A representação do indígena nos livros didáticos de geografia ainda é generalista, impregnada de estereótipos e não discute temas atuais vinculados a essas populações. A conclusão foi da licenciada em geografia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e professora da rede pública do Estado Michelle Correa. A docente analisou seis livros didáticos da disciplina para o ensino fundamental, lançados após a lei 11.645/08, que obriga o ensino da história e cultura indígena nas escolas.
“Há generalizações, como quando o autor não cita particularidades de alguma etnia, dando a entender que todos os indígenas pertencem a um mesmo povo, com costumes e língua iguais”, descreve. “Também notei referências ao passado e pouca contextualização com a questão indígena atual, como a luta por demarcação de terras, uso de tecnologias, presença em universidades, produção literária e audiovisual”, lista. Segundo a pesquisadora, alguns livros ainda induzem o estudante a acreditar que um indígena que usa celular, internet ou mora na cidade não é mais indígena, que perdeu sua cultura.
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Em contrapartida, dois materiais surpreenderam ao indicar obras literárias indígenas e uma foto de um set de cinema produzido por essas populações.“Ambos também trouxeram dados atualizados, dicas de site para pesquisar cada etnia do Brasil, notícias sobre conflitos de terra e luta por demarcação de territórios”, assinala. Os resultados de Correa foram publicados em um artigo científico.
Combate ao preconceito
Lecionando desde 2012 para diferentes etapas e redes de ensino, a professora relata ser recorrente a baixa identificação dos alunos com a temática dos povos tradicionais. “Pouco sabem sobre os indígenas brasileiros, sua diversidade e atuação. Imaginam-os como sujeitos do passado”, observa. Para ela, tais visões são influenciadas pela abordagem equivocada e estereotipada por parte da mídia e de livros didáticos. “A escola, porém, é o espaço para desconstruir os preconceitos e ampliar nossa visão de mundo”, contrapõe.
Correa acredita que a perpetuação de estereótipos impacta negativamente na aprendizagem dos alunos e, consequentemente, na sociedade em geral. “Enfraquecem as lutas indígenas e colocam a população indiferente ou contra elas. Isso quando não torna esses povos praticamente invisíveis ao restante da população”, analisa.
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Fontes diversificadas
Para apresentar a diversidade da cultura indígena, Correa sugere que os professores tragam exemplos de livros, cinema, música e política produzidos pela população nos dias de hoje.“É um dos caminhos para quebra dos estereótipos. Afinal, quem melhor que eles para falar de sua cultura, lutas e pensamentos?”, questiona.
Aos professores, ela orienta que tragam representantes de diferentes povos à escola, ou, caso não seja possível, apresentem vídeos, imagens e textos que ilustrem a diversidade étnica dos indígenas brasileiros. “Grandes escritores indígenas, de diferentes etnias, podem ser acompanhados nas redes sociais. O site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) traz dados atualizados sobre o assunto, assim como o Instituto Socioambiental, que reúne informações sobre cada etnia e a situação de seus territórios”, indica.
Planos de aulas e indicação de atividades produzidas por indígenas podem ser acessadas nos sites ÍNDIO Educa e do Laboratório de Ensino e Material Didático (Lemad), da Universidade de São Paulo. “A Rádio Yandê é gerida por indígenas e apresenta programação online com repertório de músicas de vários ritmos, etnias e línguas diferentes”, acrescenta.
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