Eu andava meio distraída com o YouTube, até que minha filha de quatro anos começou a ficar muito interessada nos vídeos do YouTube Kids, mas não era Galinha Pintadinha ou coisas assim, ela estava assistindo a vídeos de YouTubers crianças!

Celebridades, pelo menos para ela, como: Maria Clara e JP, Valentina Pontes, Maloucos (Luizinho e Franzinha), Mc Divertida, Luluca e Luccas Neto (e a Gi) fazem um sucesso estrondoso.

Comecei a explorar este mundo, afinal, preciso acompanhar a presença digital dos meus filhos, que já nasceram inseridos nesse contexto. Confesso que fiquei admirada (ou assustada?) com este novo “mercado”.

Sobre as produções, é claro que apresentam alguns conteúdos bacanas, outros não. Precisamos estar sempre atentos e conversando com as crianças a respeito. Nem sempre ensinam coisas boas, isto desde a linguagem até atitudes. Tem coisas que não julgamos serem as ideais para nossos filhos.

Esta indústria é gigantesca! Além de muitos, muitos vídeos novos por semana, eles produzem clipes musicais. Até o dia 11 de janeiro de 2021, as visualizações em alguns clipes que acompanho aqui em casa eram:

● OBDC (Maria Clara e JP) – 96.445.868 visualizações.
● Bate palminha Bate da Valentina e a turma da Pakaraka (Valentina Pontes) – 30.867.632 visualizações.
● Música Infantil – Vida de Criança (Maloucos) – 14.544.873 visualizações.
● Slime – música oficial (Maloucos) – 12.306.614 visualizações.

Quem é da área fará uma conta rápida e saberá o quanto estes vídeos monetizam. E é apenas um de muitos!

E não é só isso: estas celebridades têm bonecos personalizados e outros artigos licenciados disponíveis à venda. Outro dia, minha filha foi ao shopping com a avó e voltou para casa com um livro de inglês da Valentina Pontes. O material é simples, mas bem feito, com exercícios de pintar e de ligar. São livros, bonecos, roupas personalizadas. Lembro que quando ela nem assistia ao Luccas Neto quis um tênis vermelho, tipo All Star. Depois descobri que todas as crianças nessa faixa etária (três a seis anos) tinham, na escola dela. Porque não era um tênis vermelho, era “o tênis da Gi”!

Conheçam as preferências de seus filhos, acompanhem. Eu, por exemplo, sei o nome de todos os youtubers que ela acompanha e o que fazem nos vídeos. Quando ela está assistindo, eu pergunto: por que a Maria Clara está brava? Por que a Franzinha falou isso? E minha filha acha um máximo conversar comigo a respeito. É claro que é estratégia! Precisamos conhecer e instruir, pois alguns vídeos são legais, mas existem situações que não são educativas e é preciso falar sobre isso com a criança, explicar.

O fato é que: celular disponível, sabe como usar, é livre para assistir. Resultado: diminuiu muito o tempo de uso e o interesse. Logo larga para brincar de verdade. Porque não há proibição, e como pode pegar quando quiser, essa vontade tende a diminuir. Fica a dica! Lembrando que o celular dela tem app de controle de pais.

O que ainda me incomoda nisso tudo não é minha filha e milhares de crianças consumirem esse conteúdo, é essas crianças “trabalhando” (?). Porque é um trabalho gigantesco! Quem é da área sabe que não é fácil criar roteiro, preparar cenário, gravar, editar e publicar três a quatro vídeos por semana. A pessoa fica refém disso, quer mais e mais audiência, ainda mais quando ficam famosos e com muitos seguidores. Em um desses canais as crianças fazem campanha para alcançar os 20 milhões de inscritos. Tem música e tudo. Minha filha vive repetindo: “já somos 10 milhões, em nossos corações…”.

Será que minha filha, eu e tantos outros não estamos alimentando uma indústria de pequenos astros que, na verdade, deveriam ser apenas crianças? Não tenho uma opinião fechada sobre isso. Às vezes penso que não, que essas crianças gostam, que os pais apoiam e sabem o que estão fazendo. Em outros momentos acho que é demais para a idade deles assumirem tamanho compromisso. Entretanto, o que eu sei é que não vão parar. Mais e mais youtubers surgem dia após dia, e a pandemia do covid-19 impulsionou este mercado. Por isso, precisamos ficar atentos.

Existem ainda aqueles canais, conduzidos por adultos, que filmam somente brinquedos, como a Tia Flá [encontrei um canal que ela mostra o apartamento onde mora, onde grava os vídeos e suas coleções de brinquedos]. É uma super propaganda de tudo de mais caro e da modinha que é lançado. Em outros canais são pessoas (adultos também!) abrindo e experimentando os mais variados doces; existem ainda os vídeos com milhares de receitas de como fazer slime, que é a velha amoeba da minha infância (pais que não conhecem, é tudo a mesma “melequera”: amoeba, geleka, slime e outros afins).

Existe muito conteúdo sendo produzido hoje para e por crianças, e é um boom de audiência. Vamos conhecer, entender, avaliar, interpretar e conversar com nossos filhos, que estão em casa consumindo tudo isso. Se eu estou exausta com o excesso de informação que invade minha timeline, das redes sociais, imagina uma cabecinha de quatro anos que mal conhece o mundo?

O Instituto Claro abre espaço para seus colunistas expressarem livremente suas opiniões. O conteúdo de seus artigos não necessariamente reflete o posicionamento do Instituto Claro sobre os assuntos tratados.

Autor Talita Moretto

Talita Moretto é especializada no uso de mídia e tecnologias aplicadas à educação. Atua na área desde 2008, dedicando-se, especialmente, à formação de professores. Idealizadora e diretora do Sala Aberta (salaaberta.com.br), é também coordenadora de Tecnologia Educacional no Colégio Sepam, em Ponta Grossa (PR). Contato: talitamoretto@salaaberta.com

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