Filmes e séries são uma importante forma de conscientização sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA).
“Eles criam modelos sociais que ajudam na aceitação e compreensão do transtorno e na redução de preconceito e capacitismo. Além disso, estimulam as pessoas a refletir se elas mesmas, ou amigos e familiares, seriam autistas”, aponta a psiquiatra especializada em autismo adulto Ana Aguiar.
Para a doutoranda em psicologia escolar e desenvolvimento humano Anna Pandjarjian Mekhitarian, filmes e séries tornam acessíveis ao grande público conhecimentos que antes eram restritos aos profissionais da área, conscientizando sobre saúde mental. “Hoje, há produções que abordam diferentes níveis dentro do TEA e as abordagens terapêuticas disponíveis”, analisa
“O expectador não terá uma aula formal. Mas, em um momento de lazer, pode se divertir e ainda aprender sobre o assunto”, completa o doutor em psicologia do desenvolvimento e professor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Carlo Schmidt.
Mudança na representação do autista
Shmidt explica que a indústria cinematográfica acompanhou a sociedade em termos de conhecimento sobre o assunto. “Os primeiros filmes tinham um certo estereótipo, mas era porque faltava conhecimento, inclusive acadêmico, sobre o autismo. Hoje, há mais filmes que mostram diversas facetas de quem está dentro do espectro: potencialidades, dificuldades, diagnóstico, afetividade, entre outras questões”, analisa.
A opinião é semelhante à de Aguiar. “Houve dois momentos históricos, que o cinema acompanhou. O primeiro, em que existia um modelo de ser autista: meninos, com certo grau de deficiência intelectual e que essa criança demandaria atenção especial e teria dificuldades com a afetividade. Quando começamos a falar que não existia um único autista, mas um espectro, tudo mudou e isso se refletiu no cinema”, afirma.
Aguiar enxerga melhoras na representatividade do autismo no cinema, porém, também aponta lacunas
“Se pensarmos em representatividade ao mostrar o autismo houve ganhos. Mas ainda não mostramos o que é ser realmente uma mulher autista, o dia a dia de um autista, a procura de emprego, a dificuldade em exercer sua profissão, a perda de laços familiares, entre outros temas. Temos um longo caminho no audiovisual”, pondera Aguiar.
Conheça, a seguir, 11 filmes e séries que ajudam a expandir conhecimentos sobre o autismo.
Temple Grandin (2010)
Filme baseado na biografia de Temple Grandin, autista que se tornou uma renomada cientista da área de manejo de animais. “Ela trouxe para as massas novos conhecimentos sobre autismo, explicando por que as pessoas têm estereotipagens como se balançar quando se sentem excitadas por alguma questão”, conta Schmidt.
“O filme também traz questões históricas sobre o diagnóstico, quando as mães eram responsabilizadas por médicos pelo autismo de seus filhos, e a dificuldade de continuar na escola” , afirma Schmidt.
Mary e Max: uma amizade diferente (2009)
A animação apresenta a amizade inesperada que nasce entre uma menina australiana de oito anos e um homem de 44 anos, que começam a trocar cartas. “Mostra como uma pessoa com autismo pode criar laços de amizade e se relacionar”, destaca Schmidt.
Rain man (1988)
Charlie descobre que tem um irmão com autismo, após o falecimento do pai. Ele o sequestra de uma instituição e o leva a Los Angeles. O filme foi inspirado na história de Kim Peek, que memorizou 12 mil livros.
“Há filmes que se centram nas habilidades das pessoas com autismo. No caso, Kim tinha uma habilidade de memória notável, porém, não conseguia tomar banho sozinho ou contar dinheiro”, lembra Schmidt.
“Assim, muitas vezes entendemos de uma forma distorcida que o autismo pode ser uma grande habilidade quando, apesar da inteligência superior, há uma dificuldade social que pode perpassar a vida toda”, enfatiza Schmidt.
Good doctor (2017)
A série conta a história de Shaun Murphy, um jovem médico com autismo que trabalha em um hospital prestigiado.
“Mostra as habilidades e limitações, concomitantemente, de uma pessoa com autismo. Há as dificuldades que o autismo provoca nas relações sociais durante o exercício da profissão de médico, mas mostra socialmente o valor que ele tem por simplesmente ter uma mente diferente da nossa, que é brilhante sob determinados aspectos”, analisa o psicólogo.
Gilbert Grape – Aprendiz de sonhador (1993)
Um jovem, responsável por sustentar a família desde a morte do pai, cuida de sua mãe, que sofre de obesidade mórbida e depressão, e de seu irmão mais novo, que está dentro do TEA.
O farol das orcas (2016)
Filme baseado na história de um biólogo especializado em orcas que decide levar à Patagônia uma mãe com seu filho autista, que possui uma conexão especial com animais. “Filme envolvente e bastante enriquecedor para quem quer conhecer mais sobre os casos de autismo severo”, recomenda Mekhitarian.
Vida, animada (2016)
Owen Suskind é um jovem adulto com autismo que não falava. No entanto, ele descobre uma forma especial de vencer essa barreira ao usar filmes infantis da Disney como meio de comunicação com sua família.
Forrest Gump – O contador de histórias (1994)
A história de 40 anos dos Estados Unidos é contada através da perspectiva de um homem com QI abaixo da média e coração puro. Por uma série de coincidências, ele se envolve em eventos históricos marcantes, como a Guerra do Vietnã e o escândalo de Watergate.
“É um filme polêmico porque, à primeira vista, o personagem parece ter deficiência intelectual e não é falado que ele é autista. Porém, se prestarmos atenção na reação dele aos acontecimentos e como ele se relaciona, há essa possibilidade de autismo, que é bastante discutida hoje na comunidade de quem vive no espectro”, aponta Aguiar.
Atypical (2017)
A série Atypical narra um jovem autista de 18 anos que busca sua independência. “Podemos perceber os impactos do autismo na família do protagonista Sam. A trajetória do rapaz é marcada por muitos percalços, mas também realizações, que nos mostram que há muitas possibilidades mesmo diante das limitações do transtorno”, afirma Mekhitarian.
Em um mundo interior (2017)
O documentário retrata a vida de famílias de diferentes classes sociais e regiões, cujos filhos são neurodivergentes.
“Ajuda a sensibilizar o olhar e escuta para as pessoas com autismo e suas famílias. Apresenta o percurso de cuidado com os seus filhos autistas, e são entrevistados profissionais muito competentes de diferentes linhas teóricas”, diz Mekhitarian.
Amor dentro do espectro (2020)
A série documental mostram jovens com autismo que buscam um amor e precisam lidar com situações de encontros e relacionamentos. “Mostra que a pessoa autista tem desejo de ter uma pessoa, constituir família, apenas tem uma forma diferente de se aproximar e de se comunicar”, aponta a psiquiatra.
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Crédito da imagem: andreswd – Getty Images