O ideal é que a criança tenha um aparelho celular pessoal próprio somente a partir dos 12 anos, segundo o psicólogo do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq) Reinaldo Rodrigo de Oliveira.

“Esse é o consenso da comunidade médica e científica, mas pode variar de acordo com a realidade de cada família e maturidade da criança para lidar com os riscos do ambiente digital”, pondera.

Antes disso, não se deve apresentar nenhum tipo de tela para crianças antes dos dois anos de idade, quando é permitido o uso do aparelho de um responsável para determinadas atividades, sempre com limite de horas e supervisão.

“De dois a cinco anos, a exposição a telas deve ser de no máximo uma hora por dia. De seis a dez anos, de até duas horas por dia”, recomenda a psicóloga e professora na graduação de psicologia da FACCREI Larissa Krüger Fernandes.

Cérebro em formação

O principal motivo para evitar dar um celular precocemente às crianças é que o cérebro ainda está em formação, e a exposição pode prejudicar o desenvolvimento cognitivo e socioemocional.

“O ser humano precisa de uma ampla gama de atividades que permitam a aquisição de habilidades de maneira integrada. Ao brincar no escorregador, a criança de dois anos, está desenvolvendo, em sua dimensão física, coordenação motora global, equilíbrio, noção de peso e espacialidade, temperatura e pressão, entre outros”, exemplifica Fernandes.

“Cognitivamente, aprende sobre causa e efeito, temporalidade e que os objetos têm uma representação simbólica pela linguagem. Estar em frente a uma tela é muito pobre em relação a esses estímulos integrados”, adverte.

A  manipulação física de diferentes objetos também é improtante nessa fase, como foi apontado pelo psicólogo e pensador Jean Piaget. “A criança até dois anos só pode aprender o que é areia e como ela se comporta ao manipulá-la”, contextualiza Fernandes.

Para complementar, o uso precoce do celular traz prejuízo socioemocional. “Interfere no sono, eleva o risco de ansiedade e dificulta o desenvolvimento de habilidades sociais, como empatia e comunicação interpessoal, já que as interações humanas presenciais, essenciais para o aprendizado emocional nos primeiros anos de vida, estarão reduzidas”, sintetiza Oliveira.

“Estima-se que crianças com menos de dois anos expostas de uma a quatro horas diárias a telas têm até 4,8 vezes mais risco de apresentar atraso na comunicação”, informa.

“Crianças que recebem mais de uma hora extra de tela por dia têm aumento de cerca de 22% nos surtos de raiva um ano depois. Usar telas para acalmar birras dificulta o desenvolvimento de autocontrole emocional, resultando em mais desregulação”, conclui.

Fatores a considerar

Antes de  entregar um celular a uma criança para uso pessoal, Oliveira explica que os pais devem avaliar o nível de maturidade emocional e cognitiva da criança para lidar com os riscos do ambiente digital, como exposição a conteúdos inadequados, cyberbullying, vício em telas e perda de privacidade.

“Deve haver diálogo claro sobre os riscos e orientações práticas sobre como agir em situações desafiadoras, além de definir previamente o propósito do uso do aparelho: se para entretenimento, estudos, comunicar-se com amigos… E é preciso estabelecer regras e limites desde o início”, orienta.

“O celular não deve ser apenas um presente, mas uma porta de entrada para o mundo digital. Isso exige preparo, orientação e presença ativa da família”, acrescenta Oliveira.

Também deve-se avaliar se o uso do celular está sendo motivado por recompensas externas ou pressão social

“Muitos aplicativos utilizam notificações e são projetados com mecanismos de recompensa, como curtidas, que ativam o sistema de recompensa cerebral, reforçando comportamentos por meio do prazer imediato”, justifica Oliveira.

Para completar, contexto familiar e socioeconômico também influenciam na decisão de dar um celular para crianças. “Famílias com rede de apoio limitada usam telas como recurso para cuidar de tarefas domésticas ou trabalho, mantendo as crianças ocupadas. Pais mais estressados ou com menos habilidades de autorregulação impõem menos limites ao uso das telas dos filhos. Por fim, possuir o aparelho pode simbolizar status, o que pode sobrepor preocupações sobre os riscos dele”, complementa.

Monitoramento

Até os 15 anos de idade, Fernandes defende o monitoramento do celular, como ocorre com computador, videogame e televisão, não deixando o aparelho ao alcance de crianças e jovens no período da noite. “É um horário em que ocorrem com maior frequência os crimes e que traz prejuízo ao sono, fundamental para o bom funcionamento do organismo, do cérebro e na prevenção de ansiedade e depressão”, enfatiza.

Além disso, é preciso considerar como a criança ou adolescente reagirá em situações em que o uso do aparelho seja restringido pelos adultos.

“A geração atual de crianças e adolescentes identifica o celular como espaço pessoal privado, como era, por exemplo, o diário no passado. Portanto, a restrição do aparelho é entendida como uma invasão de privacidade. É necessário conscientizá-los do que significa essa ferramenta e a necessidade do monitoramento intensivo”.

Segundo a psicóloga, a partir dos 15 anos, é importante investir no diálogo para que, ao sinal de qualquer evento estranho, o adolescente tenha liberdade de conversar com os responsáveis.

Veja mais:

O que é controle parental e como fazê-lo?

Como orientar adolescentes e crianças sobre compras online?

Crédito da imagem: Klaus Vedfelt – Getty Images

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