A influência indígena nas festas juninas pode ser um tema abordado nas aulas de história, como aponta o doutor em antropologia e especialista em etnologia indígena Benedito Prezia. A abordagem contribui para o cumprimento da Lei nº 11.645/2008, que tornou obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena em toda a educação básica.

Segundo Prezia, as festas juninas podem ter recebido influência da bênção do milho novo, comemoração que ocorria entre os Guarani Mbyá, da família Tupi-Guarani, no final de agosto ou início de setembro, marcando a chegada da primavera. Além disso, muitos dos alimentos consumidos nas festas juninas têm origem na tradição indígena.

“É possível que a pamonha seja uma reminiscência de alimentos preparados pelos indígenas, envoltos em folhas de bananeira, como ainda hoje fazem povos da região Centro-Oeste, como os Kayapó, de língua jê. Certamente o munguzá, chamado também de canjica em São Paulo, é uma herança indígena”, afirma o pesquisador.

Em entrevista, Prezia destaca alguns pontos sobre a influência indígena nas festas juninas que os professores de história podem abordar com seus alunos.

Qual é a origem das festas juninas?

Benedito Prezia: A comemoração dessas festas veio da Europa, onde se celebravam São João e São Pedro nos dias 24 e 29 de junho, respectivamente. A festa de São João coincidia com o solstício de verão no Hemisfério Norte, marcando o dia mais longo do ano. Na ocasião, eram realizados antigos rituais agrícolas não cristãos, com pedidos de proteção contra doenças nos animais e pragas nas lavouras, envolvendo o uso de fogueiras, cantos e rezas específicas.

Quais são as influências indígenas nas festas juninas?

Prezia: Essas comemorações, trazidas ao Brasil pelos europeus, sobretudo pelos missionários jesuítas, encontraram elementos culturais indígenas que as reforçaram e ajudaram a popularizá-las ainda mais. É o caso da fogueira e da bênção do milho novo, realizada pelos Guarani Mbyá, da família Tupi-Guarani, no final de agosto ou início de setembro, início da primavera. Não identifiquei esse ritual em outros povos por falta de pesquisa, mas é provável que estivesse presente entre os indígenas do Nordeste.

Nesse contexto, também aparece a figura de Tupã, grande demiurgo dos povos Tupi, que acreditavam viver nas alturas e fazer chover. Assim, Tupã foi associado a São Pedro, tido na tradição católica como o guardião do céu. A fogueira é outro elemento importante da festa e pode ser considerada um traço indígena. Em muitas regiões do Nordeste, as fogueiras são familiares, ou seja, cada família faz sua fogueira em frente à própria casa.

O que era a bênção do milho novo?

Prezia: Entre os Guarani Mbyá, presenciei o “batismo do milho”, alimento básico desse povo. A celebração ocorria próxima às festas juninas e incluía a nomeação das crianças pelo pajé, que lhes dava nomes em guarani. A festa acontecia em agosto ou no início de setembro, ao fim da estação fria, quando a comunidade retomava a vida social. Com a influência da cultura não indígena, alimentos tradicionais feitos com milho passaram a ser substituídos por outros, como o chipá, um bolinho frito feito com farinha de trigo. O mesmo ocorreu com a bebida tradicional cauim, feita com milho fermentado, que deu lugar a outras bebidas. A festa junina preservou essa tradição de certo modo, com o cauim sendo substituído pelo quentão, feito com pinga e gengibre, servido quente por causa das temperaturas baixas. Na zona rural, havia ainda a tradição de se comer milho assado e batata-doce assada.

Quais alimentos feitos com milho estão presentes nas festas juninas e qual a relação com os povos originários?

Prezia: É possível que a pamonha seja uma reminiscência dos alimentos preparados pelos indígenas, envoltos em folhas de bananeira, como ainda hoje fazem povos da região Centro-Oeste, como os Kayapó. Certamente o munguzá, também chamado de canjica em São Paulo, é uma herança indígena.

Há diferenças na influência da culinária indígena nas festas juninas em outras regiões do Brasil?

Prezia: Posso falar da região Sul, que conheço melhor, onde foi introduzido o pinhão, alimento básico do povo Kaingang, fruto da araucária.

Veja mais:

Aprenda 9 brincadeiras indígenas para as aulas de educação física

Educação decolonial: confira possibilidades de abordagem em 11 disciplinas

Crédito da imagem: FG Trade – Getty Images

0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments

Talvez Você Também Goste

Como a escola pode ajudar a combater a misoginia?

Confira 9 orientações para promover reflexões sobre igualdade de gênero e respeito mútuo

Confira 13 dicas para um ensino de sociologia decolonial 

Professores orientam como incorporar às aulas os saberes de populações invisibilizadas e dos próprios alunos

Diretrizes Curriculares Nacionais: como estudar para concursos?

Especialista explica atualizações recentes das DCNs e principais pegadinhas em provas para professores

Receba NossasNovidades

Captcha obrigatório
Seu e-mail foi cadastrado com sucesso!

Receba NossasNovidades

Assine gratuitamente a nossa newsletter e receba todas as novidades sobre os projetos e ações do Instituto Claro.