O futebol de cegos é uma modalidade praticada por atletas com deficiência visual. “Há três classes de deficiência, que começam com a letra B (de blind, cego em inglês). No futebol de cegos dos Jogos Paralímpicos, somente atletas B1 podem participar, que são cegos totais ou com percepção de luz. Mas há outros campeonatos que contemplam atletas B2 e B3, que possuem resquícios de visão”, explica o coordenador de arbitragem de futebol de cegos da Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais (CBDV) Lúcio Morgado.

As regras do futebol de cegos são semelhantes às do futsal. Ele ocorre em uma quadra de futsal adaptada, com barreira feita de placas de madeira ou acrílico, ou em campos de grama sintética.

Cada time é formado por cinco atletas: um goleiro, que enxerga, e quatro jogadores de linha totalmente cegos que usam uma venda nos olhos para deixá-los em iguais condições, já que alguns atletas possuem um resíduo visual (vulto).

“O goleiro pode ser vidente ou deficiente visão B2 ou B3”, diz Morgado.

Por conta do número de jogadores, o futebol de cegos foi chamado de ‘futebol de 5’ até 2022. “A mudança buscou facilitar a associação do nome à modalidade”, complementa.

Regras do futebol de cegos

O futebol de cegos conta com dois tempos de 15 minutos e um intervalo de dez. Cada equipe pode pedir um tempo técnico de um minuto por etapa da partida.

Uma curiosidade é que o silêncio é necessário no futebol de cegos.

“A bola possui uma adaptação, que são guizos para orientar os jogadores dentro de quadra por meio do som. Além disso, os jogadores da defesa precisam ouvir as orientações do goleiro; e os atletas que estão no meio da quadra, do técnico”, explica Morgado.

“Há ainda um guia, o chamador, que fica atrás do gol adversário orientando o ataque de seu time, dando a seus atletas a direção do gol, a quantidade de marcadores, a posição da defesa adversária, as possibilidades de jogada e demais informações úteis”, relata.

“Daí a necessidade do silêncio na partida: a torcida só se manifesta quando a bola estiver fora do jogo”, esclarece Morgado. “Apesar de o silêncio ser necessário, a alegria da torcida é bem-vinda e contagia”, completa.

É o chamador que bate nas traves quando se cobra falta, pênalti ou tiro livre. “Contudo, só pode falar quando seu atleta estiver no terço de ataque, determinado por linhas tracejadas no solo”, conta o especialista.

Para evitar choques, os jogadores são obrigados a falar a palavra espanhola “voy” (“vou”, em português) ao se deslocarem em direção à bola. Caso contrário, o juiz marca falta. Para completar, são permitidas seis substituições por tempo de jogo e quatro faltas por período a cada time.

A partir da quinta falta, um tiro livre de oito metros, sem formação de barreira, é concedido ao time adversário.

“Esporte transformou minha vida”

Maicon Junior, de 24 anos, é jogador da Seleção Brasileira adulta de futebol de cegos desde 2019. Antes disso, passou pela seleção jovem.

“Perdi a visão por completo aos dez anos. Como toda criança, sonhava ser jogador. Meus amigos e familiares adaptavam formas para eu sempre bater bola com eles. Colocavam sacos plásticos na bola, por exemplo, para eu identificar o som”, relata.

“Por ser do interior e morar longe de Salvador, não sabia que cegos poderiam estudar ou jogar bola. Isso só aconteceu quando conheci o Instituto dos Cegos da Bahia. Em 2013, aos 13 anos, conheci a bola com guizos e comecei a me dedicar”, conta.

“O esporte transformou a minha vida: trouxe conhecimento, oportunidades… me levou para diversos lugares do mundo. Foi graças ao futebol de cegos que eu consigo fazer o que gosto, representar a minha cidade e o meu país. E isso me enche de orgulho”, compartilha.

Maicon Junior, jogador de futebol de cegos (Crédito: Flickr-CBDV)

História do futebol de cegos

Mas, como o futebol de cegos começou no Brasil? Segundo a CBDV, existem relatos de que, na década de 1950, cegos jogavam futebol nas instituições de ensino e de apoio com latas ou garrafas e bolas envolvidas em sacolas plásticas.

Em 1978, nas Olimpíadas da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), em Natal, aconteceu o primeiro campeonato de futebol com jogadores deficientes visuais no Brasil. A primeira Copa Brasil foi em 1984, e na América do Sul o primeiro campeonato reconhecido foi a Copa América de Assunção, em 1997, da qual o Brasil foi campeão. O primeiro Mundial aconteceu no Brasil, em 1998, em Paulínia (SP).

Já a primeira participação do futebol de cegos nos Jogos Paralímpicos aconteceu em Atenas, em 2004, quando a Seleção Brasileira se sagrou campeã. Os outros títulos vieram em Pequim 2008, Londres 2012, Rio 2016 e Tóquio 2020.

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Crédito da imagem: Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais – Flickr

*Atualizada em 04/09/2024, às 11h30

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