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O “Dicionário das Relações Étnico-Raciais Contemporâneas” foi lançado em setembro de 2023 e aborda a discriminação, os racismos e as relações étnicas no Brasil em de 55 verbetes. Neste podcast, você acompanha as definições de antissemitismo e islamofobia.

O primeiro termo é apresentado pela historiadora, mestra em sociologia e integrante do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Judaicos (Niej) Milleni Freitas Rocha. De acordo com a especialista, o antissemitismo pode ser caracterizado em duas vertentes.

“O antissemitismo da antiguidade pode ser visto como esse preconceito ou essa tentativa de conversão dos judeus ao cristianismo. Então, existia a caracterização dos judeus como um grupo religioso. Não como povo, não como nação, até porque a atividade não tinha muita cidade de nação. Os judeus eram vistos como um grupo religioso e que, nesse sentido, eles deviam ser convertidos ao cristianismo. E havia essa ideia de que esse antissemitismo era, na verdade, um antijudaísmo”, explica.

“A partir da modernidade, os judeus começam a ser vistos como um grupo, um povo, uma nação sem território e, em certo sentido, eles acabam, na década de [1930], na Alemanha nazista, eles ganham esse caráter de uma raça inferior. Então, o antissemitismo na modernidade, ele passa a configurar uma perseguição aos judeus a partir da ideia de que eles são perigosos para o mundo, que eles são conspiradores”, completa Rocha.

A segunda expressão é explicada pela antropóloga, professora e coordenadora do Grupo de Antropologia em Contextos Islâmicos e Árabes (Gracias) Francirosy Campos Barbosa. Segundo a docente, a islamofobia “é o medo do islã, medo dos muçulmanos”.

“Mas a gente tem alguns pontos que acaba definindo como bases islamofóbicas. Seria a xenofobia, que sempre incide da ideia de que você tem medo do diferente, você tem medo do outro, da ideia de que esse outro vai ocupar o seu lugar na sociedade. Então isso acontece com muita frequência na Europa, nos Estados Unidos e que tem crescido também no Brasil”, argumenta.

“Essa base islamofóbica, a gente considera como a intolerância religiosa, grupos religiosos que acabam enfrentando, nesse espaço público, o islã. E aí o racismo religioso ou a racialização. É muito claro a gente ver isso, principalmente nas mulheres muçulmanas que passam a usar o lenço e, a partir do momento que você usa o lenço, você passa a estar racializada”, exemplifica Barbosa.

Clique no botão acima e ouça a íntegra das explicações das duas especialistas.

Veja mais:

Especial étnico-racial reúne expressões que debatem racismo e preconceito

Transcrição do Áudio

Música: Introdução de “O Futuro que me Alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Vinheta: Instituto claro, cidadania

Marcelo Abud:

O “Dicionário das Relações Étnico-Raciais Contemporâneas” foi lançado em setembro de 2023 e aborda a discriminação, os racismos e as relações étnicas no Brasil em 55 verbetes. Neste episódio, você acompanha a explicação de dois deles: antissemitismo, escrito pela historiadora Milleni Freitas Rocha; e islamofobia, tratado pela antropóloga Francirosy Campos Barbosa e pelo doutor em ciências sociais Felipe Freitas de Souza.

Ouça agora a integrante do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Judaicos da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Milleni Freitas Rocha:

Eu me chamo Milleni Freitas Rocha, eu sou mestra em sociologia pela UFF. Sou formada em história pela UFRJ e estudo assuntos sobre a questão judaica.

Bom, antissemitismo, ele pode ser caracterizado como o racismo e como preconceito e também como um conceito que racionaliza. Ou seja, coloca no ponto de vista racional a exclusão ou preconceito contra os judeus e, sobretudo, na década de 30, ele pode ser considerado também racismo, porque os judeus foram caracterizados como raça.

É importante a gente dividir o que eu posso caracterizar como um antissemitismo da antiguidade e um antissemitismo da modernidade. O antissemitismo da antiguidade pode ser visto como esse preconceito ou essa tentativa de conversão dos judeus ao cristianismo. Então, existia a caracterização dos judeus como um grupo religioso. Não como povo, não como nação, até porque na antiguidade não tinha muito essa ideia de nação. Os judeus eram vistos como um grupo religioso e que, nesse sentido, eles deviam ser convertidos ao cristianismo. E havia essa ideia de que esse antissemitismo era, na verdade, um antijudaísmo.

A partir da modernidade, os judeus começam a ser vistos como um grupo, um povo, uma nação sem território e, em certo sentido, eles acabam, na década de 30, na Alemanha nazista, eles ganham esse caráter de uma raça inferior. Então, o antissemitismo na modernidade, ele passa a configurar uma perseguição aos judeus a partir da ideia de que eles são perigosos para o mundo; que eles são conspiradores.

Aqui tem uma diferença importante que o autor Moishe Postone fala, que o racismo contra indígenas, contra negros, contra pessoas do Oriente de maneira geral, ele vai ser caracterizado pela ideia de que esses povos são inferiores culturalmente. Já o antissemitismo, principalmente na modernidade, ele vem da ideia de que os judeus, na verdade, eles são os donos do mundo. Então, que por um lado a gente tem o racismo contra as populações negras, indígenas, as populações nativas, que tende a inferiorizar essas populações, o antissemitismo tende a acreditar que os judeus, na verdade, são os mais poderosos, são os conspiradores, são aqueles ricos que controlam a mídia, que controlam tudo.

Essa ideia da conspiração judaica mundial, de um poder quase como se os judeus fossem controladores do mundo a partir de marionetes, essa ideia de que existe uma conspiração judaica vai ser uma das características do antissemitismo. Então, o antissemitismo, ele vem de um lado de acreditar que os judeus têm mais poder, um poder quase abstrato, um poder conspiratório em relação ao mundo. E que a sua riqueza também, esse valor, ele é, ele é abstrato, mas ele é absolutamente poderoso e por isso os judeus têm que ser excluídos, porque eles fazem parte dessa massa unificada, amalgamada de grupo, e que eles são coesos entre si. Enfim, a gente pode falar por muito tempo sobre as noções conspiratórias acerca dos judeus e que estão dentro dessa noção do antissemitismo moderno.

Marcelo Abud:

Depois de Milene Freitas Rocha elucidar o que significa antissemitismo, você acompanha a seguir a coordenadora do Grupo de Antropologia em Contextos Islâmicos e Árabes.

Francirosy Campos Barbosa:

Eu sou a professora Francirosy Campos Barbosa, sou antropóloga, docente associada da Universidade de São Paulo, do campus de Ribeirão Preto.

Islamofobia é o medo do islã, medo dos muçulmanos, mas a gente tem alguns pontos que a gente acaba definindo como bases islamofóbicas. Seria a xenofobia, que sempre incide da ideia de que você tem medo do diferente, você tem medo do outro, da ideia de que esse outro vai ocupar o seu lugar na sociedade. Então isso acontece com muita frequência na Europa, nos Estados Unidos e que tem crescido também no Brasil.

Ponto dois: essa base islamofóbica, a gente considera como a intolerância religiosa, grupos religiosos que acabam enfrentando, nesse espaço público, o islã. E aí o racismo religioso ou a racialização. É muito claro a gente ver isso, principalmente nas mulheres muçulmanas que passam a usar o lenço e, a partir do momento que você usa o lenço, você passa a estar racializada.

E a gente tem também como um forte ponto, né, o último ponto de ligação dessa base é sempre a ligação do muçulmano ao terrorismo, à violência, à destruição, à barbárie. Então, esses são os tópicos, né, que fazem a gente pensar nesse conceito da islamofobia, como o medo do outro, esse medo do diferente, que vai transparecendo como ódio, como repúdio.

Então, quando você vê essa resistência, essa intolerância, esse discurso de ódio contra os muçulmanos, a gente consegue perceber isso já com datas anteriores, que sempre existiu a islamofobia, esse terror, esse medo ao islã e aos muçulmanos, desde o próprio advento do islã, você já tinha isso, mas a gente tem aí os eventos gatilhos. Então 11 de setembro é um evento gatilho. A situação de 2015, com Charlie Hebdo, é um evento gatilho, a Primavera Árabe. Essas problemáticas que envolvam direta ou indiretamente os muçulmanos acabam sendo eventos gatilhos, né? Então aquilo que você não conhece, você cria um imaginário, e acho que ele só pode ser combatido por um trabalho conjunto coletivo.

Música: Introdução de “O Futuro que me Alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Marcelo Abud:

Acompanhe no Instagram do Instituto Claro a explicação, em vídeos curtos, de outras expressões do “Dicionário das Relações Étnico-Raciais Contemporâneas”. Organizado por Flávia Rios, Marcio André dos Santos e Alex Ratts, o livro apresenta também termos como “afrocentrismo”, “pós-abolição”, “feminismos negros” e “justiça racial”.

Marcelo abud para o podcast de cidadania do Instituto Claro.

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