Os dados presentes na pesquisa TIC Educação 2019, apresentados nesta terça-feira (9/6), revelam que os alunos da rede pública não contam com condições adequadas para o ensino remoto. Além da falta de conectividade e de dispositivos para acesso à internet, o documento apontou carência de habilidades fundamentais para a aprendizagem realizada fora da escola. O levantamento é divulgado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), por meio do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br).
Sobre a falta de dispositivos, apesar de 98% dos alunos das escolas urbanas (públicas e privadas) responderem que usam o smartphone para acessar a internet, um dado que chama atenção é que, desse total, o aparelho aparece como forma exclusiva de acesso para 18% deles – estudantes que não têm como recorrer a um computador, notebook ou tablet, por exemplo.
O acesso exclusivo pelo celular foi maior entre os alunos que residem nas regiões Norte (25%) e Nordeste (26%) e entre os estudantes de escolas públicas urbanas (21%).
“O uso do celular não é garantia de acesso ao ensino remoto. Seria esse aparelho compartilhado com os moradores da casa? Ele permite armazenar conteúdos?”, questiona a coordenadora do estudo, Daniela Costa. “Há desigualdades multifatoriais que impedem que os alunos tenham as mesmas oportunidades de acesso e utilização das tecnologias na aprendizagem”, acrescenta ela.
Para o gerente do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), Alexandre Barbosa, é difícil para o professor pensar em atividades voltadas apenas para esse equipamento. “O uso da internet exclusivamente pelo celular impede o desenvolvimento de habilidades globais relacionadas à tecnologia”, complementa.
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Além do celular, 29% dos alunos de escolas urbanas (públicas e privadas) contam com um tablet em casa, 35% com um computador de mesa e 41% com um computador portátil. “A presença dos dois últimos têm caído na série histórica”, lembra Costa.
Já quando o recorte são apenas os estudantes das escolas públicas urbanas, 39% deles não possuem nenhum destes em casa, o que inviabilizaria o acompanhamento de atividades pedagógicas online.
Ambiente virtual estruturado
A pesquisa considerou como usuário de internet o aluno que havia acessado a rede pelo menos três meses antes da realização do levantamento. A maioria dos estudantes de escolas urbanas se enquadrou na categoria (83%). Os resultados por região do país são: 88%, no Sudeste; 87%, no Sul; 86%, no Centro-Oeste; 73%, no Norte; e 78% no Nordeste.
“As políticas públicas, até então focadas na conectividade da escola, também deveriam pensar como melhorar a conectividade desses estudantes em casa, para garantir que tenham acesso à educação”, defende Barbosa.
Outro dado considerado relevante pela pesquisa é que 14% das escolas públicas urbanas e 64% das particulares urbanas contavam com um ambiente ou plataforma de aprendizagem a distância. Em 2018, esse dado era de 17% e 47%, respectivamente.
“Espaço virtual estruturado é aquele que possibilita o desenvolvimento de atividades pedagógicas que ultrapassem os ambientes da escola. Talvez as escolas que já usavam a ferramenta tenham se adaptado melhor ao ensino remoto”, opina Costa.
Aprendizagem autônoma
Capacidade de organizar os estudos, de autonomia para pesquisar outras fontes de informação e de gerir o seu próprio aprendizado são apontados por Costa como fundamentais para experiências pedagógicas fora da escola.
“Apesar da ideia de que, pelas crianças e jovens serem usuários de internet, seria mais fácil para eles esse uso no campo escolar, o que vemos é que o próprio aluno vive a necessidade de se reinventar em relação a esse aprendizado remoto”, acrescenta.
Enquanto 94% dos estudantes da área urbana (escolas públicas e privadas) garantiam assistir vídeos, apenas 45% postaram algum texto, foto ou outro material considerado autoral na rede.
“Somente 48% dos alunos conectados do 5º ano do ensino fundamental leram um livro, um resumo online ou um e-book. Para completar, 40% usaram mapas online e 63% compartilharam, na internet, um texto, imagem ou vídeo”, diz.
As porcentagens são maiores entre os alunos do 2º ano do ensino médio: 65%, 74% e 82%, respectivamente. “Os mais velhos se saem melhor em relação ao ensino fundamental”, pondera Costa.
A pesquisa ainda lembra que 24% dos alunos do 2º ano do ensino médio afirmaram ter utilizado a rede para fazer provas e simulados e 16% para participar de cursos a distância.
O levantamento também aponta um alto percentual de alunos de escolas urbanas (públicas e privadas) que utilizam as redes sociais para a realização de trabalhos escolares: em 2019, 81% usaram este recurso, sendo que 61% disseram ter utilizado o aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp.
A TIC Educação 2019 foi realizada entre os meses de agosto e dezembro do ano passado. Em escolas urbanas, foram entrevistados presencialmente 11.361 alunos de 5º e 9º anos do ensino fundamental e 2º ano do ensino médio; 1.868 professores de língua portuguesa, de matemática e que lecionam múltiplas disciplinas (anos iniciais do fundamental); 954 coordenadores pedagógicos e 1.012 diretores. Em escolas localizadas em áreas rurais, foram entrevistados 1.403 diretores ou responsáveis pela escola.
Crédito da imagem: reprodução Lançamento Pesquisa TIC Educação 2019