Usar os games em sala de aula com um objetivo pedagógico bem formulado é o princípio da gameficação. Contudo, engana-se quem pensa que o conceito abarca apenas jogos eletrônicos. Segundo a professora de tecnologia educacional da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Paula Carolei, a gameficação não depende de software e pode ser realizada por meio de jogos físicos.

“A gameficação depende apenas de uma história bem contada e uma proposta pedagógica, para que o aluno possa vivenciar e aprender coisas. Gameficar é ter consciência dos processos educacional e entender o jogo como um instrumento para levar à reflexão“, complementa.

Exemplos de gameficação que podem ser realizadas sem aparatos eletrônicos ou misturando tecnologia e recursos físicos são os jogos de tabuleiro e os chamados “escapes” (fugas). “São competições realizadas em locais fechados, com o objetivo de sair do local. A maioria dos escapes são de entretenimento: o grupo precisa quebrar um código e achar uma chave. Mas é possível elaborar escapes com foco na argumentação e na história”, explica.

Em uma competição de fuga elaborada por Paula, os alunos precisavam descobrir o motivo que havia levado um professor a ser demitido. Por meio de pistas, os jogadores remontavam partes da narrativa. “Contudo, a história mostrava que o professor não era 100% culpado nem 100% inocente, o que exigia dos alunos defenderem seu ponto de vista por argumentação”, ressalta. “O objetivo era mostrar que o ser humano é complexo e que vai além das polarizações”, complementa.

Da esquerda para a direita, Paula Caolei e Gislaine Batista Munhoz. Crédito: Leonardo Valle

 

Para checar se o jogo imaginado realmente deu certo, Paula sugere aos professores fazerem um dia de teste (o chamado “Play Test”). “Contudo, é preciso entender que diversas coisas imaginadas não funcionarão na prática e é natural. Vemos que o docente tende a desistir quando isso acontece”, relata. “É como se fizéssemos vários protótipos que vão sendo aperfeiçoados. O processo é de refinar as ideias, algo extremamente valioso para a aprendizagem criativa também do educador”, acrescenta.

Tabuleiro e QRcode

Em 2013, a professora da rede municipal de São Paulo, Gislaine Batista Munhoz, foi pioneira em estimular seus alunos do ensino fundamental a desenvolverem jogos utilizando a plataforma Scratch.

Nos anos seguintes, Munhoz assumiu um cargo na Secretaria de Educação e seus alunos migraram para o ensino médio. Contudo, o vínculo entre professora e estudantes não se perdeu. Eles formaram um coletivo extra escolar chamado “Escola de Aventureiros” e, agora, exploram os jogos de tabuleiros.

No game apresentado na Campus Party 2018, cada casa do tabuleiro possuía um código QR para ser lido com celular e dar sequência à história. “Contudo, a mesma proposta pode ser realizada com cartas ou bilhetes”, explica a professora. “O jogo que desenvolvemos é lúdico, traz elementos fantasiosos do universo dos alunos, que são os autores da proposta. Dessa experiência, percebi que é importante para o professor mergulhar no mundo deles, que geralmente não é familiar”.

Giovana Provesan é uma das integrantes do “Escola de Aventureiros”. Para ela, o diferencial em trabalhar com jogos físicos é a maior interação com os colegas. “Há troca na elaboração dos jogos eletrônicos, mas ficamos mais isolados nos nossos trabalhos. Neste projeto, houve muita conversa para encaixar as ideias de todos”, assinala.

Já a estudante Milena Melão defende que o “Escola de Aventureiros” alia todo o aprendizado da eletrônica com necessidades da realidade física. “Por exemplo, aprendemos a gerar o código QR, mas o tabuleiro é feito com materiais reciclados. Foi uma combinação de experiência”, garante.

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