Leonardo Valle
A moda produz aproximadamente 80 bilhões de roupas anualmente, de acordo com dados levantados pelo documentário “O verdadeiro custo” (The true cost, 2015). Esse mercado é puxado principalmente pelos Estados Unidos, onde a indústria de vestuário vende anualmente 20 bilhões de peças por ano, sendo o segundo maior setor de consumo do país. “A indústria têxtil é poluente devido ao uso excessivo de água, pesticida, outros químicos e uso de cadeias globais de transporte”, destaca o gestor ambiental e sócio-fundador do projeto Retalhar, Jonas Lessa.
De acordo com a estilista e criadora do site Moda Limpa, Marina de Luca, o impacto da área no meio ambiente se dá principalmente em dois períodos: no “nascimento” do tecido e no final do seu ciclo de vida. A especialista explicou o que ocorre nesses momentos com três tipos diferentes: natural, viscoses de celulose e bambu e sintéticos.
Tecidos naturais
São produzidos a partir de plantas, como o algodão, ou possuem origem animal, caso do fio da seda. “A plantação pode utilizar agrotóxicos e produtos químicos, muita água, espaço de terra e pode ser realizada por mão de obra análoga à escravidão ou com trabalho infantil”, alerta a especialista.
Contra os agrotóxicos, consuma roupas feitas com algodão orgânico, que leva selo de autenticação. “Por virem da natureza, elas se decompõem naturalmente e se transformam em adubo para a terra, evitando a ocupação de espaço no lixo”, explica de Luca. Contudo, a decomposição pode ser poluente dependendo do processo passado pelo tecido, como o tingimento. “É mais comum a cor da peça ser conquistada por ação de produtos químicos. Ao se decompor, ela polui o ambiente onde foi descartada.”
Viscoses
Também chamada de tecido “artificial”, a viscose é retirada da natureza, da celulose de troncos de árvores ou do próprio bambu. “Esta passa por um processo laboratorial para se transformar em uma fibra, que pode ser muito ou pouco poluente, dependendo de cada método utilizado”, aponta.
As viscoses têm pouca durabilidade e exigem 640 litros de água para produzir um quilo do material, de acordo com dados do site eCycle. “Apesar de o bambu ser uma planta mais sustentável, o tecido não é feito diretamente da plantação, por isso o consideramos de alto impacto negativo para o meio ambiente”, complementa.
Caso seja realizado por meio do processo ‘zero waste’, patenteado pela empresa Lenzing, os tecidos levam um selo com marca registrada, chamando Modal, Liocel ou Tencel. “Nesse caso, são mais sustentáveis”, aponta a estilista. Também é importante saber informações sobre a plantação de bambu. “Como foi realizada, tratada e extraída”, lista.
Tecidos sintéticos
São os provenientes do petróleo, como poliéster e poliamida. “Além de terem uma extração perigosa, de alto impacto negativo para o meio ambiente e para as condições de trabalho, também demoram mais para se decompor. Seu processo de decomposição polui o ambiente”, alerta.
Eles também liberam pequenos pedaços de polímeros sintéticos com tamanho inferior a 5 mm, conhecidos como microplásticos, durante as lavagens, que podem terminar no oceano, intoxicando a vida marinha e os humanos. Segundo o relatório da fundação para economia circular Ellen Macarthur, A New Textile Economy (2017), meio milhão de tonelada desse material oriundas de roupas de tecidos sintéticos acabam nos mares ano após ano.
Escolha conscientes
Para interromper este ciclo, a primeira dica é o consumo consciente. “Procure alugar, consertar, customizar e emprestar roupas ao invés de comprar. Caso não seja possível, verifique se há selos que provem se são orgânicos, de comércio justo (Fair Trade) ou da Lenzing”, orienta de Luca.
No caso da poliamida, a única opção mais sustentável é a feita de fibra da Rhodia, que é biodegradável em um período após quatro anos. No caso do poliéster opte por tecidos de PET reciclado, “pois, pelo menos, ele está estendendo o ciclo de vida de um plástico que já existia no planeta, e também gera renda para catadores” recomenda.
A segunda dica é o reaproveitamento. Pedaços de tecidos podem ser usados como retalhos para criar colchas, almofadas e outros itens. “É fundamental considerar o resíduo para além do ‘material que sobra’. Reaproveitá-lo é respeitar e valorizar todos os recursos naturais, humanos e financeiros empregados no processo produtivo e, em última instância, significa também reduzir a demanda por novos ciclos produtivos e seus impactos negativos”, aponta Lessa.
Se a peça de roupa já foi consertada, customizada, transformada, revendida, doada e usada por várias pessoas, ela ainda pode virar pano de limpeza. “Quando não tiver mais função nenhuma, tecidos de origem natural como algodão e linho, desde que sejam 100% da mesma fibra, podem ser descartadas no lixo comum, pois se desintegram naturalmente, voltando a ser adubo para a terra”, indica ele. “Caso você tenha acesso a uma composteira grande também pode picotar e descartar lá. Lembrando que a linha de costura normalmente é de poliéster, então ela não vai se decompor “, indica.
Os tecidos sintéticos e os artificiais (incluindo a viscose de bambu) não devem ser descartados no lixo comum, já que a maioria não se desintegra. “Há uma legislação chamada Lei Nacional dos Resíduos Sólidos, que determina a responsabilidade compartilhada entre quem produziu e quem consumiu. Entre em contato com a e pergunte qual a melhor maneira de descartar aquela peça. Algumas poucas lojas também contratam empresas de logística reversa para recolhimento das roupas sem uso”, finaliza.
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Crédito da imagem: luanateutzi – iStock