A violência patrimonial envolve controle, destruição, retenção ou apropriação de bens materiais. Ela pode ocorrer em relacionamentos afetivos, casamentos, parcerias domésticas, relações familiares ou entre cuidadores e pessoas vulneráveis, como idosos e pessoas com deficiência (PCD).

“No caso das mulheres, a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) descreve a violência patrimonial como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos”, resume a advogada de direito da família e sucessões e doutora em direito privado, Maria Goreth Macedo Valadares.

Na prática, outros exemplos de violência doméstica são: destruir objetos de uso pessoal, profissional ou com valor sentimental da vítima; reter salário e cartão de crédito; negar o direito da pessoa trabalhar; controlar ou se apropriar de rendimentos e outros recursos, como carro, móveis, roupas e afins; impedir que a pessoa tome decisões financeiras ou administre suas próprias finanças; destruir ou danificar intencionalmente pertences; coagir a vítima a assinar documentos financeiros contra a  sua vontade; entre outros. 

A  manicure Catiussia Puff, de 29 anos, foi vítima de violência patrimonial por parte do seu ex-companheiro, precisando abandonar a sua casa alugada após ele se negar a sair e ameaçá-la de morte. 

“Quando tentei proibi-lo de entrar na minha casa, ele foi ao meu trabalho e me agrediu. Sabia que ele tinha uma arma ilegal, então, meus amigos me ajudaram a me mudar do Rio Grande do Sul para São Paulo com o pouco de roupa que tinha”, relata. 

O ex-companheiro se apropriou de móveis, dinheiro e reteve documentos a fotos da infância de Catiussia. Também deixou de pagar o aluguel e as contas da casa, endividando-a propositalmente. 

“Eu precisei deixar objetos que nem havia terminado de pagar. Agora, tento reaver na justiça”, conta.

Sinais de alerta

Diferente da violência física, que deixa marcas, a violência patrimonial é gradativa e sutil, fazendo com que as vítimas demorem para se dar conta do problema.

“As mulheres perdem sua autonomia ou parte dela. Começam a sofrer limitações sob o manto de uma suposta proteção patrimonial, como se não fossem capazes de sozinhas fazerem uso e controle de seus bens, incluindo de seu salário”, exemplifica Valadares. 

“Alguns sinais passam despercebido ou chegam camuflados sobre uma possível proteção, ciúmes, amor em excesso quando, na verdade, são indícios de uma violência já existente ou que vem pela frente’, alerta.

A violência patrimonial costuma ser mais facilmente percebida quando a relação chega ao fim. “Por exemplo, quando ex-marido impede a mulher de ter acesso ao patrimônio do casal; omite informações sobre o mesmo; recusa-se a pagar qualquer valor para ela, que sempre foi sua dependente financeiramente; sai de casa e cancela cartões de crédito usados por ela; muda a senha das contas bancárias; para de pagar contas e outras despesas básicas”, ilustra Valadares. 

Desafios contra o problema

A violência patrimonial está presente em todas as classes sociais, porém, mulheres em relacionamentos abusivos, idosos, LBTQIAP+, PCDs, imigrantes e refugiados podem ser mais vulneráveis.

“A dependência financeira e emocional da mulher em relação ao homem pode contribuir”, contextualiza Valadares.

Nada impede homens de sofrerem violência patrimonial, porém, mulheres ainda são a maioria esmagadora das vítimas. “Fruto de uma cultura machista”, analisa a advogada. 

 Para quem sofre essa violência, as consequências podem ser dependência financeira, vulnerabilidade social, isolamento, baixa estima e impactos negativos na saúde mental, o que contribui para que o ciclo de violência continue. 

“É uma frustração tomar consciência de que se foi vítima de qualquer tipo de violência por um parceiro, daí a necessidade de um trabalho conjunto entre advogados, Ministério Público, Judiciário, sociedade, psicólogos e demais profissionais para acolher essas mulheres”, indica a advogada.

De acordo com Valadares, um desafio é a mulher se conscientizar de que foi vítima de violência. “Porque o controle exercido pelo companheiro pode vir rotulada de excesso de cuidado ou de zelo, minando a autonomia e liberdade delas”, pontua.  

“Há ainda um desafio da sociedade e do Judiciário para proteger essa vítima, porque processos de partilha de bens demoram anos. Em outras palavras, de que adianta haver uma lei sobre violência patrimonial se o Judiciário não consegue dar um retorno imediato para findar essa violência?”, questiona Valadares. 

Rede de apoio 

No Brasil, a violência patrimonial é abordada por legislações como: Lei Maria da Penha; código Penal Brasileiro (crime de dano, artigo 163) e apropriação indébita (Artigo 168); Estatuto do Idoso  (Lei nº 10.741/2003) e Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015).

“A Lei Maria da Penha prevê em seu art. 24 medidas que o juiz pode determinar para a proteção patrimonial, como: restituição de bens indevidamente subtraídos; proibição temporária de atos e contratos de propriedades em comum;  suspensão das procurações conferidas pela vítima ao agressor; caução em depósito judicial para repor perdas e danos materiais decorrentes da prática”, lista a advogada.

Assim como os amigos de Catiussia que a ajudaram a fugir do ex-companheiro, rede de apoio é importante para a vítima, como aponta Valadares. 

“Para denunciar a violência patrimonial, procure a delegacia de mulheres mais próxima, ligue para o número 180 (Central de Atendimento à Mulher), que funciona 24 horas por dia”, finaliza Valadares. 

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