A fumaça das queimadas que ocorrem no Brasil em 2024 resultou recentemente no fenômeno conhecido como “chuva preta” em estados como São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

“Qualquer chuva é uma forma de precipitação. Na chuva preta, há dois elementos principais: a água e a fuligem emitida para a atmosfera pela queima incompleta de material orgânico. Misturadas, geram essa coloração escura”, resume a geógrafa e professora da Universidade Estácio de Sá Débora Rodrigues Barbosa.

Doutor em física ambiental e professor da Faculdade de Meteorologia da Universidade Federal do Pará (UFPA), Rafael da Silva Palácios explica que a chuva preta pode ser formada de duas formas.

“Na primeira, a fuligem emitida pelas queimadas é agregada com a umidade do ar, formando gotículas de água escura, ou seja, a chuva já cai com essa coloração. Na segunda forma, a fumaça das queimadas é interceptada pela chuva, formando a chuva preta”, diferencia.

A chuva preta é ácida?

Segundo Palácios, o evento tem como consequência positiva limpar a atmosfera, melhorando a qualidade do ar. “Ela captura a fuligem e outros poluentes e os traz para o solo”, justifica.

Porém, a chuva preta provoca uma poluição difusa, já que a água escura é levada ao solo, rios e mananciais. “Ou seja, você limpa o ar, mas polui o solo”, sintetiza Barbosa.

Palácios explica que as partículas ou contaminantes presentes na chuva preta variam de acordo com os elementos presentes na atmosfera no momento da precipitação.

“Assim, não é recomendada a utilização dessa água para o consumo, incluindo para animais. Mas os efeitos ainda precisam ser estudados”, aponta o docente.

Segundo ele, embora a aparência da chuva possa assustar, a chuva preta não é perigosa como a chuva ácida.

“Após exposição, é recomendado apenas se lavar, uma vez que os contaminantes podem provocar irritações na pele e nos olhos”, acrescenta.

Porém, apesar de a chuva preta não ser necessariamente ácida, ela pode se tornar, como explica Barbosa.

“A fuligem isolada não altera o pH da água, mas sim poluentes como dióxido de enxofre e dióxido de nitrogênio, que são predominantemente encontrados em grandes centros urbanos. Então, se você misturar a fuligem com esses outros elementos, é possível ter uma chuva preta ácida”, informa a professora.

Impactos na agricultura

Um evento isolado de chuva preta pode não impactar na agricultura, desde que outras chuvas normais ocorram na sequência.

“Quando persistente ou sem um evento posterior de chuva normal, a chuva preta pode depositar poluição sobre a folhagem e favorecer o desenvolvimento de fungos e bactérias, elevando a incidência de doenças sobre as plantas”, aponta Palácios. “Além disso, essa mesma deposição sobre a folhagem pode impactar na abertura de estômatos da planta, interferindo na transpiração e capacidade de fotossíntese de uma cultura.”

Para completar, existe a possibilidade de contaminação do solo usado na agricultura, pois a fuligem pode alterar as propriedades químicas dele.

“Essas chuvas contêm o que a gente chama de black carbon, que é o carbono negro, poluente gerado pela queima incompleta de biomassa, de matéria orgânica ou por combustíveis fósseis. No solo, pode afetar a disponibilidade de nutrientes para as plantas”, descreve Barbosa.

Palácios explica que chuvas pretas provocadas pelas emissões de queimadas têm impacto mínimo sobre a infraestrutura urbana, incluindo a lataria de veículos.

“Isso porque as emissões e concentrações de poluentes nas queimadas são diferentes de emissões das indústrias”, indica.

Para Barbosa, soluções contra o problema passam por reduzir as queimadas e a emissão de poluentes atmosféricos.

“Além disso, são necessários monitoramento contínuo e fiscalização dos biomas. Caso contrário, é possível que esse tipo de fenômeno seja cada vez mais frequente”, avalia Palácios.

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Crédito da imagem: Tatarszkij – Getty Images

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