Um documentário que traz práticas inovadoras de educação no Brasil foi lançado na íntegra no YouTube, nesta terça-feira (29/7). “Quando Sinto que Já Sei” reúne sete projetos educacionais que tem em comum um olhar especial para as relações no dia a dia do ambiente de aprendizagem. As práticas se distanciam do modelo convencional de escola para promover maior participação cidadã, autonomia e afetividade.
Tocado como um projeto independente, os realizadores do documentário visitaram iniciativas durante dois anos e meio, entrevistando cerca de setenta pessoas entre alunos, educadores e profissionais de diversas áreas. Agora, disponibilizam online o trabalho e incentivam a exibição gratuita do filme. Até ontem, já estavam prevista sessões gratuitas na Alemanha, Chile, Bolívia, Colômbia, Argentina, Israel, Inglaterra e Estados Unidos, além de diversas cidades brasileiras (veja a lista completa aqui).
NET Educação conversou com o empreendedor social e cineasta, Antônio Sagrado, quem realizou o documentário junto com Anderson Lima, Raul Perez e Anielle Guedes. Ele conta como foi fazer o filme, as mensagens por trás do documentário e o que aprendeu ao realizar “Quando Sinto que Já Sei”. “Esperamos que quando terminarem de ver, de alguma maneira saiam mais sem respostas prontas e padronizadas sobre educação. Mais inquietas e mais reflexivas”, diz.
 
No Projeto Araribá, da Escola Municipal Sebastiana Luiza, no litoral de São Paulo,
os estudantes têm aulas-passeio (Crédito: Divulgação)
NET Educação – Como surgiu a ideia do filme?
Antônio Sagrado – Já pesquisava educação e estava em um momento de vida querendo entender o que fazer, quando li a biografia de Eurípedes Barsanulfo, que fez uma escola revolucionária aqui no Brasil, em 1902. Em um momento que tinha palmatória, meninos e meninas eram separados, ele fez o contrário. Fiquei me perguntando se outros colégios hoje tinham esse funcionamento, e conheci a Escola da Ponte. Em janeiro de 2011, encontrei o Raul [Perez], em Porto [Portugal] e de uma conversa, a ideia nasceu clara que faríamos um produto audiovisual que mostrasse coisas boas no Brasil sendo feito por brasileiros.
NET Educação – O documentário tem imagens curiosas como a do sapo com as crianças, da briga na escola, a menina que resolveu fazer a lição no modelo tradicional… Passaram quanto tempo em cada projeto? O que todos têm em comum?
Sagrado – Visitamos dez projetos em oito cidades. Mas no filme, entraram sete projetos. O tempo que ficávamos em cada escola variava de três a cinco dias, umas dez horas por dia. Tanto documentando tudo que podia acontecer de inesperado ali como as entrevistas do roteiro predeterminado.
Algo em comum que amarrou o filme, porque os projetos são diferentes um dos outros, é a atenção que dão no processo de repensar as relações: professor com professor, professor com aluno e aluno com aluno. O que diferencia de projetos tradicionais de sala de aula. Logo depois do conflito entre dois meninos, tem a fala do José Pacheco [idealizador da Escola da Ponte] que é o ápice do filme, dizendo que está tudo centrado na relação e na qualidade dessa relação.
NET Educação – O que significa centrar nas relações?
Sagrado – Centrar no dia a dia. A Mediação entre as coisas que faz com que esses projetos entrem por outro viés de educação. Deixa de ensinar conteúdo e enquadrar no preestabelecido, e passa incentivar o desenvolvimento pessoal do aluno de outras maneiras. Deixa de ser um pessoal que ignora a relação pessoal do aluno, afetiva, o que está acontecendo na casa dele, mas não passa a ser num sentido que substitua o papel dos pais.
NET Educação – Foram dois anos e meio produzindo? O que mais te surpreendeu ao fazer?
Sagrado – Descobrir que tem muito mais coisas acontecendo no Brasil do que eu imaginava. Dos projetos que existem assim, não gravamos nem com 5%. Já ouvi falar de mais de cem, pois para além dos projetos que estão se repensando mais formalmente e claramente, tem outros exemplos ocorrendo, principalmente no interior do país, sem que eles próprios saibam que é revolucionário. Acaba sendo silencioso, no sentido de que ninguém fica sabendo. Tem muita coisa boa e ignoramos, mas muita mesmo!
NET Educação – Pra quem é o filme? Você gostaria que as pessoas saíssem do filme com o que?
Sagrado – Pensamos principalmente para professores da rede pública, e secundariamente todos os envolvidos na comunidade escolar e o público em geral. Esperamos que quando terminarem de ver, de alguma maneira saiam mais sem respostas prontas e padronizadas sobre educação. Mais inquietas e mais reflexivas.
O Projeto de Educação Científica do Instituto Internacional de Neurociências
Edmond e Lily Safra, idealizado por Nicolelis, atende 1,4 mil alunos de
escolas públicas (Crédito: Divulgação)
NET Educação – Uma das grandes questões ligadas aos modelos de ensino inovadores, que vocês pontuam no filme principalmente na fala do Miguel Nicolelis, é que no geral os professores acham legal, mas não acreditam que podem fazer parte da sua realidade. Justamente porque têm pouco tempo, são obrigados a transmitir determinados conteúdos pedagógicos. Acha que os modelos diferentes são possíveis para todos?
Sagrado – Acho que sim, mas causa um desconforto sem sombra de dúvida. Fazer o diferente dá mais trabalho, é desgastante e não é fácil. Se o professor espera melhorar a qualidade do processo, as consequências de um projeto inovador são positivamente bem maiores. Mas, como qualquer mudança, vai ser desconfortável e vai dar trabalho. Esperar modificações venham prontas e de forma institucionalizada, não vai acontecer. Ele pode começar sabendo que é um movimento desconfortante.
NET Educação – Uma das premissas de muitos projetos do filme é o de que não é só na sala de aula que se aprende. O que você aprendeu fazendo o documentário?
Sagrado – Aprendi a fazer filme, primeiro de tudo. Eu tinha estudado engenharia de gestão, mas estava frustrado e já estudava artes visuais desde pequeno. Então, quis fazer o meu primeiro longa-metragem com uma temática que me provocasse. Também, usamos o filme como uma escola de cinema, ao invés de ir fazer uma graduação nessa área. Do ponto de vista da pesquisa, desde as leituras até projetos que visitamos, gerou um contato com a educação muito mais intenso do que se estivéssemos feito três anos de pedagogia.
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