“Meu nome é Liberdade” é uma série de três temporadas (2018-2021) que narra a história ficcional de Aminata Diallo, que é capturada na África quando criança e levada aos Estados Unidos como escrava no século XVIII. Com o passar dos anos, ela consegue se alfabetizar e fugir para o Canadá. A série é um material rico para ser trabalhado na escola, especialmente nas aulas de história, geografia e língua portuguesa.

A produção é baseada no livro premiado “O livro dos negros” (The book of negroes), de Lawrence Hill. O título é inspirado em um documento histórico que registrou os nomes de três mil escravizados afro-americanos que lutaram para as forças inglesas durante a Revolução Americana e, com isso, podiam solicitar a alforria no Canadá. Assim, a série mistura fatos fictícios com eventos e personalidades reais.

A professora de artes visuais do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro (RJ), Sirlene Ribeiro Alves indica trabalhar os seis primeiros capítulos da primeira temporada para falar sobre a escravidão da população negra, traçando paralelos com a história brasileira. “A série traz a visão de uma personagem feminina do processo e retrata temas que possuem similaridades com nosso país, incluindo as consequências desse período histórico nos dias de hoje”, assinala.

Alves é doutoranda da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e pesquisa educação e abolição no Brasil. Ela é autora de um artigo sobre o uso educacional da série no e-book gratuito “A educação em séries: temas e tramas” (2020), da Universidade Federal do Piauí (UFPI) .

Confira também: História negra: documentário ‘Emicida: AmarElo – É tudo para Ontem’ pode ser usado em aula

A mulher na escravidão

Segundo a docente, um tema que pode ser debatido com os estudantes é justamente a questão feminina na escravidão. “Angela Davis no livro ‘Mulheres, raça e classe’ lembra que o sistema escravista definia o povo negro como propriedade e unidade de trabalho a ser explorada para dar lucro. Apesar de homens e mulheres serem explorados iguais, a mulher ainda tinha o abuso e a exploração sexual como forma de punição”, analisa Alves.

“Logo no início da trama, quando criança sequestrada na África, seus algozes falam da condição reprodutora para a personagem. Ela teme a violência sexual e acaba sendo uma vítima da mesma”, descreve. A personagem chega a casar e engravidar de outro escravizado, mas tem a criança retirada de seus braços. “Assim, a série trata da transmissão da servidão pelo ventre. Filho de uma escravizada, nascia escravizado. Algo que é abolido no Brasil com a Lei do Ventre Livre”, aponta.

Além disso, a luta da protagonista para conseguir a sua liberdade e a dos seus pode ser associada à de outras mulheres negras escravizadas no Brasil, muitas delas invisibilizadas pela história. “Temos Dandara dos Palmaras; a princesa do Congo Aqualtune e Luísa Mahin. Porém, podemos citar também Esperança Garcia, que era alfabetizada e escreveu uma carta ao presidente da província denunciando os maus tratos que ela e filhos sofriam. Na minha pesquisa, ainda conheci Clara, mulher escravizada que escreveu uma carta ao abolicionista Vicente de Souza buscando ajuda”, recomenda.

Educação para emancipar

Outro tema trazido nos primeiros capítulos é a importância da educação e do domínio da leitura e escrita para a emancipação de escravizados e negros – pontos que, no Brasil, a história de Esperança Garcia e de Clara ajudam a ilustrar. “Na série, Aminata se alfabetiza sozinha e esconde isso de seu senhor, já que saber ler e escrever era deter poder. Porém, a protagonista não guarda tal conhecimento para si, transmitindo para outras pessoas escravizadas”.

Para Alves, a série ainda tem o mérito de mostrar os escravizados como seres humanos, com objetivos, lutas e desejos diversos. “Também lembra que a luta não terminava depois da conquista da liberdade. O preconceito e a discriminação se faziam presentes na disputa de emprego com outros homens e mulheres livres. Marcas desse período ainda presentes no Brasil dos dias atuais”, reforça

A série tem potencial interdisciplinar, podendo ser associada também a geografia – enfocando a diáspora do povo negro e sua chegada aos demais continentes – e língua portuguesa, nos estudos do gênero autobiografia.

Na disciplina de Artes, Alves associou a série ao trabalho de duas artistas negras e brasileiras, Rosana Paulino e Aline Mota. “São artistas negras que refletem sobre a temática da escravidão por meio da linguagem visual”, indica. “Independente da disciplina e da atividade, o primeiro passo é ter muitas conversas e debates com os alunos sobre o que foi assistido antes de partir para as associações”, recomenda.

Veja mais:

“Não estudar heroínas negras é negar parte importante da nossa história”

HQ sobre escravidão premiada internacionalmente pode ser utilizada em sala de aula

Livros didáticos de história apresentam informações desatualizadas sobre ex-escravos

Plano de aula – Escravidão africana

Atualizado em 14/4/2022, às 14h05

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