Os produtos de limpeza são misturas formadas por compostos químicos para diferentes finalidades, como desengordurar, desinfetar, remover sujeiras, entre outros. “Dependendo do que é adicionado ao solvente, que geralmente é a água, haverá uma finalidade específica”, explica o professor de química e autor do perfil Moleculando (@moleculando), Lucas Moreno. Por esse motivo, eles podem ser utilizados no ensino de diferentes conteúdos de química nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio.

“No fundamental 2, já há uma noção de conceitos como substância pura, mistura, tipos de misturas de acordo com o aspecto visual (homogênea ou heterogênea), processos para separá-las e toxicidade de algumas substâncias”, afirma Moreno.

Leia também: Plano de aula: Introduzindo conceitos de solução e concentração química

Já no ensino médio, os produtos de limpeza podem ajudar a abordar temas como acidez, basicidade, formação de sais, compostos iônicos e moleculares, polaridade e solubilização.“Eles ajudam a familiarizar o estudante com a química cotidiana, pouco explorada pelos professores. Ao relacionar conteúdos curriculares ao cotidiano, promove uma aprendizagem mais significativa e divertida”, garante.

Experimentos simples

Moreno recomenda experimentos simples para trazer os produtos de limpeza para a sala de aula, mas que devem ser realizados com luva, máscara e óculos de segurança, em locais arejados e com janelas abertas. O primeiro deles é sujar a mão de um aluno com óleo e gordura para depois limpá-la primeiro com água e, posteriormente, com detergente. Na sequência, questione a classe porque o detergente foi mais eficaz na limpeza.

“No ensino fundamental, explique de maneira simplificada que o detergente consegue ‘quebrar’” a gordura em partes menores e também ‘entrar’ nas estruturas da gordura para que ela seja removida com o auxílio da água”, orienta.“No ensino médio, aborde conceitos como: tensão superficial da água, polaridade, solubilização, formação de micelas, interações intermoleculares e reação de saponificação”, sugere. “É possível, também, demonstrar em um copo com água e óleo que esses componentes até se misturam, mas não se dissolvem ou se solubilizam”, acrescenta.

O segundo experimento exige dois copos de vidro com água sanitária diluída e duas garrafas pequenas de refrigerante, um de cor alaranjada e outro escuro. Cada refrigerante será despejado em um único copo para mostrar que a remoção do corante é imediata.“No ensino fundamental, pergunte se ocorreu um fenômeno físico ou químico. O segundo é facilmente percebido quando há mudança de coloração, formação de gás ou sólido no fundo do recipiente”, aconselha Moreno. “Lembre-os que é por isso que a água sanitária ‘mancha’ a roupa, pois retira o corante existente nela”.Já no ensino médio, pode-se abordar conceitos como poder oxidante, reação de oxirredução e concentração/diluição.

Misturas cotidianas

Outro assunto que rende boas discussões com os alunos é o perigo de algumas misturas entre produtos de limpeza – muitas delas comuns no dia a dia — ou possibilidade de que uma substância anule a ação da outra. “A própria molécula de água já é uma estrutura química e, na grande maioria das vezes, não é utilizada sozinha em um produto. Sempre há a adição de outros compostos químicos, independente da concentração, força e toxicidade dessa substância”, diz o professor.

Moreno indica usar como exemplo a água sanitária. “Deve-se adicionar a ela apenas água e isto não torna a solução mais fraca. O que vai ocorrer é a hidrólise do NaClO (hipoclorito de sódio), formando um ácido muito oxidante e antisséptico, o ácido hipocloroso (HClO)”, descreve.

No rótulo da água sanitária, os próprios fabricantes alertam para os riscos das misturas com outros produtos. Com álcool caseiro (álcool etílico/etanol) é formado o triclorometano: CH₃CH₂OH (álcool etílico) + NaClO (água sanitária) + NaCl + H₂O ➝ CHCl₃ (triclorometano) + NaOH (Reação não-balanceada). “Este causa irritação na pele, no trato respiratório, nos olhos e pode levar à inconsciência”, alerta.

Com desinfetante a base de amônia (NH₃), produz-se outra substância irritante, a tricloroamina. “Lembrando que nossa urina também possui amônia, ou seja, não devemos jogar água sanitária onde urinaram, incluindo para limpar urina de cães”, alerta.
Com vinagre, a água sanitária forma gás cloro: CH₃COOH (álcool etílico) + NaClO (água sanitária) ➝ CH₃COONa + Cl₂ (gás cloro) + H₂O + O₂ (Reação não-balanceada).

“Causa irritação na pele e olhos, além de dor de cabeça e sensação de sufocamento. Pode, ainda, reagir com água e formar ácido clorídrico dentro do pulmão”, explica.Também é contraindicado misturar água sanitária com sabão. “No rótulo do sabão em pó, há a mensagem: ‘não misturar esse produto com produtos à base de cloro’. E, claro, se o sal presente na água sanitária chama hipoclorito, ela é, sim, a base de cloro”, destaca o professor.

Leitura de rótulos

Professor de química e mestre em Educação e Docência, Leonardo Medeiros de Souza usou a leitura dos rótulos dos produtos de limpeza para trabalhar conteúdos químicos nos 2º e 3 º anos do ensino médio. “Todo o conteúdo de diluição de soluções, concentração em suas mais diversas expressões, pode ser abordado por meio da leitura correta das informações desses rótulos. Mas esta não é feita ou é pouco compreendida devido à linguagem empregada e tamanho das letras”, explica.

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“Porém, termos como diluição, componente ativo, agente de ação e outros estão lá e podem ser trabalhados em sala de aula”, pontua o docente, que é autor do
artigo “Produtos de limpeza como uma temática para o ensino de Química na Educação de Jovens e Adultos” (2021).

Para isso, ele usou perguntas disparadoras para os alunos, como: você, ou algum conhecido, teve experiências negativas com produtos de limpeza? Você já leu os rótulos desses produtos? Você costuma misturar produtos de limpeza? Quais as principais misturas que costuma fazer?

Potencial interdisciplinar

Os produtos de limpeza também podem ser associados com as aulas de biologia e ciências, principalmente no campo da microbiologia. “Ao destacar seu uso para eliminar microorganismos, associam-se estrutura e concentração desses produtos com a penetração na membrana plasmática de uma bactéria”, diz Moreno. “A cadeia de contaminação pode ser abordada. Intoxicações causadas pelo mal uso destes produtos podem ser associadas a temas como doenças, sistema respiratório, interações metabólicas”, complementa Souza.

Em história, Moreno lembra do gás cloro utilizado na Primeira Guerra Mundial. “Esse gás pode ser produzido misturando produtos de limpeza”, assinala. Há ainda questões sociais que podem ser debatidas. “Como seu uso por profissionais domésticas e suas condições de trabalho, o acesso a produtos de limpeza e higiene doméstica, entre outros”, aponta Souza.

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