Antes da exibição, alguns filmes e séries apresentam mensagens de advertência sobre determinados conteúdos. Esses alertas das produtoras têm o objetivo de preparar os espectadores para possíveis cenas sensíveis ou contextualizar produções do passado à luz do presente. Situações antes não percebidas como misóginas ou racistas podem ser interpretadas de forma diferente atualmente.
“Esses avisos são uma forma de comunicação entre produtor e espectador. Podem servir como uma legenda, um pedido de desculpas ou uma forma de o produtor se eximir de alguma responsabilidade”, analisa a doutora em ciências da comunicação e uma das coordenadoras do Grupo de Estudos de Análise de Produtos Audiovisuais (Grupa-Unip) Clarice Greco.
Os tipos de alerta que podem aparecer antes de filmes e séries se enquadram nos seguintes tópicos:
- Classificação indicativa;
- Gatilhos emocionais;
- Violência física, sexual ou emocional;
- Suicídio ou automutilação;
- Racismo, xenofobia ou discriminação.
- Alerta sobre cenas com luzes intermitentes ou piscando, que podem desencadear crises em pessoas com epilepsia;
- Avisos culturais e contextuais. Estes informam quando um filme contém estereótipos, linguagem ou comportamentos que podem ser considerados ofensivos em contextos modernos, mas que refletem a época ou cultura em que foram produzidos.
- Terror, sangue (gore), sustos repentinos (jump scares) etc.
Funções dos alertas
Greco explica que alertas de gatilho podem ser importantes para pessoas que possuem questões de saúde mental ou que passaram por situações traumáticas, como violências físicas e sexuais.
“No caso de cenas de suicídio e violência contra mulher, também podem ajudar o espectador a identificar o problema. Alguns avisos fornecem números de telefone a serem contatados caso se conheça alguém que esteja passando por problemas de saúde mental ou para denunciar uma situação de violência de gênero”, destaca Greco.
Os alertas de gatilhos também influenciam na experiência de assistir a um filme ou série.
Um estudo de 2018, da doutora em psicologia pela Universidade de Michigan Izzy Gainsburg, revelou que participantes da pesquisa que assistiram a vídeos com algum tipo de aviso sobre gatilhos emocionais apresentaram menos reações negativas.
Visão de uma época
Desde 2020, a plataforma de vídeos da Disney passou a sinalizar conteúdos racistas em animações como ‘Dumbo’, ‘Peter Pan’ e ‘Mogli: o menino lobo’.
“Essa é uma forma de os produtores avisarem que optaram por não alterar as obras, embora não compactuem com questões racistas ou com a estereotipagem de uma determinada cultura”, comenta Greco.
“Não existe uma legislação que os obrigue a publicar o aviso. É uma questão ética, mas que é motivada por pressão social”, descreve a pesquisadora.
Ainda segundo Greco, a discussão sobre não cortar uma cena de racismo em produções antigas, mas contextualizá-la ao novo público, perpassa por um dilema antigo de arte versus ética.
“De um lado, temos a conservação da memória desses produtos culturais e da indústria cultural que representam um período. Por outro lado, existe uma questão de época, com a arte reconhecendo situações que nunca deveriam ter sido toleradas e que hoje são abertamente classificadas como ofensivas”, pondera.
Além disso, para Greco, a presença de tais cenas pode ajudar a discutir a qualidade de uma obra.
“Uma obra cult ou clássica atravessa tempos. Assim, um filme antigo que ainda hoje é bom, gostoso de assistir, com um recado importante e que cabe na sociedade atual tem uma espécie de selo de qualidade”, explica Greco.
“Em contrapartida, a obra que hoje serviu, mas daqui a dez anos precisará ser adaptada, pode ter sua qualidade artística questionada”, conclui.
Veja mais:
Confira 7 filmes nacionais para entender e discutir racismo
Conheça 3 filmes para debater intolerância religiosa
Veja 11 filmes e séries que ajudam a conscientizar sobre autismo
Crédito da imagem: Edwin Tan – Getty Images