O acesso a textos literários indígenas pelos estudantes intensificou-se após a aprovação da lei nº 11.645/2008, que tornou obrigatório o estudo da história e cultura indígena e afro-brasileira nas escolas. Pedagogicamente, muitos são os ganhos para os alunos quando eles entram em contato com a literatura indígena.
“Diversos textos de não-indígenas trazem a representação desses povos tradicionais carregada de preconceitos, de acordo com o contexto e visão etnocêntrica de quem os escreveu”, explica a mestra em Letras pela Universidade Federal do Tocantins (UFT) Maria Célia Gomes de Souza. “Já a produção literária indígena possibilita pensar sobre temas como identidade, memória, ancestralidade, humanidade, respeito à natureza e reconhecimento da importância dos povos indígenas para a construção da história do Brasil”, lista a pesquisadora, que é autora da dissertação “A (in)visibilidade da literatura indígena em materiais didáticos” (2022).
“Para completar, a literatura indígena também transporta conhecimentos ancestrais, desabafos, denúncias e anseios de um futuro justo. Isso num contexto em que grande parte da sociedade brasileira foi educada para não gostar dos povos indígenas e muitos preconceitos ficaram arraigados no imaginário nacional”, pontua.
Souza explica que, apesar de alguns estudiosos ainda classificarem a literatura indígena como infantil, esses textos são indicados para todas as faixas etárias. Já sobre atividades, ela recomenda trabalhar rodas de leitura e conversar sobre os conhecimentos prévios da turma sobre indígenas. “Também aplico atividades escritas de interpretação textual utilizando pequenas narrativas indígenas”, compartilha.

“As poesias de Graça Graúna, Márcia Kambeba, Eliane Potiguara e Ellen Lima são textos instigadores que dialogam com produções não indígenas relacionadas à história do Brasil, portanto, excelentes para serem aplicados em sala de aula”, ressalta. Além dos textos, ela recomenda aos alunos e professores acompanharem blogs e entrevistas de autores como Graça Graúna, Márcia Kambeba, Eliane Potiguara, Daniel Munduruku, Ailton Krenak, Kaká Werá Jekupé, Olivio Jekupé e Ely Macuxi.

A seguir, conheça as obras de 8 autores indígenas que podem ser apresentadas aos alunos da educação básica. Livros não apenas de prosa, mas também de poesia, cordel e quadrinhos, que ajudam a ilustrar a diversidade de gênero presente na literatura indígena.
Coração na aldeia, pés no mundo
Auritha Tabajara, U’ka Editorial, 2018
Em forma de cordel, a autora narra a história de uma menina que sai da sua aldeia para conhecer o mundo, apresentando discussões sobre como a identidade de mulher indígena é vista pela sociedade.
História de índio
Daniel Munduruku, Companhia das Letras, 1996
A primeira parte do livro traz um conto da cultura munduruku. “O menino que não sabia sonhar” fala de Kaxi, um garoto escolhido para ser o sucessor do pajé. Na sequência, o autor relata suas experiências no “mundo dos brancos” de forma bem humorada, assim como comenta a situação dos povos indígenas no Brasil.
O saci verdadeiro
Olívio Jekupé, Panda Books, 2021
Esta história em quadrinho narra a importância do registro da memória indígena ao contar a história de Karaí, que apreende por meio de sua mãe as diversas histórias de seu povo. A preferida dele é a de Jaxy Jaterê, o protetor das florestas e das pessoas. Porém, quando o curumim começa a frequentar a escola, descobre que os não-índios chamam o mesmo personagem por outro nome: Saci-Pererê.
O pássaro encantado
Eliane Potiguara, Jujuba Editora, 2014
As crianças se assustam com o canto de um pássaro, que descobrem por meio da avó, tratar-se de uma ave que anuncia o florescer de novos tempos. Por meio dessa narrativa, a escritora fala da importância dos avós no cuidado nas novas gerações, assim como o papel do luto, da memória e da transmissão de costumes e tradições.
Flor da mata
Graça Grauna, Peninha Edições, 2014
Indígena potiguara, Graça Graúna apresenta nesse livro de poesia a transitoriedade de sentimentos por meio de cores, sons e situações cotidianas. “Minha intuição diz que a flor sugere ao mesmo tempo a leveza e a força que vem da Mãe-Terra; leveza e força que o “hajin” (fazedor de haicai) também necessita para o haicai acontecer”, diz na sinopse.
As fabulosas fábulas de Iauaretê
Kaká Werá Jekupé, Editora Peirópolis, 2007.
A obra narra uma das mais divertidas lendas do ideário Guarani: as aventuras da onça Iauaretê, que virou gente, e de seus filhos, Juruá e Iauaretê-mirim. Acompanhadas por desenhos de Sawara, filha de 11 anos do autor, as fábulas falam de medo, coragem, dúvida, amor, morte, paz, oportunidade, erros e acertos.
Kumiça Jenó: Narrativas Poéticas dos Seres da Floresta
Márcia Kambeba, Underline Publishing, 2021
O livro apresenta 25 poemas narrativos sobre figuras folclorizadas presentes em diversas culturas, principalmente as amazônicas. Ao resgatar a tradição oral de diferentes povos, a autora transmite sua ancestralidade e destaca a relação entre a floresta, seus seres e seus povos.
Ipaty, o curumim da selva
Ely Macuxi, Editora Paulinas, 2011
As aventuras do curumim Ipaty são entrelaçadas com lendas, mitos, tradições e costumes dos Macuxi, indígenas que habitam as serras do estado de Roraima, próximo à fronteira do Brasil e Venezuela. Obra indicada para 3º e 4º anos do ensino fundamental.
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Atualizado em 06/01/2023, às 11h48