Discutir as implicações do racismo estrutural na luta antimanicomial no Brasil é o objetivo do e-book gratuito “Direitos humanos, saúde mental e racismo: diálogos à luz do pensamento de Frantz Fanon” . A obra, disponibilizada gratuitamente, é produzida pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro (RJ) e deriva de um curso de extensão online promovido pela instituição em 2020. A formação trouxe informações sobre luta antirracista para trabalhadores do sistema de justiça, estudantes, usuários e familiares.

O e-book resgata o pensamento do psiquiatra e filósofo negro Frantz Fanon. São 16 capítulos assinados por profissionais da saúde, justiça, ciências sociais e direitos humanos. A organização é da defensora pública Patricia Carlos Magno e da professora Adjunta da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Rachel Gouveia Passos.

“Como pode, no Brasil, tanto o tema do racismo como o pensamento de Frantz Fanon serem novidades ao movimento de luta antimanicomial? Um país que viveu a maior parte do tempo sob a escravidão; um país onde o serviço de saúde mental foi estruturado a partir da eugenia e do racismo; um país cujo ‘hospício’, descrito por Lima Barreto como “Cemitério dos vivos”, se notabilizou pelo caminhar sem alma de corpos negros nus”, questiona o professor do Departamento de Saúde, Educação e Sociedade da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Deivison Mendes Faustino.

“Navio negreiro”

Fanon influenciou o precursor do movimento de reforma psiquiátrica italiano Franco Basaglia. “Falamos de Basaglia no Brasil, quando se fala das origens da Reforma, sem mencionar Fanon e, muito menos, nos debruçarmos sobre os efeitos do racismo na saúde mental. Só o racismo explica esse notável e doloroso feito”, diz Faustino.

Em uma das vindas de Basaglia ao Brasil, no final dos anos 1970, esteve na colônia de Barbacena, em Minas Gerais, e a comparou à experiência do holocausto nazista. Essa analogia gerou no Brasil algumas publicações, como o livro e o documentário Holocausto brasileiro. A maioria dos corpos fotografados no Hospício de Barbacena, contudo, eram negros. “Nesse sentido, deixamos a seguinte provocação: é holocausto ou navio negreiro que está sendo atualizado nos manicômios brasileiros?”, questiona Passos.

Falta de dados

Os autores lembram também que, ainda hoje boa parte dos indicadores de saúde são trabalhados sem o recorte de raça e cor, o que dificulta a criação de pesquisas e políticas públicas que considerem o racismo. “Isso não é à toa. Atuam exatamente no sentido de invisibilizar tramas históricas, sociais e políticas do ‘racismo nosso de cada dia’” destaca a professora e pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz Roberta Gondim de Oliveira.

Veja mais:

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O pensamento de Frantz Fanon e sua obra ‘Pele negra, máscaras brancas’

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