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Com a pandemia do novo coronavírus (covid-19) e a suspensão das escolas, as aulas, que antes eram presenciais, tiveram que ser adaptadas para o ambiente virtual. Mas será que a distribuição e aplicação de material online podem ser consideradas como educação a distancia (EaD)? A especialista em EaD pela Universidade de Brasília (UnB), Gina Vieira Ponte, questiona o uso indiscriminado dessa classificação para todo e qualquer conteúdo distribuído na internet para os alunos.

Entrevistada neste podcast, ela ressalta que a legislação prevê essa modalidade para a educação básica, mas apenas em emergências. O artigo 9º do Decreto Federal 9.057 de 2017, dispõe sobre o público a quem pode ser dirigido o ensino fundamental a distância, previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).

Segundo o documento, as situações emergenciais envolvem: pessoas impedidas por motivos de saúde de acompanhar o ensino presencial; que se encontrem no exterior por qualquer motivo; que vivam em localidades que não possuam rede regular de atendimento escolar presencial; que sejam transferidas compulsoriamente pra regiões de difícil acesso, incluídas as missões localizadas em regiões de fronteira ou que estejam em situação de privação de liberdade.

“O que este decreto anuncia é que as pessoas que estiverem em situações emergenciais poderão ser atendidas a partir da proposta da educação a distância. Mas o artigo não menciona que isso seja feito massivamente em substituição ao ano letivo”, explica. A especialista define que o que muitas redes estão fazendo agora, na verdade, é um atendimento remoto mediatizado pelas tecnologias em função de uma situação emergencial.

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Ainda no áudio, você acompanha as participações do coordenador da pós-graduação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) e responsável pelo portal Papo de Educador, Damione Damito, e do professor André, que leciona nas redes pública, privada e técnica em São Paulo (SP).

Eles ajudam a diferenciar educação a distância de ensino remoto e defendem que, mesmo não atendendo a todos os preceitos de uma educação em condições iguais para todos, como prevê a constituição, o contato entre professores e alunos, das mais variadas formas, ajuda nesse momento.

“O ensino é focado na mera transmissão de informação e, através dela, o sujeito adquire para essa informação um significado, uma aplicação e transforma isso em conhecimento”, resume Damito.

“A pessoa que está formando tem que levar em conta a importância da interação social para formação do indivíduo; não deixar essa criança isolada”, conclui o professor André.

Crédito da imagem: Median Santos

Transcrição do Áudio

Música “Roots of Legend” (Density & Time) permanece de fundo

Gina Vieira:
Se a gente não tiver cuidado, esse atendimento remoto pode se tornar uma maneira de aprofundar as nossas desigualdades sociais, que são grandes.

Gina Vieira Ponte, professora da educação básica na secretaria de educação do Distrito Federal, especialista em educação a distância.

Vinheta: “Instituto Claro – Educação”

Música instrumental, de Reynaldo Bessa, de fundo

Marcelo Abud:
Educação a distância, ensino remoto, teleaula… De repente, esses conceitos passaram a fazer parte do dia a dia de todos. Especialista em EaD pela Universidade de Brasília, a professora Gina Vieira esclarece o que diz a Lei de Diretrizes e Bases em relação à educação básica.

Gina Vieira:
O que está preconizado na LDB é que ensino fundamental será presencial, sendo ensino a distância utilizado como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais. Decreto Federal 9.057, de 2017, no seu artigo 9º, dispõe que a oferta do ensino fundamental na modalidade a distancia, em situações emergenciais previstas na LDB, se refere a pessoas impedidas por motivos de saúde de acompanhar o ensino presencial; que se encontre no exterior por qualquer motivo; que vivam em localidades que não possuem rede regular de atendimento escolar presencial; que sejam transferidas compulsoriamente pra regiões de difícil acesso, incluídas as missões localizadas em regiões de fronteira ou que esteja em situação de privação de liberdade.

Música: “O quê” (Arnaldo Antunes), com Titãs
“O que não pode ser que não / É o que não / Pode ser que não é”

Gina Vieira:
O que este decreto anuncia é que as pessoas que estiverem em situações emergenciais poderão ser atendidas a partir da proposta da educação a distância. Mas o artigo não menciona que isso venha ser feito massivamente em substituição ao ano letivo.

Então educação a distância não pode ser confundida com o que muitas redes estão fazendo agora, que é um atendimento remoto mediatizado pelas novas tecnologias em função de uma situação emergencial.

André:
Sou professor André, leciono na rede estadual, na rede particular e, também, no ensino técnico.

Com as mudanças que ocorreram e agora com a quarentena, os nossos filhos estão em casa, nós estamos ensinando nossos filhos, ensinando os conteúdos e aí sim eu pude perceber a importância da escola na formação do cidadão. A interação de pessoa com pessoa, inclusive até os conflitos que são gerados dentro do ambiente escolar, eles proporcionam uma aprendizagem. E essa aprendizagem o pai, às vezes, não percebe. O contato do filho dele ali com a tia da limpeza, no caso da escola pública, com a pessoa que está servindo a merenda, todas as orientações que são passadas, elas servem, de uma certa forma, de formação para o indivíduo. Quando esse aluno vai para o mercado de trabalho, ele vai ter que interagir com diferentes pessoas e, nesse momento, a escola é primordial para formar o cidadão, formar essa pessoa crítica, que interage com o outro, que respeita o limite do outro, a cultura do outro.

Marcelo Abud:
O coordenador da pós graduação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo e responsável pelo portal Papo de Educador, Damione Damito, concorda e ressalta que educação é um conceito mais amplo do que ensino.

Damione Damito:
O ensino, ele é focado na mera transmissão de informação e, através dessa transmissão de informação, o sujeito adquire pra essa informação um significado, uma aplicação, transforma isso em conhecimento e todo esse conjunto de processos, nós chamamos de educação.

Gina Vieira:
Pra gente chamar de educação a distância o que a gente está fazendo, a gente teria que seguir os critérios e os preceitos que orientam a educação a distância como uma modalidade de educação já consolidada na história da educação brasileira: que tem uma legislação própria, uma metodologia específica, que envolve a atuação de vários profissionais, então, desde especialistas em tecnologia, até professores conteudistas, professores autores, passando por tutores a utilização das novas tecnologias…

Música: “Herdeiros do futuro” (Elifas Andreatto / Toquinho), com Toquinho e Orquestra e coro do Projeto Guri
“Somos os herdeiros do futuro / E pra esse futuro ser feliz / Vamos ter que cuidar bem desse país/ Vamos ter que cuidar bem desse país”

Marcelo Abud:
Mesmo que as escolas não consigam contemplar esses requisitos de uma educação a distância, manter a possibilidade de contato entre professores e alunos traz benefícios também neste momento.

Gina Vieira:
Pra mim, o principal deles é fazer com que o estudante mantenha o vínculo com a escola e possa se manter engajado no processo de aprendizagem.

Marcelo Abud:
Por outro lado, a professora lembra que a Constituição Federal prevê uma série de princípios que devem orientar e dar sustentação às políticas públicas educacionais.

Gina Vieira:
E um desses princípios, que está anunciado no artigo 206, prevê que o ensino será ministrado com base na igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.

É impossível a gente garantir que todos os estudantes do Brasil terão as mesmas condições pra acessar esse ensino remoto e que, portanto, a gente vai poder garantir esse princípio da isonomia entre os estudantes.

Trecho de aula pelo rádio em Alagoas:
“Eu sou o professor Gustavo e estou aqui com a disciplina de língua portuguesa”

Marcelo Abud:
Algumas redes de ensino têm oferecido aulas pela TV ou pelo rádio como solução para o acesso das crianças e adolescentes aos conteúdos.

Damione Damito:
As teleaulas são a transmissão dessa informação, desse conhecimento, em dispositivos de mídia, como as televisões, como as rádios. As teleaulas são um meio que têm o seu nível de eficiência, um custo relativamente baixo de produção e um alcance muito grande, porque é muito difícil hoje em dia um domicílio que o indivíduo não tenha um rádio ou uma televisão. Sendo assim, ela é bastante democrática. O grande problema da teleaula é que as pessoas elas aprendem de maneiras diferentes. E quando você transmite uma teleaula, você está preterindo somente uma das formas de aprender. Com isso, ela tem a sua eficiência diminuída.

Marcelo Abud:
Para o professor André, independentemente de a aula ser presencial ou remota, educadores têm de perceber a importância que possuem para suas turmas.

André:
A pessoa que está formando tem que levar em conta a importância da interação social pra formação do indivíduo. Não deixar essa criança isolada. Posso citar o meu exemplo: eu estudei na mesma escola que hoje eu leciono; hoje muitos alunos que estão na faculdade, estão cursando nível superior, inclusive, até eu fui orientado por um professor pra chegar até esse nível de formação.

Música instrumental, de Reynaldo Bessa, de fundo

Marcelo Abud:
Nem todo conteúdo distribuído por meio da tecnologia é educação a distância. Mas neste momento de emergência, tanto quanto nas aulas presenciais, a busca de estabelecer conexão entre professores e alunos deve ir além da mera entrega de conteúdos e do cumprimento do ano letivo.

Com apoio de produção de Daniel Grecco, Marcelo Abud para o Instituto Claro.

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