Tinkering é uma metodologia de aprendizagem “mão na massa” que tem ganhado destaque no campo da educação. O termo, que não tem tradução direta para o português, propõe uma livre exploração de ideias e materiais pelos estudantes, o que permite adaptações e improvisações ao longo do processo de investigação.

“O conceito do tinkering – fazer suas próprias perguntas, observações, compartilhar o que se descobriu, construir e testar suas ideias em tempo real e com coisas reais – é justamente a definição de aprendizado”, compara o codiretor do Tinkering Studio Mike Petric, dos Estados Unidos, que exerce a função junto com Karen Wilkinson.

Apesar da semelhança na metodologia com a aprendizagem maker (“faça você mesmo”), há diferenças significativas entre ambos.

“Tinkering é mais sobre explorar enquanto você está fazendo e construindo, enquanto o maker é sobre construir seguindo instruções”, diferencia Petric.

Isso faz com que o processo de tinkering seja propositalmente mais “bagunçado”, com o planejamento acontecendo durante o percurso de descoberta dos estudantes, e não propriamente no início da jornada.

A seguir, entrevistamos Karen Wilkinson e Mike Petric sobre como funciona essa metodologia de aprendizagem e como ela pode ser utilizada pelos professores das redes públicas brasileiras.

Para saber mais sobre as dimensões de aprendizagem que envolvem essa metodologia, o Tinkering Studio disponibiliza um documento explicativo em português.

Instituto Claro: O que é o tinkering?

Mike Petric: É uma abordagem para ensinar e aprender que pressupõe que não aprendemos apenas ouvindo, mas explorando e experimentando. Isso acontece por meio dos materiais, das ferramentas e explorações que fazemos sobre o modo como o mundo funciona e pela maneira como as ideias que temos se conectam nesse processo.

Karen Wilkinson: É uma maneira de explorar e aprender sobre o mundo ao seu redor. É um processo e algo que você faz, mas também uma abordagem para ensinar e aprender.

Qual é a diferença entre tinkering e maker?

Petric: Maker é uma abordagem conhecida por usar ferramentas, materiais e algumas tecnologias, geralmente, para construir algo usando instruções. Portanto, há muita exploração, passo a passo e ferramentas no processo de criação, e você pode aprender coisas ótimas por meio do maker. Tinkering é um pouco diferente, porque você também está construindo e usando ferramentas, porém, não necessariamente seguindo instruções. Na verdade, você está perseguindo suas próprias ideias e prestando atenção em como esses materiais e conhecimentos reagem às experimentações.

Wilkinson: A linha entre ambas pode ser um pouco embaçada. Ambos são processos maravilhosos para aprender explorando materiais, especialmente no campo das ciências e artes.

Como os professores podem explorar o tinkering na sala de aula?

Wilkinson: Tinkering é uma prática de sala de aula e pode ser uma forma maravilhosa de explorar projetos em grupos ou individualmente. As melhores situações que vemos é quando os professores conseguem que a aprendizagem dos alunos seja um projeto deles próprios. Então, seja o que for, eles estão investigando juntos e assumem isso como algo deles que está se iniciando. Usam isso como um espaço de exploração para trabalharem coletivamente.

Petric: Tinkering não é um tópico, um assunto, apenas uma pequena parte do dia da criança na escola, mas uma abordagem holística, que acontece muitas vezes e de diversas maneiras ao longo de um dia de aula. Porém, exige que o professor também tenha disposição e curiosidade sobre o que as crianças questionam. Em vez de dizer o que elas precisam saber, permitir que essas ideias cresçam naturalmente e dar apoio para que elas as explorem.

Qual é a relação entre tinkering e planejamentos?

Mike: Tinkering envolve uma observação muito profunda e cuidadosa sobre como as disciplinas e conteúdos se conectam com objetos e explorações, como uma coisa que você está construindo se comporta de uma maneira interessante. Assim, exige que você preste atenção às ideias que aparecem para depois planejar como seguir. Portanto, não é muito sobre planejar antes de começar a experiência, mas muito sobre planejar enquanto você está no processo. Você primeiro obtém novas ideias e depois planeja como abordá-las. É papel do professor planejar essa exploração, facilitar a experiência que surgir e, depois, refletir sobre o que aconteceu junto aos alunos para depois seguir para novos passos. E refletir sobre aquilo que aconteceu de forma esperada, mas inesperada também.

Wilkinson: É sobre realmente estar aberto às possibilidades que emergem baseadas no que acontece na sala de aula e nas explorações coletivas. É planejar e facilitar a experiência refletida no que está acontecendo para só depois lançar essa experiência para uma nova investigação, como uma espiral de aprendizagem continua.

É possível usar o tinkering mesmo sem um plano ou objetivo claro no início?

Petric: Eu acho que pessoas que pesquisam individualmente podem iniciar o processo mesmo sem um plano ou objetivo claro. Mas geralmente há um significado pessoal naquilo que você está interessado em explorar mais. Para os professores, entretanto, eu diria que é necessário ter uma lista de objetivos quando você se prepara para um projeto de tinkering. Não algo do tipo “ensinar algo a alguém dentro de um método científico”, mas um objetivo de que as crianças explorem e desenvolvam suas próprias ideias a partir de uma variedade de conceitos e ideias científicas. Então há muito planejamento para se criar possibilidades criativas que permitam o surgimento de novas ideias, mas não que esse planejamento ocorra bem no início do processo. No tinkering, você deve saber que algo inesperado pode acontecer, então você muda seus planos diversas vezes ao longo da caminhada. Desde que você esteja trabalhando a área geral que os estudantes escolheram explorar, funcionará muito bem. Geralmente, projetos de tinkering misturam de forma bacana ciências, artes e, às vezes, tecnologia. Então é sobre conseguir criar condições para explorar todos esses tópicos de uma forma lúdica e inspiradora.

Wilkinson: É sobre os professores planejarem promover pensamentos, improvisações e conexões com a imaginação, usando as disciplinas ou conceitos que estão estudando. Eu acho que há uma confusão quando você ensina ciências a partir do método cientifico, porque usar tinkering precisa que todas as coisas estejam juntas e os alunos experimentem diversas possibilidades. É isso que o professor precisa planejar.

Como o conhecimento sobre tinkering pode contribuir para o professor em sua rotina educativa?

Petric: O conceito do tinkering – fazer suas próprias perguntas, observações, compartilhar o que descobriu, construir e testar suas ideias em tempo real e com coisas reais – é justamente a definição de aprendizado. Vemos o tinkering como uma abordagem pedagógica de aprendizagem baseada nas ideias dos estudantes, nos seus interesses, e a rotina de um professor deveria ser dar suporte e desenhar essas oportunidades para eles se desenvolverem. De certa maneira, um processo de tinkering é a definição real do que um professor precisa ser na sua prática.

Wilkinson: Desenvolver uma prática faz parte da rotina do professor. Ver como essa prática pode gerar mais oportunidades de ensinar aquele conteúdo que precisa ser coberto, mas com uma abordagem mais lúdica, aumentando a motivação na sala de aula. No tinkering, você realmente assiste às ideias dos alunos emergindo como uma comunidade de aprendizagem em sala de aula, e o professor tem um papel relevante nessa relação.

O tinkering pode ser aplicado na realidade da escola pública brasileira?

Petric: Não só pode como está sendo aplicado, e não apenas no Brasil, mas globalmente. No Brasil, particularmente, vemos uma forte vontade dos professores de apoiar aprendizagens criativas que deem suporte para que seus alunos se tornem inovadores, inventores e solucionadores de problemas. É algo que se adequa a crianças de diferentes contextos e históricos, independentemente do gênero e da idade. Desenvolver uma disposição ao tinkering significa para as crianças desenvolver amor pela aprendizagem e curiosidade sobre o mundo, ter mais confiança em questionar e buscar respostas, pensar por elas mesmas sobre o que estão fazendo no agora e o que farão no futuro.

Wilkinson: É interessante ver diferentes abordagens de tinkering que emergem a partir de diferentes culturas, comunidades e contextos que trazem conexões muito singulares. Não existe uma única receita de tinkering que dará certo em todos os países do mundo, é mais importante valorizar ideias individuais e assistir ao que emerge. E o que está emergindo no Brasil é muito emocionante para nós. É particularmente relevante quando você consegue conectar o tinkering com culturas e tradições das comunidades locais, fazendo com que o processo ultrapasse um dia de aula ou a escola e abrace todo o entorno, o bairro, a comunidade e até o país. É ter a possibilidade de inserir e destacar novas oportunidades que não existiam antes.

Veja mais:

9 dicas práticas para implantar um espaço maker na escola pública

10 metodologias ativas de aprendizagem explicadas

Como trabalhar habilidades socioemocionais usando metodologias ativas?

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