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Popularizado nos Estados Unidos no começo dos anos 2000, o trap — um subgênero do rap — caiu no gosto dos jovens brasileiros nos últimos anos. Apesar de ser conhecido por músicas em que artistas ostentam suas conquistas pessoais, o trap também traz letras que retratam a realidade da sociedade brasileira, debatendo violência, desigualdade, criminalidade e racismo. Hampesco é um traper que explora o ritmo em seu canal no YouTube. Ele convida sua mãe, a psicóloga Fernanda Hampe, — que classifica como feminista — para participar de diversos vídeos ouvindo as músicas a seu lado e apresentar suas reações ao público.

“A gente vê artistas que fazem músicas mais pra festa, parecidas com o funk, mas esse mesmo artista vai fazer músicas mais carregadas de crítica, de protesto, de até coisa mais emocional da vida dele, do passado dele, do que ele teve que passar pra chegar onde ele está hoje”, analisa Hampesco.

No áudio, ele e a mãe selecionam músicas às quais reagiram e comentam o valor que essas composições têm para o melhor entendimento do contexto social do Brasil. “Eu gostei muito de ‘Lei Áurea’. Acho que a gente tem muito a aprender sobre o nosso lugar na luta antirracista, que é romper com essa ideia salvacionista, que os negros foram salvos pela assinatura da abolição da escravatura pela princesa e etc”, exemplifica Fernanda Hampe.

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Acompanhe os reacts citados no podcast:

Lei Áurea, Borges

Canção Infantil – Cesar MC

180

The Cypher Deffect 3 – Costa Gold

Transcrição do Áudio

Música: “Nossa Luta” (Mãe Feminista)
Sou mulher, mãe e feminista
Vou falar da nossa luta
É diária e infinita
Em um mundo em disputa

Fernanda Hampe:
Olá, eu sou a Fernanda Hampe, a mãe feminista no canal do João Pedro – canal Hampesco -, desde 2019 venho fazendo algumas participações no canal dele e, além de ser a mãe feminista, sou psicóloga e professora universitária.

Música: “Planos” (Hampe ft. Charles Santos)
Ano que vem todo mundo vai ‘sabe’ meu nome
Com foco e trabalho a gente vai ‘chega’ muito longe

Hampesco:
O trap é basicamente uma vertente do rap, só que o trap é um movimento mais moderno assim, misturado um pouco com o pop, uma musicalidade mais cantada, até do auto-tune.
Salve, rapaziada, sou Hampesco, sou youtuber aí – vai fazer uns 7 anos já que eu faço vídeo pro youtube, criador de conteúdo em geral e trago minha mãe feminista para fazer alguns reacts no canal e é sobre isso que a gente vai falar aqui no podcast hoje.

Vinheta: Instituto Claro – Cidadania

Música: Introdução de “Nossa Luta”

Marcelo Abud:
Criado nos Estados Unidos no começo dos anos 2000, o trap caiu no gosto de jovens artistas e do público brasileiro nos últimos anos. Apesar de prevalecerem letras que valorizam a ostentação, há composições que trazem letras que retratam temas como violência, desigualdade, machismo, racismo e outros temas importantes.

Hampesco:
O geral dos traps é assim é uma coisa pra tu se sentir bem, não preocupar muito com o que está sendo dito. É mais sentir ali o flow, a música, curtir, mas anda junto com o rap, são dois gêneros musicais que andam conectados.

Fernanda Hampe:
Algo que eu fui aprendendo da emergência deste desdobramento do rap fazendo parte do movimento hip hop, como é que o rap chega no Brasil pelos Racionais MC’s e ‘Sobrevivendo no Inferno’, né, falando da vida na cadeia, na vida do egresso do sistema penitenciário aqui do país, quem é a população majoritariamente encarcerada; e eu fui aprendendo que o trap não se compromete apenas com isso, mas também não dispensa isso.

Hampesco:
Também tá junto, né?

Fernanda Hampe:
As narrativas do trap, a sua grande maioria, elas estão vinculadas a essa ideia da vida ostentação e aí vem, né, a minha grande provocação de como as mulheres são narradas nessas músicas como mais um objeto de ostentação, mas também tem músicas que é uma história da sua vida, marcada por esse lugar de acessar a música e ser alguém da música com uma ideia de ser visibilizado de valor e de reconhecimento.

Hampesco:
Acho que o trap é um gênero muito versátil assim, né? Tu pode fazer de tudo. A gente vê artistas fazendo até as duas coisas o mesmo artista: fazendo músicas que é mais pra festa, mais uma pegada até parecida com o funk, cantar coisas parecidas com o funk, mas esse mesmo artista vai fazer músicas mais carregadas de crítica, de protesto, de até coisa mais emocional da vida dele, do passado dele, do que ele teve que passar pra chegar aonde ele está hoje. Toda essa história junto também no mesmo artista, né?

Marcelo Abud:
No canal do Youtube, juntamente com sua mãe feminista, Hampesco traz conversas profundas a partir de músicas que têm um cunho mais social.

Hampesco:
A primeira música mais de crítica social que a gente escutou foi a ‘Canção Infantil’ e foi porque o público comentou, a gente fez um primeiro que era reagindo a trap no geral. Então, eu peguei ali os principais traps que estavam rolando na época, que eram trap desse gênero assim mais tipo da mulher, da ostentação e tal, e fiz o vídeo dela reagindo a esse tipo de trap ali. Aí o pessoal comentou ‘olha, isso aqui ela vai gostar, tenho certeza’ e comentaram lá ‘Canção Infantil’. É um dos comentários com mais likes desse vídeo nosso reagindo a trap.

Música: Canção Infantil (part. Cristal), com Cesar MC
A vida é uma canção infantil
É sério
Pensa, viu?
Belas e feras, castelos e celas
Princesas, Pinóquios, mocinhos e…

É, eu não sei se isso é bom ou mau
Alguém me explica o que nesse mundo é real
O tiroteio na escola, a camisa no varal
O vilão que tá na história ou aquele do jornal

Fernanda Hampe:
É uma obra de arte, mas eu não sei se ela chega a ser uma música que a gente pode chamar de trap.

Hampesco:
É mais um rap…

Fernanda Hampe:
Mas acho que é uma música imperdível.

Marcelo Abud:
A pedido do Instituto Claro, Fernanda e Hampesco indicam três traps que dão a noção do contexto social abordado pelo gênero.

Fernanda Hampe:
Eu gostei muito de Lei Áurea. Acho que a gente tem muito a aprender qual é o nosso lugar na luta antirracista, que é romper com essa ideia salvacionista, que os negros foram salvos pela assinatura da abolição da escravatura pela princesa e etc.

Música: “Lei Áurea” (Luis Felipe Borges / Prod. L3ozin), com Borges
Olhos de ódio reluzem saudade
Lei áurea liberta não traz igualdade
Genocídio homicídio
Mais morador que bandido
Muitas família chorando sempre falam
Que é envolvido

Fernanda Hampe:
É uma música que vai falar de outro lugar. Vai falar do lugar da resistência de sempre do povo negro contra a escravização e não atribuir então a essa figura redentora, que está na mão de alguém a liberdade.

Hampesco:
Eu vou indicar um que é um pouco mais recente, que é de uma música do Costa Gold, que é um coletivo de rap, de trap também, enfim, da música “The Cypher Deffect 3”, que é uma música muito boa também.

Música: “The Cypher Deffect 3” (Andre Rodrigues Salles Xavier / Caio Martins Nogueira / Lucas Predella de Araujo / Matheus de Araujo Santos / Rodrigo Freitas Fernandes Morais / Vinicius da Silva Alves Conceicao), com Costa Gold
Ah, com essa responsa no meu peito
Eu não vou recuar, não tenho medo
Ah, fui escolhido, então não rejeito
Já tava escrito, então não tem jeito

Hampesco:
Acho que ela tem uma pegada parecida com ‘Lei Áurea’, do Borges, traz esse contexto também do racismo e tal, porque tem artistas negros que cantam ali também, mas essa aqui também traz uma coisa um pouco diferente, que tem muita crítica política ao governo e a música em si é muito boa. Então acho que vale o pessoal ver esse react aí, que é super legal.

Fernanda Hampe:
E tem também a música superinteressante que é do Alok, aquela, né, ‘180’, que eu acho que é uma música que convocou vários músicos a estar compondo junto.

Música: “180” (Davi Almeida Dos Santos), com Alok (part. MC Hariel, MC Marks, MC Davi, MC Leozinho ZS e MC Dricka)
[MC Hariel]
Quanto rancor eu guardei por ter que acompanhar essa situação
Vi meu herói se tornando um vilão
Vi minha coroa jogada no chão
Cena de filme não traz a imagem
Daquela lembrança no meu coração

Fernanda Hampe:
E tem uma pauta urgente, que é a questão da violência contra a mulher e essa ideia de homens falando disso. Homens podendo fazer esse chamamento do não à violência contra a mulher.

Música: “180” (Davi Almeida Dos Santos), com Alok (part. MC Hariel, MC Marks, MC Davi, MC Leozinho ZS e MC Dricka)
[Alok]
O mundo ainda é um lugar perigoso para mulheres
Não somente por aqueles que covardemente praticam a violência
Mas por aqueles que observam e deixam o mal acontecer
Se você tem consciência sobre isso
Ficar em silêncio já não é mais um erro, é uma escolha

Marcelo Abud:
Como psicóloga, Fernanda vê na participação no canal do filho adolescente a oportunidade de estabelecer um diálogo que traz aprendizados a ambos.

Fernanda Hampe:
Isso é um ponto muito importante de como a gente encontra nesse trabalho uma ponte de encontro, porque muitas vezes a posição dos adultos diante dos adolescentes e dos jovens é essa posição de achar que o projeto do adolescente é ter que se tornar um determinado adulto e que o adulto é que vai estar o tempo inteiro indicando aonde ele precisa chegar. E o que eu tenho aprendido assim com o João é esse lugar de poder escutar das suas experiências, dos seus caminhos, dos seus processos e que ele não está vivendo uma vida pra chegar a algum lugar, ele já está nesse lugar.

Hampesco:
Mas o que rolou foi que, por exemplo, depois que ela começou a apontar as coisas de como os trapers abordavam as mulheres, principalmente isso assim, a gente começa a se dar conta de que realmente, né, umas coisas assim meio complicadas de se ver, comecei a prestar atenção mais nisso. E muito também de outros contextos também, das músicas, por exemplo, questões mais sociais e tal. Eu não comecei a perceber isso, na verdade, depois que eu fiz os reacts com ela, acho que muito do que ela me ensinou já fazia eu perceber essas coisas nesse tipo de música, entendeu? Independente do react existir ou não, acho que a criação que minha mãe me deu, das coisas que ela já me ensinou já faz eu ouvir as músicas e prestar atenção em outras coisas assim.

Música: Introdução de “Planos” (Hampe ft. Charles Santos) fica de fundo

Marcelo Abud:
Os vídeos de reação no canal Hampesco geram reflexões e mudanças de postura, principalmente entre adolescentes e jovens que curtem o trap.
Marcelo Abud para o Instituto Claro.

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