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Crianças e adolescentes participam, tradicionalmente, de atividades das escolas de samba do Rio de Janeiro. Há espaços próprios para elas, como a ala das crianças, escolinhas de mestre-sala e porta-bandeira e baterias mirins. Mas desde o carnaval de 1983, acontece também o desfile de escolas de samba mirins. São elas que fecham a festa do sambódromo carioca na terça-feira de carnaval.

A perspectiva é de profissionalização e renovação nas próprias escolas, já que entre as 16 instituições, a maioria tem origem em uma “escola-mãe”, como são chamadas as que desfilam no bloco principal.

Projetos sociais

Durante o ano todo, escolas de samba mirins funcionam também como projetos sociais e culturais ao proporcionar oportunidades e formação aos participantes. Elas oferecem oficinas de canto, percussão, chapelaria, costura; escola de passista, mestre-sala e porta-bandeira, reforço escolar e ensino de informática.
“E essas pessoas seguem nas escolas de samba, mantendo as tradições, as culturas, seus interesses. Mesmo com processos relacionados à vulnerabilização de territórios, retração das políticas relacionadas ao carnaval e às escolas de samba, tem gente que fica ali, continua defendendo seus pavilhões e suas bandeiras”, afirma a antropóloga e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Ana Paula Alves Ribeiro.

escolas de samba mirins
Registro de ala de escola de samba infantil (crédito: divulgação/ Ana Paula Alves Ribeiro)

Protagonismos juvenis

Pesquisadora do assunto há mais de 15 anos, ela destaca ainda a valorização dos protagonismos juvenis que se estabelecem nessas escolas. “Pensávamos lá nos anos 90 no papel das escolas de samba como possibilitadoras de se pensar políticas sociais e logo a gente estava falando muito rápido de protagonismos juvenis. E uma das coisas que é fundamental é a relação intergeracional: os mais velhos aprendem continuamente com os mais jovens; e os mais jovens aprendem com os mais velhos, sempre numa chave de respeito”, destaca.

Ribeiro salienta que os enredos abordamos nas escolas de samba mirins geralmente trazem questões sociais e temas da infância. “Não raro a gente vai ver, por exemplo, enredo relacionando compositores da própria comunidade, cantoras da própria comunidade, temas relacionados à história e à cultura do Brasil. Também tem muita coisa relacionada ao lúdico.Temas como circo, parques, brincadeiras”, lista.

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Transcrição do Áudio

Música: Mix de baterias de escolas de samba do Rio fica de funcho

Ana Paula Alves Ribeiro:
Essas escolas de samba mirins elas estão em todos os lugares. Às vezes tem uma escola de samba mãe. Esse é o caso, por exemplo, da Grande Rio, da Mangueira, do Salgueiro. Então a gente vai ver, por exemplo, Pimpolhos da Grande Rio tem uma relação muito estreita com a Grande Rio, que é uma escola de Caxias, inclusive, que é o lugar onde eu dou aula.
Essas pessoas elas seguem nas escolas de samba, mantendo as tradições, as culturas, seus interesses… mesmo com processos relacionados à vulnerabilização de territórios, retração das políticas relacionadas ao carnaval e às escolas de samba, tem gente que fica ali, continua defendendo seus pavilhões e suas bandeiras.
Meu nome é Ana Paula Alves Ribeiro, coordenadora do Museu Afrodigital Rio de Janeiro e sou professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Vinheta: Instituto Claro – Cidadania

Mix de baterias de escolas de samba do Rio fica de fundo

Marcelo Abud:
Há quatro décadas, os desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro são fechados na terça de carnaval por escolas de samba mirins. Com ensaios que acontecem ao longo do ano, essas escolas trazem outras perspectivas para crianças e jovens.

Ana Paula Alves Ribeiro:
De um lado, a gente pensava lá nos anos 90 no papel das escolas de samba como possibilitadoras de se pensar políticas sociais e, logo na virada dos anos 2000, dos anos 2010, a gente estava falando muito rápido de protagonismos juvenis.
E uma das coisas que é fundamental é a relação intergeracional, os mais velos reaprendem e aprendem continuamente com os mais jovens; e os mais jovens aprendem com os mais velhos, sempre numa chave de respeito.

Bateria de escola de samba fica de fundo

Ana Beatriz
Meu nome é Ana Beatriz, mas normalmente me chamam mais de Bia.
Atualmente sou a intérprete da escola, já estou nessas aventuras aí há quatro anos com a Império do Futuro.
Mesmo que a gente não esteja lá para receber nada em troca, a gente faz isso como um trabalho mesmo, levamos tudo muito a sério. Muito nova, comecei também a estudar o canto, entrei para algumas aulas de canto na própria escola mesmo durante os ensaios que a gente normalmente faz logo no início de ano e no final do ano para o próximo carnaval.
Então, mudou muito a minha rotina. Me mostrou novas formas de responsabilidade, entre aspas assim, mudou muito a minha cabeça também. Me mostrou novos lugares, novas pessoas, novas oportunidades.

Marcelo Abud:
A cidadania está em diversas ações das escolas de samba mirins.

Ana Paula Alves Ribeiro:
Pensar a ocupação dessas crianças ao sambódromo é pensar direito dessas crianças à cidade. Elas saem com seus irmãos, com suas mães, com seus tios, com seus pais, dos seus bairros, atravessando a cidade em transportes muitas das vezes públicos, no carnaval, para ocupar o centro do Rio para desfilar. Então a gente também está falando de direito à cidade.

Música: Samba-enredo da Corações Unidos do CIEP “Quem conta um conto acrescenta um ponto, o CIEP acrescenta saberes à nossa vida
(Essa é a nossa hora!)
O CIEP vai passar,
A criançada vai sorrir
Quem conta um conto aumenta um ponto
Na Sapucaí

Ana Paula:
Escolas de samba mirins começam a trazer crianças a partir de cinco anos de idade, mas uma coisa que é muito importante, só desfilam crianças que estejam matriculadas. Então, as crianças que estão nas escolas de samba mirins, elas estão regularmente matriculadas em escolas.
A gente está falando de compromisso… e cidadania também é compromisso coletivo. As escolas de samba mirins elas não têm um campeonato no sentido que as escolas adultas têm. Então a gente, por exemplo, vê a questão da ludicidade e da brincadeira presente. E ao mesmo tempo, a gente vai percebendo um processo de amadurecimento dessas crianças no campo do carnaval, no campo do fazer coletivo.

Ana Beatriz:
Sobre o nosso enredo, o canto que faziam na África é até em iorubá, inclusive.
Meio difícil de aprender, mas dá para pegar. Vamos lá:
(cantando) ‘Sansa Kroma / Nena yo / Keke kokomba (2x).

(canto de Ana Beatriz a capela continua de fundo) Eu estou ali não é só para cantar um samba. Eu tenho que interpretar. Parece que você está contando a história – você conta isso com seu corpo inteiro.
E quando você transmite isso para as crianças, elas passam a ter mais noção de mundo, passam a criar opiniões também. Isso é muito legal.

Sobe som da versão original do samba-enredo da Império do Futuro,
“Se quiser fazer por mim, que faça agora! Venha, Sansakromá!”, com Ana Beatriz:
Sansakronmá, Nena Yô
Kekekokombá!
Sansakronmá, Nena Yô
Kekekokombá!
Ouvi de um griô uma linda história
Que guardo até hoje na memória
‘Se quiser fazer por mim, que faça agora’

Ana Paula Alves Ribeiro:
A partir desses direitos sociais, direitos políticos, direitos civis, a gente aprende muita coisa. A gente aprende respeito, autonomia, protagonismo, comunidade. O próprio futuro do samba e do carnaval.

Passagem: bateria de escola de samba

Isabela Mascarenhas:
Eu sou Isabela Mascarenhas, tenho 16 anos e sou primeira intérprete da escola de samba Nova Geração do Estácio. Sempre gostei muito de carnaval e uma coisa que eu tenho oportunidade de estar em contato com o carnaval o ano todo. A gente tem uma troca muito legal com todo mundo, a gente aprende muito. Eu gosto muito de estar lá com as pessoas. Tem um papel muito importante para mim.

João Antonio:
Meu nome é João Antonio, eu tenho 11 anos e sou segundo intérprete da escola de samba Nova Geração do Estácio. Fazia live com meu pai cantando e tocando violão.
Um dia que meu tio veio aqui em casa, eu toquei para ele e aí ele falou que ia mostrar para o Joel, que é o presidente da escola. No dia falaram para eu ir no ensaio e, aí, minha irmã foi junto. E aí o que aconteceu? Quando eu vi o ensaio, me chamaram para cantar. Eu falei para minha irmã para ela também vir. Eu sempre gostei de música e de carnaval. Então foi quase que a junção perfeita.

Ana Paula Alves Ribeiro:
Não raro a gente vai ver, por exemplo, enredo relacionando compositoresda própria comunidade, cantoras da própria comunidade, temas relacionados à história e à cultura do Brasil. Também tem muita coisa relacionada ao lúdico, né? Temas como circo, como parques, brincadeiras aparecem nas escolas de samba mirins.

Música: Samba-enredo da Nova Geração do Estácio “Mestre Ciça, Com a Nova Geração Não Tem Arroz Com Feijão”
(Hoje todas as batutas vêm te exaltar
Ensaboa mãe, ensaboa)
O mestre mandou girar o carrossel
Aluno que sou tiro o meu chapéu
Pra este malandro, sagaz e maneiro
O maestro batuqueiro

Ana Paula Alves Ribeiro:
É um carnaval solidário, um carnaval lúdico, mas principalmente um carnaval que vai falar das questões raciais do Brasil, que vai trazer muitas crianças das vizinhanças, das comunidades nas quais essas escolas estão inseridas, muitas crianças negras. É muito interessante da gente perceber que o que a gente aprende nesses desfiles eles estão para além do enredo, né, eles estão pela percepção do que se apresenta, da performance, do corpo, da ancestralidade.

Música: Mix de baterias de escolas de samba do Rio de Janeiro fica de fundo

Marcelo Abud:
As escolas de samba mirins do Rio de Janeiro são projetos com foco na criança e na juventude da cidade. A participação de dezenas de milhares de pessoas fortalece a cultura em torno do samba.
Marcelo Abud para o podcast de Cidadania do Instituto Claro.

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