A poluição sonora pode ser definida quando um som se torna desagradável ou pode prejudicar a saúde humana.
“Ela é tida como um problema ambiental e de saúde pública pelas resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA 001 e 002/90). Está cada vez mais presente em nosso cotidiano e pode nos afetar psicologicamente e fisiologicamente”, explica a professora do mestrado profissional no ensino de física da Universidade Federal de Itajubá (Unifei), em Minas Gerais, Maria Luzia Grillo Netto.
No ensino médio, o tema pode ser abordado de forma interdisciplinar. Em física, dialoga com o conteúdo de onda, que é qualquer sinal que se propaga de um ponto ao outro em determinado meio.
“As ondas sonoras estão no cotidiano por meio de objetos que produzem sons, que podem ser produzidos por meio de choques entre dois corpos ou por instrumentos musicais”, descreve o doutorando no programa de pós-graduação em ensino de ciências e matemática da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Márcio Donizeti Pereira.
“Por ser uma onda mecânica, ela necessita de um suporte material para a sua propagação, logo, não ocorre no vácuo”, complementa.
Já em biologia, é possível destacar a fisiologia e funcionamento do ouvido humano. “É importante mostrar o funcionamento deste tubo auditivo, que é preenchido com um líquido cuja onda fará vibrar”, acrescenta Pereira.
Para completar, a educação ambiental pode lembrar que a poluição sonora impacta negativamente as aves e a saúde humana. Além de lesões no aparelho auditivo, ansiedade e depressão, ela pode elevar níveis de hormônios de estresse e, com isso, prejudicar a saúde cardiovascular.
Uma boa notícia é que o tema da poluição sonora tem potencial de proporcionar uma aprendizagem significativa na educação básica por dialogar com uma situação comum entre adolescentes: a audição de música com fones de ouvido em volume alto.
“Estudantes estão acostumados a chamar de barulho os sons da rua, que são desagradáveis do ponto de vista estético, mas não aquela música do seu gosto pessoal quando em volume alto. A cultura faz com que esse hábito não seja encarado como um problema de saúde”, enfatiza o professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) Cristiano Mattos, um dos autores do artigo “Física para uma saúde auditiva” (2011).
A seguir confira ideias que podem ajudar a compor uma sequência didática para o ensino de poluição sonora pelo olhar da física em diálogo com outras áreas do conhecimento.
Pré-teste
No artigo “A poluição sonora e o ensino de física, de Maria Lúcia Grillo Netto –revista Ensino de Física” (2021), Netto e o mestre em ensino de física Felipe da Silva Freitas iniciaram sua sequência didática com um questionário para avaliar o conhecimento prévio dos alunos sobre poluição sonora e uso de fones de ouvido.
As perguntas incluíram:
- Quais os principais tipos de poluição?
- O que é poluição sonora?
- O que são ruídos?
- Existem limites de ruídos tolerados?
- Como é feita a medida de um ruído?
- Cite exemplos de fontes de poluição sonora.
- O que é o sonômetro?
- Existe fiscalização sobre sons intensos?
- Caso afirmativo, como é realizada?
- Que fatores contribuem para uma significativa perda auditiva?
- O uso contínuo de fones de ouvido no volume máximo pode contribuir para perda de audição?
- Como prevenir a perda auditiva?
- Além da perda auditiva, a poluição sonora pode gerar mais algum problema de saúde?
Aplicativo Phet Simulation
Como introdução ao tema das ondas sonoras, Netto e Freitas utilizaram vídeos com experimentos sobre a física. Em seguida, eles usaram simulações com o aplicativo Phet simulation para apresentar ondas na corda, interferência de ondas e som.
“O intuito das simulações foi apresentar as características físicas do som. Por meio delas, foi possível discutir os conceitos de amplitude e frequência sonora, além de ser possível verificar como a propagação de uma onda depende de outros fatores como tensão e amortecimento na corda”, lembra.
“É importante mostrar a diferença de comportamento da onda de um ruído incômodo, que não segue uma sequência física, daquele que tem comportamento harmônico”, acrescenta Pereira.
Uso do sonômetro
No e-book gratuito “Sequência didática: Estudo da poluição sonora por estudantes do ensino médio usando smartphone” (2018), Pereira relata o uso do aplicativo Sound Meter como sonômetro para apresentar a variação da pressão sonora de determinados barulhos.
“Os alunos realizaram as medidas na primeira, segunda e terceira aulas, na hora do intervalo, e na quarta e quinta aulas”, conta.
“Ao final, cada estudante deveria escolher sete colegas de sua turma que realizaram as medidas e anotar o valor que cada um deles encontrou para cada um dos itens, e calcular a média dos valores encontrados usando uma calculadora”, conta.
Freitas e Netto utilizaram o aplicativo de smartphone decibelímetro para os alunos. Eles deveriam medir o nível de intensidade sonora dos seus fones de ouvido.
“A medição foi realizada de forma gradativa, ou seja, a partir do volume mínimo até chegar ao máximo, para perceberem que o volume ideal para ouvir suas músicas não é o máximo que o fone pode fornecer”, destaca Freitas.
“Foram também informados de que o nome “decibelímetro” não é apropriado para o aparelho, uma vez que o decibel (dB) não é uma medida sonora, trata-se de uma relação logarítmica, que pode ser usada por outras grandezas”, lembra Netto.
Experimento sobre propagação do som
Pereira relata na página 26 do e-book um experimento para demonstrar que o som se propaga por meio de vibrações.Para isso, foram utilizados um pedaço de tubo de PVC, uma ponteira laser, uma bexiga e um pequeno espelho. A bexiga foi utilizada como uma película e colocada esticada em uma das extremidades do tubo. O espelho foi colado no centro da bexiga. Já a ponteira laser ficou apontada para o espelho.
“O experimento objetiva a observação de que, ao falar algo dentro do cano de PVC, a bexiga e o espelho vibram e consequentemente o feixe do laser seria refletido em direções distintas, formando um ‘desenho’ na parede onde é projetado. Essa vibração se deve à vibração do ar que está dentro do cano”, relata o docente.
Segundo ele, o experimento faz uma analogia ao funcionamento do ouvido humano. “A bexiga estaria se comportando como o tímpano de uma pessoa”, pontua.
Vídeos ilustrativos
Freitas e Netto trouxeram para a turma vídeos com situações de poluição sonora, incluindo como era o trânsito em uma grande cidade, os barulhos de São Paulo (SP), uma britadeira funcionando de madrugada e a ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), todos disponíveis na internet.
“Os vídeos mostram situações envolvendo ruídos de trânsito, instrumento de perfuração de solo e sirenes de ambulância. Assim, ilustram que estamos expostos à poluição sonora, assim como suas consequências a curto, médio e longo prazo”, justifica Netto.
Por sua vez, Pereira utilizou vídeos que mostram o funcionamento do ouvido humano.
Sociologia em pauta
Mattos lembra que falar de hábitos culturais é um prato cheio para trabalhar questões sociológicas com os alunos também.
“No caso dos fones de ouvido, pessoas com condições econômicas poderão adquirir aparelhos de melhor qualidade e com abafamento de ruídos. Classes mais pobres usarão fones mais baratos e com distorção de sons, com agudos mais intensos”, exemplifica.
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