Adquirir uma deficiência ao longo da vida exige paciência e um tempo de adaptação, processo que a atriz e consultora de inclusão Tabata Contri, de 40 anos, conhece bem. Ela ficou paraplégica após um acidente de carro no réveillon de 2000. “Eu não sabia se poderia namorar, estudar ou trabalhar, porque não via cadeirantes na sociedade. As abordagens na mídia eram ruins, sensacionalistas, com música triste de fundo”, relembra. “Quando não há representatividade, você se acha a última pobre coitada da terra. Uma imagem que não combinava comigo aos 20 anos e com sonhos”.

Os anos seguintes trouxeram desafios em relação à parte física, com duas cirurgias que precisaram ser refeitas. Foi ao buscar melhor qualidade de vida que ela conheceu a Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação. “Uma instituição pública onde conheci pessoas de diferentes realidades que viviam o mesmo que eu”, conta. “Percebi que não era a única naquele processo. Lá, foi ainda um divisor de águas porque aprendi sobre meu corpo, alimentação, cuidados com a bexiga, intestino, meus direitos e deveres”, lista.

Tabata Contri
Tabata Contri (crédito: acervo pessoal)

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Adaptada à nova realidade, Contri cursou teatro, marketing, começou a dirigir, virou gerente de loja, casou e hoje é mãe de um menino de quatro anos. “Torna-se pessoa com deficiência não é uma mudança fácil. Outros grupos de diversidade têm orgulho de suas diferenças. No nosso caso, a identidade chega relacionada à perda, dor e frustração”, descreve.“Porém, a gente pode se orgulhar de ser quem somos. Não por causa da deficiência, mas com ela”, opina a profissional, que ainda orienta evitar ambientes tóxicos – ainda que seja a família. “Busque aliados, aquelas pessoas que apoiam seus sonhos e não duvidam da sua capacidade”, aconselha.

Mudança abrupta

“Quem vira pessoa com deficiência passa por um luto parecido com o do falecimento de um ente querido, principalmente se for abrupto. Isso é natural e deve ser compreendido por aqueles que estão ao redor e que se propõem a ajudar”, compartilha a produtora cultura Luana Vasconcelos, de 41 anos. Luana foi atropelada por um ônibus na ciclofaixa onde trafegava de bicicleta a caminho do trabalho, em 2018. Com isso, perdeu uma perna e sofreu sequelas na outra.

“Quando se vira pessoa com deficiência em questão de segundos e com risco grave de morte, não dá tempo de pensar muito sobre”, assinala. Para ela, o choque de realidade aconteceu na alta hospitalar. “Senti que não havia mais pertencimento social, como se eu tivesse sido anulada como pessoa por causa da deficiência”, conta.

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Entre os aprendizados, ela defende a possibilidade de ressignificar a condição, reinventar-se e seguir em frente. “É mais difícil para uns do que para outros devido a fatores sociais. Eu resolvi fazer um novo curso superior e mudar de área aos 39 anos dentro das cotas”, revela.

Ela ainda acredita que a o acidente foi um divisor de águas em relação às pessoas que a cercavam. “Para quem passa por essa situação, não se sinta um fardo por precisar da ajuda familiar. Isso não te diminui como pessoa ou tira sua autonomia de decidir por você”, aponta. “Siga no seu tempo e limite. Ninguém é obrigado a servir de motivação para os outros, a não ser que queira”, salienta.

Filho e corrida

Adinor dos Santos, de 50 anos, é segurança aposentado e ficou cego, em 2008, por conta do avanço da diabetes sobre a retina e o nervo ocular. Como sua mulher precisava trabalhar, ele ficou responsável por cuidar do filho bebê, em casa, pouco tempo depois do diagnóstico. “Foi difícil reaprender a dar banho e comida. Mas também era um incentivo: quando ficava mal, pegá-lo no colo me tirava aquela sensação ruim da cabeça”, garante.

Adinor
Adinor e sua mulher, Sandra, durante treino de corrida. (crédito: acervo pessoal)

“Por já ter tido visão, nem sempre eu me aceito da forma como eu me encontro. Mas tenho pessoas que me incentivam, o apoio da minha esposa e sonhos. Aprendi braile, consegui finalizar o ensino médio e agora desejo fazer uma faculdade de direito”, adianta.

Outro apoio foi conquistado no grupo de formação de atletas com deficiência Achilles Brasil. Atualmente, Adinor treina como corredor: “Fiz muitas amizades, tive apoio dos meus guias e de uma madrinha de corrida, que me incentivou a retomar os estudos”.

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Atualizado em 03/08/2021, às 14h42

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