Jogos teatrais e dramatizações já estão incorporados na realidade de muitas escolas públicas, seja como forma de expressão artística ou como metodologia para ensino de diferentes conteúdos. Tais recursos, contudo, podem ser trabalhados de forma ainda mais aprofundada por meio do psicodrama – linha da psicologia criada pelo psiquiatra romeno radicado nos Estados Unidos Jacob Levy Moreno (1898-1974).
“O pai da psicanálise, Sigmund Freud, usava a verbalização do paciente na consulta para conquistar uma catarse. A teoria de Moreno incorporou a ação no trabalho terapêutico”, descreve o psicodramatista e professor da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Valério José Arantes.
A teoria que nasceu no teatro e caminhou para a psicologia também chegou à educação. Além do viés terapêutico, Moreno cunhou o que ficou conhecido como psicodrama pedagógico. “É o psicodrama que pode ser praticado por professores em ambiente escolar ou por educadores em outros locais de aprendizagem formal e informal”, resume o psicólogo, psicodramatista e coordenador do Mestrado Profissional em Artes da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Sérgio de Andrade Bareicha. A própria definição de Moreno para o psicodrama permitia um uso para além da clínica: “É uma ciência que explora a verdade por métodos dramáticos”.
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Aprendizagem e empatia
Na educação básica, Bareicha explica que o psicodrama pode ser utilizado com os estudantes para trabalhar problemas de relacionamento, ensinar conteúdos curriculares, em processos de criação e também de autoconhecimento. Na resolução de conflitos, o psicodrama permite ao aluno entender sentimentos e se colocar no lugar do outro, gerando empatia. “Ele pode, por exemplo, representar o papel de um colega, do professor, de um funcionário ou mesmo do pai ou da mãe de outro aprendiz”, exemplifica Arantes.
Como metodologia de ensino, permite uma aprendizagem que vai além das palavras. “Fortalece a retenção do conteúdo, pois ao se colocar em ação e viver um personagem, estimula-se uma memória que é corporal. Aquilo que foi aprendido nunca mais se esquece”, destaca o psicodramatista.
Os próprios alunos tendem a se apropriar da técnica quando passam a conhecê-la. “Em uma aula de física, um estudante propôs ao professor colocar três alunos para representarem um elétron, nêutron e o átomo girando. A aula se deu com eles interagindo”, relata Arantes.
Como método de criação, seus benefícios são o estímulo à espontaneidade e o controle da ansiedade.
“Já no campo do autoconhecimento, o psicodrama pode ser utilizado nas atividades de projeto de vida ou de orientação vocacional”, exemplifica Bareicha. Segundo o professor da UnB, elementos artísticos, educativos e terapêuticos se complementam no psicodrama aplicado à educação. “Um desafio presente na escola pode exigir uma resposta holística, envolvendo simultaneamente cuidado, aprendizagem e expressão”, exemplifica.
Respeitando limites
Para aplicar o psicodrama em sala de aula, é necessário que o professor da educação básica passe por uma formação. O objetivo é fornecer ferramentas para ele explorar a técnica e entender as emoções e reações dos alunos, sendo apto a ampará-los durante a prática. “Quando entram em ação, a criança e o adolescente podem esquecer que estão dramatizando. O processo desencadeado pode levar ao sofrimento. É o que acontece, por exemplo, com atores que ficam abalados após se dedicarem a um papel difícil”, justifica Arantes. “Com a formação, o professor é capaz de entender qual o limite dele e dos estudantes”, complementa.
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Atualizado em 27/07/2021, às 17h02