A Lei do Plano Nacional de Educação (N° 13.005/2014) determina diretrizes, metas e estratégias para a política educacional no período de 2014 a 2024. Para marcar os primeiros cinco anos de PNE, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação lançou um documento sobre o status do Plano em 2019, com o balanço das suas 20 metas e estratégias. Em metade da sua vigência, somente quatro das 20 metas foram parcialmente cumpridas pelos governos federal, estaduais e municipais. As demais ainda estão longe de serem alcançadas.
“Um dos motivos do atraso é que o PNE possui uma agenda progressiva de cumprimento de suas metas. Algumas previstas até 2018 eram estruturantes ou tratavam do Sistema Nacional de Educação, com governo e entes federados colaborando em termos de financiamento. Os prazos descumpridos impactaram o andamento das demais, nos anos seguintes”, contextualiza a coordenadora executiva da Campanha, Andressa Pellanda.
“O resultado é a dificuldade de inclusão de 2,8 milhões de jovens que ainda estão fora da escola e a qualidade de ensino daqueles que se encontram em formação”, pontua.
De acordo com a especialista, a meta 20, que versa sobre ampliar o investimento em educação pública para atingir o patamar de 7% do Produto Interno Bruto (PIB), e que prevê a implantação do Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi) e o Custo Aluno-Qualidade (CAQ), deveria ser priorizada para o avanço do plano nos seus últimos cinco anos. Esses dois últimos mecanismos de financiamento estipulam o valor mínimo que o Estado precisa investir em cada estudante da rede pública para garantir uma educação de qualidade.
“A meta 20 regularia todos os padrões de qualidade e ajudaria outras estruturantes, como a quatro, que aborda a educação especial. A falta de infraestrutura adequada e o baixo atendimento educacional especializado nos deixa distantes de implantar, efetivamente, uma educação inclusiva”, exemplifica. Segundo dados do Censo da Educação Básica de 2018, apesar de 92,2% dos estudantes de 4 a 17 anos com algum tipo de deficiência frequentarem as salas de aulas comuns, apenas 40,4% estão matriculados com atendimento educacional especializado.
A meta de financiamento ainda prejudica o ensino por não garantir remuneração adequada e plano de carreira para os educadores. “De acordo com os cálculos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o professor ainda ganha abaixo de profissionais com o mesmo nível de instrução. Não podemos falar de qualidade da educação sem tratar de formação docente, valorização salarial e plano de carreira, que impactam diretamente na aprendizagem. O CAQ e o CAQi ajudariam a resolver essas questões”, acrescenta.
Próximo quinquênio
Além da meta 20, de financiamento, Pellanda também recomenda um olhar cuidadoso para a oito, nos próximos cinco anos. Ela trata sobre garantir a escolaridade média de 12 anos para pessoas que vivem no campo e para os 25% mais pobres do país, assim como igualar a escolaridade média de negros e não negros.
“Ela aponta desigualdade sociais que ainda estamos distantes de resolver”, explica. “O não cumprimento das metas 20 e oito impede que a educação básica avance. Isso impacta na educação superior e, ao final, na economia do país”, analisa.
Para a Campanha, se não houver mudanças, aproximadamente 90% das metas do PNE não serão cumpridas ou estarão muito atrasadas até 2024. Pellanda, contudo, lembra que vivemos um quadro de subfinancimento da educação e de escanteio político do PNE. “Como estamos na metade da vigência, não conseguiremos cumprir todas as metas”, explica. “Mas, para vislumbrar avanços, é necessário o fim do teto dos gastos (EC 95), que congelou os investimentos em educação e saúde por 20 anos a partir de 2016, e aprovar o novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) – PEC 65/2019, em trâmite no senado.
“O novo Fundeb prevê o aumento da participação do governo federal e entes, tornaria o fundo permanente, ajudaria a regulamentar o CAQ, colocar o plano na centralidade do debate e viabilizar as metas estruturantes”, aponta. “Já o teto dos gastos estrangula, também, investimentos em saúde, e dados de aumento da mortalidade infantil e de trabalho infantil, seja no campo ou doméstico, impactam igualmente a educação”, lembra.
O panorama político, contudo, também é desafiador. “Viemos com cortes na educação com o ministro da fazenda Joaquim Levy, em 2015, a PEC do Teto no governo Temer, e o atual governo nem sequer cita o PNE, principal legislação da educação, em seu plano de governo ou no plano de 100 dias”, lamenta.
“Quando as pessoas cobram os ministros da educação por não terem um plano, é preciso lembrar que o plano já existe, e é o PNE. Segui-lo nos garantirá uma educação de qualidade e capaz de incluir todos”, assinala.
Cumprimento parcial
De acordo com o documento da Campanha, foram parcialmente cumpridas as metas sete (fomentar a qualidade da educação básica em todas as etapas e modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem, de modo a atingir as seguintes médias nacionais para o Ideb); 11 (triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio, assegurando a qualidade da oferta e pelo menos 50% da expansão no segmento público); 13 (elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior para 75%, sendo, do total, no mínimo, 35% doutores); e 14 (elevar gradualmente o número de matrículas na pós-graduação stricto sensu, de modo a atingir a titulação anual de 60 mil mestres e 25 mil doutores).
“O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira Legislação e Documentos (Inep) considerou cumprida a meta 13. De fato, a meta global foi cumprida, mas, se olharmos a distribuição regional, ela não foi atingida no norte e nordeste. Ela também se mostra cumprida nas universidades públicas, mas distante quando o recorte são apenas as particulares”, contrapõe.
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