Ouça também em: Ouvir no Claro Música Ouvir no Spotify Ouvir no Google Podcasts Assina RSS de Podcasts

No mês em que é comemorado o Dia Internacional da Mulher, o canal no youtube do projeto “Sobejo: processo indeferido” disponibiliza cinco episódios de uma websérie que apresenta as diversas formas de violência doméstica tipificadas na Lei Maria da Penha (11340/2006).

“Um dia a gente estava numa reunião, lá na produção: ‘por que não colocar sobejo?’. Porque sobejo tem o significado de resto, de migalhas. É o significado dessa violência que é tão perversa, porque ela não machuca somente o físico, ela destrói a sua alma também. Se dependesse dessa migalha, ela não mais viveria. É esse resto que este machista, que este agressor quer que a gente aceite e a gente não vai aceitar”, defende uma das idealizadoras do projeto Eddy Veríssimo. Ela concebeu a websérie com a atriz Juliana Monique.

Leia também: Cenas de filmes, séries e novelas ajudam a conscientizar sobre violência doméstica

Nos capítulos de ‘Sobejo’, atrizes diferentes interpretam a personagem Georgina Serrat, mulher que vê sua dignidade, felicidade e sonhos frustrados quando descobre no casamento a face violenta do marido. A narrativa é ficcional, mas a escrita tem como base fatos reais que envolvem diversas formas de violência doméstica:  patrimonial, sexual, psicológica, moral e física.

Além de parte da equipe envolvida, o áudio conta também com o depoimento de Andreia Almeida, conselheira Estadual de Defesa dos Direitos das Mulheres do Estado da Bahia, idealizadora e diretora do Coletivo Mulheres de Atitude. Ela explica o que caracteriza cada uma dessas violências e porque as agressões psicológicas, patrimoniais e sexuais nem sempre são percebidas pelas mulheres que as sofrem.

Veja também:

Violência doméstica, assédio sexual e feminicídio se mantêm elevados no país durante a pandemia

Mapa da Violência de Gênero disponibiliza informações sobre agressões a mulheres e LGBTQ+

Plataforma reúne dados sobre a violência contra as mulheres no Brasil

Transcrição do Áudio

Música: trilha sonora original do projeto “Sobejo”, criada por Roquildes Junior, fica de fundo

Eddy Veríssimo:
Uma irmã minha tomou um tiro na mão, do antigo companheiro, porque não queria que ela trabalhasse, que é quando o companheiro começa a se incomodar com tudo o que a mulher vem a fazer. Se a mulher penteia o cabelo de uma forma diferente, aquilo já via um incômodo. Então, isso é a primeira fase do ciclo da violência doméstica. E ele não só feriu fisicamente, mas o psicologicamente também, porque é uma ferida que está marcada pra sempre na vida dela.
Eu sou Eddy Veríssimo. Dentro do projeto “Sobejo – processo indeferido”, eu sou uma das idealizadoras e, também, estou como atriz.

Luiz Buranga:
Quando eu era garoto, o marido de uma tia que eu tinha, quando ele não queria que ela saísse de casa – ela tinha muito medo de sapos -, ele pegava três, quatro sapos, amarrava num cordão e pendurava na porta. E ela não conseguia sair de casa. Ficou muito na minha memória. É uma agressão muito psicológica. Era medonho.
Luiz Buranga. Sou ator de teatro e tenho me aventurado muito (nesta) questão de roteiro.

Vinheta: Instituto Claro – Cidadania

Música original do projeto Sobejo segue de fundo

Marcelo Abud:
O projeto “Sobejo – Processo Indeferido” reúne uma série de conteúdos, com o propósito de utilizar a arte e o debate para esclarecer sobre as formas de violência doméstica que envolvem mulheres. Neste áudio, você vai conhecer cada uma dessas formas de violência tipificadas na Lei Maria da Penha e, também, saber detalhes sobre a websérie de 5 episódios que estão no canal do Youtube do projeto.

Eddy Veríssimo:
“Sobejo” é o nome do espetáculo, né? Quando a gente começou a entender o que estava na escrita, um dia a gente estava numa reunião, lá na produção: ‘por que não colocar sobejo?’. Porque sobejo tem o significado de resto, de migalhas.

Luiz Buranga:
O ‘Sobejo – Processo Indeferido’ faz uma referência ao processo da personagem Georgina Serrat, um processo indeferido, não foi uma coisa favorável pra ela.

Eddy Veríssimo:
Porque essa mulher, durante 10 anos, viveu dessa forma. É o significado dessa violência que é tão perversa, porque ela não machuca somente o físico, ela destrói a sua alma também; que se dependesse dessa migalha, ela não mais viveria. É esse resto que este machista, que este agressor quer que a gente aceite e a gente não vai aceitar.

Trecho do episódio 2 (Chuva) da websérie “Sobejo – Processo Interrompido”
Juliana Monique (atriz):
(Revoltada) Eu vou dar uma queixa sua! (Gritando) Sai, Fred! Me deixa, Fred, sai! Eu não tenho culpa das suas drogas, eu não tenho culpa das suas cachaças, eu não tenho culpa de nada. Sai, Fred! Todo dia é isso! Que inferno! Sai, Fred! Sai!!!! (porta batendo)

Marcelo Abud:
A Conselheira Estadual de Defesa dos Direitos das Mulheres do Estado da Bahia e idealizadora e diretora do Coletivo Mulheres de Atitude, Andreia Almeida, também participou do projeto. Ouvida pelo Instituto Claro, ela explica que muitas vezes a sociedade só entende que existe violência quando há agressão física.

Andreia Almeida:
A sociedade como um todo entende, muitas vezes, que a violência doméstica e familiar se resume apenas à violência física, que a gente costuma dizer que é aquela que é vista. Porém, com o tempo, temos observado que muitas mulheres vivem o contexto de violência doméstica sem perceber quando se trata da violência psicológica, que elas não conseguem compreender o tamanho do mal que aquele agressor faz, quando mexe com o emocional dela, a tal ponto de fazê-la desistir de avançar ou se manter dentro do relacionamento.

Marcelo Abud:
Se a agressão física é reconhecida como violência e a psicológica nem sempre é percebida, há ainda outros tipos violências na Lei Maria da Penha, de 2006.

Andreia Almeida:
A violência moral, que ela é entendida como qualquer conduta que considera uma espécie de calúnia, difamação ou injúria à mulher;
A violência física: qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
A psicológica: onde tem um dano emocional pra essa mulher. A diminuição da sua autoestima ou qualquer ação ou omissão que lhe prejudique o pleno desenvolvimento;
A violência sexual, que ela é entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar ou a manter ou a participar de uma relação sexual não desejada;
E, por último, a violência patrimonial, que é a conduta que configura algum tipo de retenção, subtração, destruição parcial ou total dos seus objetos pessoais – documentos pessoais, bens, valores e até mesmo recursos econômicos também – se configura dentro da violência patrimonial.
São os cinco tipos de violência tipificadas na Lei Maria da Penha.

Marcelo Abud:
Além da psicológica, as violências patrimonial e sexual dificilmente são identificadas como formas de agressão.

Andreia Almeida:
Por uma questão cultural, onde se passa uma mensagem de que a mulher tem que estar sempre disponível para o homem, quando se trata do ato sexual, por ser um casamento. E, quando esse agressor passa a obriga-la a manter ou passa a intimidá-la a ter relação sem o uso de preservativo – que também é considerado uma violência, porque ele está negando o direito de escolha dela – é uma violência que muitas mulheres vivenciam e não reconhecem, por causa desse fator cultural.
E a patrimonial. Muitas vezes o agressor detém os recursos tanto dele quanto dela – os recursos financeiros. É ele que administra o cartão de crédito, que realiza o pagamento, que faz o direcionamento das compras, ou seja, ele consegue evitar que ela tenha esse trato e, com isso, ele aprisiona a mulher dentro de um processo que ela não consegue ter autonomia financeira que ela necessita, porque ele se diz ser o “melhor colocado”, se assim posso dizer, pra direcionar a renda, né, da família, em que, muitas vezes, a maior parte dessa renda detém do fruto do trabalho da mulher.

Trecho do episódio 1 (Uma Agenda Esquecida) da websérie “Sobejo – Processo Interrompida
Ator:
(Berrando) Eu sou o homem da casa, está entendendo? Eu chego a hora que eu quiser e você não tem direito de exigir nada! Está entendendo?
Eddy Veríssimo:
(Angustiada, sufocando) Pare com isso, Fred! Você está me machucando! Pare com isso, Frederico! Você passou de todos os limites! Eu não estou mais aguentando! Para com isso!

Luiz Buranga:
Essa figura da Georgina Serrat ela é puramente ficcional, mas a maioria das coisas do texto são coisas baseadas em fatos reais, em relatos, em coisas que eu ouvi, que eu pesquisei.

Andreia Almeida:
A arte ela é altamente plural. Apesar da Lei Maria da Penha, a gente teve um direcionamento pra também acolher esse agressor e fazer ele perceber que as atitudes que ele vem tendo ‘é’ crime, fazer utilização da arte para que o mesmo se identifique enquanto agressor é importante.

Eddy Veríssimo:
Essa luta é de todos nós, porque se a gente consegue reverberar isso pra um homem e o homem entender que essa luta também é dele, a gente vai ter menos um agressor no mundo e isso eu te digo com precisão, porque neste projeto a gente ouve muitos depoimentos… de homens que vêm assistindo, acompanhando a gente e se transformando a partir desse conhecimento passado através do espetáculo, através de uma live… de a gente ouvir depoimentos de homens dizendo pra gente ‘eu sou agressor, mas eu não sabia que aquilo que eu fazia com a minha esposa, era uma agressão. A gente ficou emocionada, a gente chorou muito de ver também mulheres dizendo ‘poxa, eu tive coragem de denunciar’. Então, se você consegue construir uma rede, isso vai agregando ainda mais esse fortalecimento e essa rede não vai se quebrar.

Marcelo Abud:
O projeto foi idealizado por Eddy Veríssimo em parceria com a atriz Juliana Monique, que revela ter se surpreendido com a força desta rede de acolhimento às mulheres vítimas de violência.

Juliana Monique:
Eu percebi toda uma articulação para o acolhimento de mulheres em situação de violência. Não somente com as delegacias, mas também com os coletivos de mulheres. A gente descobriu um escritório social, que faz acolhimento de mulheres em situação de privação de liberdade, mas que também reorganiza essa mulher, recoloca ela neste ciclo de convívio, de reparação de danos. Entender as ações políticas e sociais foi fundamental, acho que isso impacta muito e acho que a sociedade tem que saber, inclusive, pra poder difundir, pra poder dizer ‘olha, saia desta condição, receba apoio de mulheres, principalmente, e de órgãos públicos, que a gente percebe que o resultado está vindo, através das políticas públicas.

Música: trilha sonora original do projeto “Sobejo”, criada por Roquildes Junior, fica de fundo

Marcelo Abud:
Por meio da arte de conteúdos diversos, o projeto “Sobejo – Processo Indeferido” promove conscientização contra violência doméstica e combate ao feminicídio.
Com apoio de produção de Daniel Grecco, Marcelo Abud para o Instituto Claro.

0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments

Receba NossasNovidades

Receba NossasNovidades

Assine gratuitamente a nossa newsletter e receba todas as novidades sobre os projetos e ações do Instituto Claro.