Filmes e documentários podem ajudar o professor a refletir sobre o fenômeno da violência nas escolas. Segundo pesquisa realizada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), foram registrados 23 ataques com violência extrema em escolas no Brasil nos últimos 20 anos, entre 2002 e 2023, nos quais morreram 24 estudantes, quatro professores e dois profissionais da educação.

“A gente tem vivido o acirramento de várias formas de violência escolar, que é tanto simbólica e verbal quanto física”, explica o mestrando em educação e membro do coletivo de cinema e educação “Janela Aberta” Rubens Baldini Neto.

Três tipos de filmes e documentários podem ajudar o professor a pensar o fenômeno da violência nas escolas: os que tratam diretamente dos casos de violência, os que abordam direitos humanos e os que falam sobre o pertencimento dos estudantes na escola.

“Filmes que abordam questões de direitos humanos são indicados porque a violência também é resultado de preconceito, exigindo que se amplie o repertório sobre questões étnico-raciais, de gênero, sexualidade e intolerância religiosa, valorizando diferenças e a diversidade”, ressalta o professor de direitos humanos, educação e inclusão da Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – campus de São Gonçalo (FFP/UERJ) Alexandre Guerreiro.

“Há preconceitos que os docentes carregam. Muitos, por exemplo, não sabem lidar com questões de gênero e sexualidade”, acrescenta Guerreiro, que trabalha com cineclube na formação inicial dos professores.

Nesse caso, Neto defende filmes que apoiam a importância da escuta ativa dos estudantes para prevenir violências.

“Uma escola que não tem grêmio e espaço de escuta dos alunos enfrenta violência exacerbada, não apenas verbal, mas também material. O estudante que não se sente pertencente àquele espaço pode danificar o patrimônio escolar”, enfatiza.

Sensibilização do olhar

Para Neto, o cinema é um instrumento para sensibilizar e discutir temas tabus. “Muitas vezes, imagens da violência na mídia e no próprio cotidiano escolar são tão banalizadas que não refletimos sobre ela. Além disso, há uma linguagem de violência reproduzida também pelos adultos na escola e presente na cultura escolar. Motivo pelo qual a comunicação não violenta também é importante no ambiente escolar”, defende.

Porém, ao assistir a filmes sobre violência na escola, são necessários alguns cuidados. Como acreditar que os filmes – ou mesmo documentários – são uma “realidade”.

“Um filme não é apenas a narrativa: ele tem questões de abordagem estética e artística”, alerta Guerreiro.

“Também não se deve comprar a narrativa de que toda escola é violenta; que haja soluções fáceis para realidades complexas ou que uma mesma solução possa ser replicada para todas as escolas”, lembra Neto.

Para ele, tanto um filme de ficção quanto um documentário sobre violência nas escolas pode ser capaz de sensibilizar na mesma medida.

“O professor não deve ver um filme pensando em reproduzir o que foi realizado. A partir da sua sensibilidade frente ao que é mostrado no filme ou documentário, o professor pode se mobilizar para alterar os processos na sua realidade”, pontua Neto.

“Inclusive, ao assistir a um documentário que traga uma realidade diferente da que vive e convive, ele pode repensar sua atuação”, complementa.

“O professor deve ser crítico. Não precisa concordar com tudo o que o filme traz”, destaca Guerreiro.

A seguir, confira nove filmes que ajudam o professor a entender a violência nas escolas:

Precisamos falar sobre Kevin (2011)

Aos 15 anos, o personagem Kevin mata 11 pessoas, entre colegas do colégio e familiares. Enquanto ele cumpre pena, sua mãe Eva reflete sobre o filho enquanto é discriminada em sua comunidade.

Se essa escola fosse minha (2017)

Apresenta as experiências e situações de violência vivenciadas por estudantes LGBT no ambiente escolar.

Elefante (2003)

O filme dirigido pelo premiado diretor Gus Van Sant é um retrato artístico do massacre de Columbine.

Diálogos sobre violência na escola (2015)

Documentário longa-metragem produzido pelos bolsistas do PIBID Geografia do Instituto Federal do Pará (IFPA), que explora diferentes olhares acerca da violência no cotidiano das escolas em Belém-PA.

Tiros em Columbine (2002)

Documentário de Michael Moore sobre um dos primeiros ataques em massa em uma escola nos Estados Unidos. Ele investiga as causas da violência armada no país, usando o massacre na Columbine High School como exemplo. O filme analisa o fácil acesso às armas, a cultura do medo e a influência da mídia.

Entre os muros da escola (2008)

O filme acompanha um professor de francês que dá aulas em uma escola de ensino médio situada na periferia de Paris. A narrativa mostra o cotidiano escolar, as relações entre educadores e estudantes, a aplicação de punições, entre outros.

“Aborda a violência simbólica e, a partir daquela realidade que é diferente da das escolas brasileiras, pode-se refletir sobre o cotidiano do professor.”

Orlando, minha biografia política (2024)

Realizado cem anos após o livro “Orlando: uma biografia”, de Virginia Woolf, que apresenta um personagem que passa por uma transição de gênero, o filósofo e diretor trans Paul B. Preciado envia uma carta à autora, afirmando que seu personagem ganhou vida. Para isso, ele reúne no documentário 26 pessoas trans e não-binárias que representam ‘Orlandos contemporâneos’.

“O documentário amplia e traz elementos para entender questões de gênero, ajudando a superar casos de violência, discriminação e bullying na escola”, aponta Guerreiro.

Espero a tua (re)volta (2019)

Documentário sobre o movimento estudantil que, a partir de 2015, ocupou escolas em várias partes do Brasil. A obra acompanha três jovens e utiliza imagens de protestos desde 2013 para mostrar as ocupações e suas principais reivindicações pelo olhar dos próprios estudantes.

“Também aborda como a violência policial atinge a escola e a importância da escuta dos alunos para proporcionar sentimento de integração e prevenir violência”, aponta Neto.

Eleições (2018)

A rotina do ensino médio de uma escola no centro de São Paulo muda com a aproximação das eleições do grêmio estudantil. O processo impacta as relações entre os alunos, de forma semelhante ao que ocorre nas eleições presidenciais, mas em menor escala.

“O filme aborda a importância do grêmio para a escuta dos alunos, sendo que muita da violência que vivemos é por falta de mecanismos assim”, finaliza Neto.

Veja mais:

10 iniciativas para prevenir e lidar com a violência nas escolas

Além de refletir agressões do entorno, escola também produz sua própria violência

Qual o papel da escola no combate à violência contra crianças?

Violência física contra professor nasce de outras formas de agressão, afirma especialista

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