxicos é constantemente denunciada por comunidades que vivem cercadas por plantações de dendê, como a Terra Indígena Turé-Mariquita (PA). “Isso prejudica a subsistência das comunidades” diz Ferreira. Para ela, impactos na Amazônia são sempre complexos e devem ser analisados continuamente: “É fundamental acompanhar como as plantações de palma se inserem nesse território”.
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Atualizado em 21/07/2021, às 10h56