Algumas estratégias educacionais visam favorecer o aprendizado e a participação de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Checklist, organizadores gráficos, instrução explícita, instrução sistemática, constant time delay (CTD) e aprendizagem por pares podem ser aplicadas em aulas de diferentes disciplinas e etapas de ensino.
“Elas facilitam a aprendizagem de conteúdos que podem parecer abstratos e também contribuem para o desenvolvimento de habilidades sociais, da autonomia e do engajamento dos estudantes”, explica a licenciada em ciências biológicas Caroline Rosas.
A professora destaca que essas estratégias são intercambiáveis e podem ser utilizadas de forma combinada. No entanto, a escolha de qual aplicar exige uma avaliação diagnóstica do aluno, considerando suas características, necessidades e potencialidades.
“O que orientará a escolha são as particularidades de cada estudante: o que ele gosta ou não, seu perfil, nível de interação com a turma e outras experiências escolares”, complementa o doutor em ciências e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Manuel Gustavo Leitão Ribeiro.
Antes de definir a melhor estratégia educacional para o aluno com TEA, também é fundamental considerar o objetivo da aula e o que se pretende desenvolver com a atividade.
“Por exemplo, queremos ensinar um conteúdo curricular específico ou o foco é trabalhar a autonomia desses estudantes antes disso?”, contextualiza o mestre em neurociências Lucas Tadeu Andrade Almeida.
“Como benefício, essas estratégias contribuem não apenas para a inclusão e a aprendizagem de alunos com TEA, mas também enriquecem o processo educativo dos estudantes neurotípicos”, acrescenta Ribeiro.
Acompanhamento e avaliação
Ribeiro reforça que é essencial acompanhar de perto o estudante com TEA durante a implementação de qualquer estratégia, mesmo em aulas tradicionais. “O professor precisa ter preparo e sensibilidade para perceber qualquer mudança no comportamento do estudante e intervir caso a atividade proposta não esteja adequada. Observe como ele reage, quando pode se desregular ou demonstrar desconforto”, orienta.
“Por fim, é preciso verificar se a estratégia foi eficaz: se houve aprendizagem, consolidação dos conteúdos e avanços na interação social do estudante”, adiciona.
Ribeiro, Rosas e Almeida são autores do artigo “Práticas pedagógicas em ciências e biologia para estudantes com transtorno do espectro autista: ferramentas para a educação inclusiva” (2024). A seguir, eles apresentam seis estratégias educacionais que podem ser utilizadas com alunos autistas em diferentes disciplinas e momentos da educação básica:
1) Checklist
Como o nome sugere, trata-se de uma lista de verificação com etapas, ou o passo a passo de uma atividade, tarefa ou rotina.
“É um recurso visual, que pode ser escrito ou criado com imagens. Ele ajuda o aluno a compreender a sequência necessária para realizar algo e reduz a ansiedade de quem está dentro do espectro, gerada por mudanças na rotina”, explica Rosas.
O checklist deve ser adaptado ao nível de compreensão do aluno. “Se ele ainda não lê ou tem aversão à escrita, opte apenas por imagens”, orienta a docente.
“O checklist também pode ser adaptado com recursos táteis ou feito de forma oral para crianças com deficiência visual que tenham TEA”, complementa Ribeiro.
2) Organizadores gráficos
Segundo Rosas, qualquer material visual que represente de forma concreta ideias e conteúdos — como esquemas, mapas conceituais, slides, diagramas, maquetes — pode ser considerado um organizador gráfico.
“É algo que ajuda na organização de conceitos e pode ser usado tanto no primeiro contato do estudante com aquele conteúdo quanto em revisões”, diz.
Eles devem ser adaptados aos gostos e sensibilidades dos alunos. “Se o estudante tem sensibilidade tátil e gosta de manusear objetos, pode-se adicionar texturas. O oposto também é válido”, orienta.
É possível retirar elementos distratores e incluir imagens que agradem o aluno para gerar engajamento. A pesquisadora em educação especial do College of Education (Estados Unidos) Bethany R. McKissick, por exemplo, relatou em artigo que incluiu nos slides imagens de contextos familiares e personagens favoritos de alunos com TEA ao ensinar sobre amebas em aulas de biologia.
“Os organizadores gráficos são úteis porque concretizam conteúdos abstratos e facilitam a aprendizagem de todos os estudantes, não apenas dos autistas”, reforça Ribeiro.
“Há relatos de professores de química que, ao ensinarem teoria atômica, que é um conteúdo bastante abstrato, constroem modelos com os quais os alunos podem interagir. Esse tipo de material facilita o processo de ensino e aprendizagem”, ressalta Almeida.
3) Instrução explícita
Como pessoas com TEA podem ter dificuldades com abstrações, essa estratégia propõe o uso de instruções claras, objetivas e diretas.
“Professores costumam usar metáforas com alunos neurotípicos, o que pode não funcionar com estudantes autistas”, explica Almeida.
“Em vez de dizer ‘vamos limpar a sala’, o ideal é dizer ‘vamos guardar os brinquedos na caixa azul’”, exemplifica Rosas.
Também é possível usar exemplos e não exemplos. “Como mostrar o que são e o que não são mitocôndrias em uma aula de ciências”, destaca Rosas.
Já a professora da Universidade de Columbia (Estados Unidos) Victoria Knight trabalhou o conceito de seco e molhado apresentando objetos que tinham as duas características. Ela destacava ‘isto é seco’ e ‘isto não é seco’, pedindo ainda para os alunos repetirem antes de tentarem sozinhos.
Pode-se ainda usar perguntas como “por quê?” e “como você sabe?” para estimular a reflexão.
4) Instrução sistemática
Semelhante à instrução explícita, essa abordagem organiza as atividades em etapas simples e progressivas.
“O professor divide a tarefa em pequenas etapas e só avança para a próxima quando o aluno dominar a anterior. Isso respeita o ritmo, a autonomia e o progresso do estudante, sem pular fases”, resume Rosas.
5) Constant Time Delay (CTD)
Indicada para o ensino de imagens, vocabulário, definições e conceitos, essa estratégia consiste em apresentar um estímulo — como uma pergunta ou instrução — e, após um breve intervalo, oferecer a ajuda necessária ou aguardar a resposta do aluno. Com o passar do tempo, o estudante ganha a autonomia a passa a depender menos de auxílio.
“Esse tempo de resposta permite ao aluno pensar e depois se expressar. Ele varia de estudante para estudante, por isso a estratégia deve ser realizada sem pressão e construindo o conhecimento degrau por degrau”, informa Rosas.
6) Intervenção mediada por pares
Também conhecida como aprendizagem entre pares (peer instruction, em inglês) consiste em convidar um aluno neurotípico para auxiliar um colega com TEA.
“Além de apoiar a aprendizagem, essa estratégia favorece o desenvolvimento de habilidades sociais importantes para o estudante com autismo”, aponta Rosas.
Alguns cuidados são essenciais: os pares devem ter a mesma faixa etária, o aluno tutor deve ter boa desenvoltura social e o revezamento entre os ajudantes é recomendado para evitar sobrecarga.
No ensino médio, a técnica pode ajudar a reduzir a ansiedade diante de discussões e apresentações. “É preciso treinar os pares para que compreendam as limitações e especificidades do colega”, reforça Rosas.
Almeida ressalta que colegas de turma podem perceber detalhes importantes. “Certa vez, fui dar aula para uma turma de sexto ano e levei slides. Um aluno avisou que o colega com TEA poderia ter medo de imagens projetadas e eu mudei a prática. Ou seja, há características que podem passar despercebidas pelos professores, mas que são notadas pelos colegas que convivem com o aluno diariamente”, relata.
Veja mais:
10 dicas para a alfabetização de alunos autistas
8 estratégias para ensinar matemática a alunos autistas
8 dicas para a inclusão de alunos autistas
6 livros para auxiliar na aprendizagem de alunos autistas
Crédito da imagem: aquaArts studio – Getty Images