Os aspectos sociais e comerciais relacionados à Páscoa fazem com que a data seja uma boa oportunidade para se trabalhar educação financeira com alunos de todas as etapas, conforme aponta a doutora em educação e integrante da Rede Brasileira Infância e Consumo (Rebrinc) Maria Belintane.
“É importante contextualizar com a turma o que a Páscoa representa em termos de valores para diferentes pessoas, como solidariedade e partilha, para depois pensar a comercialização. Isso faz com que a criança tenha condições de desenvolver tanto sua educação financeira quanto sua alfabetização midiática e postura consumidora”, explica.
Para a mestra em educação matemática e tecnológica Kariny Michelly Silva de Oliveira, a Páscoa permite trabalhar uma educação financeira crítica.
“A gente sabe que o dinheiro faz parte da educação financeira, mas quem usa esse dinheiro são pessoas. Assim, deve-se compreender a realidade de cada um no contexto da Páscoa, sabendo que os alunos terão experiências diferentes entre si”, ressalta.
Confira, a seguir, como trabalhar seis temas de educação financeira usando a Páscoa como gancho.
1) Consumo x consumismo
A quantidade de chocolate que as crianças recebem e compram pode ser usada para pontuar a diferença entre desejar algo (consumismo) e precisar daquilo (consumo). Nessa discussão, alguns assuntos podem ser levantados, como endividamento.
“O endividamento está intimamente relacionado com essa dinâmica do que é necessário e do que eu preciso. Eu preciso realmente comprar todos esses ovos e barras? O que eu quero fazer com a minha família na data? Tudo isso ajuda a utilizar de forma concreta o dinheiro”, diz Oliveira.
“Pensar em Páscoa é pensar em compartilhar e dividir, não necessariamente apenas chocolate. Assim, podemos pensar formas de comemorar a Páscoa de maneira criativa sem precisar gastar”, acrescenta Belintane.
“Espera-se que as crianças entendam a possibilidade de presentear pessoas queridas sem isso estar ligado, necessariamente, à compra ou ao tamanho do item, mas há presentes com significado”, completa.
Além disso, nos anos finais do ensino fundamental e no médio, Belintane sugere apresentar as consequências ambientais do consumo excessivo de chocolate, como o uso de agrotóxicos e do óleo de palma, relacionado ao desmatamento de florestas tropicais.
“A produção de um quilo de chocolate também utiliza aproximadamente 17 mil litros de água e há diversas embalagens envolvidas no processo. No campo da saúde pública, o consumo excessivo do doce por levar à obesidade”, reforça.
2) Planejamento de gastos
Os alunos podem ser estimulados a pensar no orçamento familiar e no quanto de dinheiro a família dispõe para comprar ovos de Páscoa. Para o ensino médio, Belintane sugere como atividade que os alunos planejem um almoço de Páscoa em família.
“O endividamento depende das escolhas. Se o sujeito tem possibilidade de comprar e quer fazê-lo, tudo bem. Caso contrário, essas escolhas podem influenciar a qualidade de vida dele a longo prazo”, alerta Oliveira.
3) Alternativas econômicas
Tema atrelado ao planejamento financeiro, pensar em alternativas ao ovo de Páscoa envolve ponderar não apenas questões financeiras, mas afetivas.
“Em vez de comprar os ovos, posso comprar os ingredientes para fazer em família, ou fazer chocolate em forminhas para distribuir aos amigos? Isso faz com que a educação financeira ultrapasse a questão monetária e tenha significado”, reforça Oliveira.
Pode-se ainda discutir a compra de ovos caseiros não industrializados, mas produzidos por artesões. “É uma forma de valorizar a cultura e o empreendedorismo local, conscientizando o estudante sobre o que está próximo e distante dele”, afirma Oliveira.
“Tal incentivo impacta todas da comunidade, fazendo o dinheiro circular”, acrescenta Belintane.
4) Influência da publicidade
Belintane sugere discutir com a turma como a mídia e a publicidade apresentam a Páscoa. Para isso, os alunos podem analisar em grupo peças publicitárias impressas, em vídeo e para redes sociais. “Deve-se questionar: essa necessidade de consumir especificamente um ovo de Páscoa é gerada pelo quê?”, indica.
Oliveira lembra que a influência da mídia oferece outro sentido ao simbolismo da Páscoa. “Apresenta-se a Páscoa de maneira mercadológica porque se espera que o público consuma mais para haver movimentação de dinheiro e lucro, pontos a serem discutidos com os alunos”, pondera.
5) Comparação de preços
Esse tópico ajuda o aluno a identificar o valor que é atribuído ao produto. “Pesquisar preços é um movimento crítico. Você questiona: qual é a marca desse chocolate? Será que o valor está condizente com o que realmente posso gastar? Será que é mais em conta eu comprar uma barra ou fazer um chocolate com a minha família? Você lista possibilidades e pensa nas suas consequências”, ensina Oliveira.
Belintane propõe como atividade que os alunos tragam folhetos de supermercados com os preços de diferentes ovos de chocolate e os comparem. “Também podem comparar a diferença de preço entre o chocolate em barra e em formato de ovo a partir da quantidade de gramas”, recomenda.
Ela também indica um jogo para anos iniciais. “Cada criança recebe um valor X para gasta e você disponibiliza ovos recortados do jornal com valores, além de outras possibilidades de chocolate. A criança irá refletir sobre o que é mais caro e mais barato”, sugere Belintane.
6) Cálculo de lucro e despesas
Os alunos podem simular o custo da produção de um ovo de Páscoa caseiro e definir um preço de venda adequado, atividade que pode ser relacionada aos conteúdos de frações, porcentagens e medidas proporcionais.
“O objetivo é pesquisar os preços dos ingredientes e incluir no valor do produto itens que ficam invisíveis, com o gasto de luz, de gás, de água e de mão de obra usados no processo”, indica Belintane.
“No campo do empreendedorismo, as crianças podem pensar em estratégias de marketing para conseguir vender o produto na comunidade”, acrescenta.
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