Quatro alunos de uma escola pública paulista se mobilizam para criar propostas e debater soluções durante o processo eleitoral do grêmio estudantil. Esse é o foco do documentário “Eleições”, dirigido pela cineasta Alice Riff, que estreou em 15 de março de 2019. A efervescência da instituição de ensino serve de pano de fundo para que a obra debata as relações dos adolescentes com o exercício da política e seus entendimentos sobre democracia e representatividade.

“Se acreditamos que a escola é o espaço para a formação das crianças e jovens para atuarem no mundo de cabeça erguida e dispostos a colaborar para uma sociedade criativa, inovadora, saudável e solidária, precisamos fortalecer esse ambiente e essas experiências de diálogo e questionamento. O filme é uma proposta que segue esta direção”, afirma Riff. 

Como surgiu a ideia do documentário?

Alice Riff: Nestes anos de turbulência política e crise democrática no país, notei dados que mostravam a desconexão do jovem com o tema. Alta porcentagem de adolescentes votando branco e nulo, não acreditando no voto como meio representativo, não vendo diferença entre esquerda e direita e associando política à corrupção de bate-pronto. Faz sentido, devido à sub-representação juvenil no congresso nacional e talvez reflita uma falta de aprendizado sobre o que é a democracia. É um sistema de representação que se aprimora e precisa de ajustes e que deve – ou deveria – acontecer em todas as instâncias, de conselhos de bairro ao país de forma macro. Assim, pensei que seria interessante, em ano eleitoral, acompanhar um processo de eleição de grêmio estudantil de uma escola, para ver como os jovens se organizariam ali.  Pelo ponto de vista deles, pensar em participação e política.

Documentário aposta no multiprotagonismo juvenil e na construção coletiva

 

Havia um roteiro prévio?

Riff: Havia uma pesquisa prévia, pessoas mapeadas e os marcos narrativos: debates, chapas passando em sala, coisas assim. Sabíamos também que as filmagens começariam no primeiro dia de aula e terminariam no resultado das eleições. Mas não sabíamos quais seriam as chapas ou o que iria acontecer. Preparamo-nos para seguir o caminho que os próprios estudantes nos levavam.

Quem são os protagonistas do debate político na escola?

Riff: Os alunos. É um filme de multiprotagonismo, no qual estamos justamente quebrando a ideia de protagonismo. Fala sobre construção coletiva, de pensamento coletivo e como as individualidades, em formação, convivem com o grupo e pensam o espaço comum e a educação recebida.

Quais reflexões o filme levanta?

Riff: Se acreditamos que a escola é o espaço para a formação das crianças e jovens para atuarem no mundo de cabeça erguida e dispostos a colaborar para uma sociedade criativa, inovadora, saudável e solidária, precisamos fortalecer esse ambiente e essas experiências de diálogo e questionamento. O filme é uma proposta que segue esta direção.

Quais os principais conflitos que o documentário apresenta em relação à eleição do grêmio e o que isso despertou nos adolescentes?

Riff: Os alunos disseram que depois da experiência do filme e do grêmio, a comunicação entre todos na escola melhorou. Por outro lado, a efervescência registrada não se manteve pelo resto do ano. Acredito que é preciso um trabalho constante de acordos, conversas e resolução de conflitos com a participação dos alunos para que os processos democráticos comecem a fazer parte da instituição de ensino. Isso melhora o clima escolar, dá sentido a esse espaço e traz motivação.

“Filme olha para a potência da juventude e quanto estamos desperdiçando essa geração”, diz a cineasta Alice Riff

 

Após a convivência com os estudantes, como você avalia o engajamento político deles?

Riff: Todos têm interesse por política. Mas há, por parte da mídia, um esvaziamento da discussão que reflete no pensamento dos jovens: político é tudo igual, corrupto, que não cumpre o que promete. Conclusões rasas do que é essa ciência. Por isso, a importância de mediadores para aprofundar o debate, oferecer mais informações e elementos à discussão. Por exemplo, por que se luta tanto pela manutenção da democracia mesmo sabendo que há falhas nesse modelo? É preciso, com calma e estudo, aprofundar as discussões. Isso faz os adolescentes se apropriarem com mais clareza do tema. Por fim, há também a micropolítica, da negociação. De tentar organizar um torneio de futebol na instituição de ensino. Como se faz isso? Quem pode ajudar? Porque a diretora está dificultando? Como negociar com ela? E os jovens fazem isso e testam seus limites o tempo todo. Tudo isso é aprendizagem e faz parte do processo de formação. Na escola, tudo deve ser transformar em um exercício pedagógico.

Por que esse documentário é importante no atual contexto?

Riff: Ele é um retrato de 2018, de alguma maneira. Olha para a potência da juventude e o quanto estamos desperdiçando uma geração ao cortar dela perspectivas de futuro: sem educação de qualidade, sem universidade, sem trabalho, com um desejo de extinção da produção cultural, com projetos que não respeitam as pessoas em suas identidades e na sua diversidade. O filme também dá vida à escola pública e propõe pensarmos nela como um desafio bom: não está 100%, mas o que se faz com o que não está bom é trabalhar para melhorar, e não sucateá-la, como desculpa para depois vender para grupos privados, com projetos de educação para formar operários. Ela está aí para formar cidadãos potentes, criativos e solidários. É isso o que precisamos.

Veja mais:
Por que é importante discutir política na escola?

Exemplo de gestão democrática, escola municipal de SP realiza assembleias com alunos
Programa NET Educação – Grêmio estudantil e a formação dos jovens
O que buscam os estudantes das ocupações de São Paulo?

Crédito das imagens: divulgação

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