Em 26 de março de 2019, o Conselho Nacional de Educação (CNE) revogou um parecer do próprio órgão, de 2010, que endossava o Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi) e o Custo Aluno-Qualidade (CAQ). Os mecanismos de financiamento foram criados pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação e estipulam o valor mínimo que o Estado precisa investir por cada estudante da rede pública para garantir uma educação de qualidade.

Para a docente da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do Comitê DF da Campanha, Catarina de Almeida Santos, o CAQi e o CAQ são fundamentais para que se cumpram os objetivos da educação previstos na Constituição: desenvolver plenamente o estudante, prepará-lo para o exercício da cidadania e para o mercado de trabalho.

“Não se garante ensino de qualidade sem professor bem formado, com condições aceitáveis de trabalho, escola com boa infraestrutura, número adequado de aluno por sala, entre outros. Para isso, é necessária a garantia de insumos”, sintetiza.

Os dois mecanismos ainda garantiriam que as desigualdades sociais presentes nas escolas rurais e urbanas, de regiões centrais ou periféricas e de estados mais ricos ou mais pobres fossem mitigadas, segundo ela. “Com o mínimo investido por aluno, é possível garantir oportunidades educacionais parecidas”, explica.

Para o pesquisador do Laboratório de Dados Educacionais da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Thiago Alves, o CAQi e o CAQ ajudariam a inverter a lógica de financiamento da educação no país que é praticada hoje, garantindo resultados positivos.

“É preciso saber quanto é necessário e, em seguida, buscar meios para financiá-lo”, destaca. “Sem um financiamento baseado em parâmetros de qualidade no que se refere a insumos, a lógica continuará sendo o valor aluno pré-estabelecido por regras baseadas na vinculação de um percentual da arrecadação de impostos [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb] e não como fazem os países desenvolvidos que tem o ensino público como um direito para todos”, afirma.

Em 2018, uma pesquisa da Campanha mostrou que, sem o CAQi, o investimento por aluno na rede pública era três vezes menor do que o necessário.

Lei descumprida

O CAQi e o CAQ estão incluídos na Meta 20 do Plano Nacional de Educação (PNE, Lei 13.005/2014), e deveriam ter entrado em vigor desde 2016. “O PNE determina que o governo federal e o Ministério da Educação (MEC) regularizem e difundam o valor do CAQi. Ou seja, quais insumos são necessários por aluno e o quanto esses custam”, lembra a professora da UnB. O Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão que estabelece as diretrizes e resoluções para a educação básica funcionar, chegou a emitir esse parecer enfatizando a importância do CAQi, em 2010. “Parecer, este, que nunca foi homologado”, diz.

“Se ele já tivesse sido validado, seria difícil alterar essa posição”, lamenta a presidenta da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Andrea Barbosa Gouveia.

Assim como Santos, ela também acredita que uma das consequências será a desigualdade de oferta e acesso à serviços e conteúdos nas diferentes redes públicas do país. Segundo a pesquisa TIC Educação de 2017, por exemplo, somente 36% das escolas rurais possuíam acesso à internet, contra 97% das urbanas. “Sem parâmetros, cada rede oferece o que pode e a desigualdade persiste. O CAQi foi pactuado justamente como um princípio de igualdade”, relembra.

Para as pesquisadoras, exigir que o PNE seja cumprido e lembrar sua força de lei são as saídas para não deixar esse mecanismo de financiamento morrer. “A ampliação do acesso à educação de qualidade depende do CAQi, que está previsto em lei, e também de recursos. Este último, hoje, bate no teto artificial criado pela emenda constitucional 95, que impede o investimento no setor por 20 anos, contando de 2016”, relembra Santos. “É preciso fazer o PNE, que é a nossa bússola, se cumprir e incorporar o CAQi no novo Fundeb”, alerta ela.

Gouveia lembra que todos os educadores, alunos e familiares podem se conscientizar sobre a importância de saber quanto custa a sua escola hoje, e quanto ela deveria custar. “Para a comunidade escolar, saber o preço de uma educação de qualidade ajuda no controle dos recursos e na valorização das políticas públicas”, finaliza.

Veja mais:
“Adoção” de escolas públicas por Igreja, PM e empresas mascara falta de investimento do Estado
“Educação precisa superar problemas do século 20 e apontar para o 21”
PEC 241: por que ela impacta na educação de qualidade do país?

Crédito da imagem: ijeab – iStock

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