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Marcelo Abud

O “Relatório da violência contra jornalistas e liberdade de imprensa no Brasil”, produzido pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e apresentado no dia 16 de janeiro, mostrou um crescimento de mais de 50% dos casos de agressão contra esses profissionais no Brasil entre 2018 e 2019.

Outro relatório, este da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), divulgado no ano passado, aponta que o Brasil é um dos países mais perigosos do mundo para profissionais da comunicação trabalharem.

“Nesse levantamento, o Brasil é o sexto país com maior caso de homicídios de jornalistas, e só abaixo de países que vivem situações de crises políticas, de refugiados, institucionais e sanitárias”, analisa o jornalista e coordenador da área de jornalismo e liberdade de expressão do Instituto Vladimir Herzog, Giuliano Galli, ouvido neste podcast.

Para lutar contra essa realidade, em 2015, começou a ser planejada a Rede Nacional de Proteção a Comunicadores e Jornalistas. “A rede vem para isso, para se tornar uma referência, para ser um instrumento de proteção que possa ser realmente conhecido por jornalistas e comunicadores no Brasil inteiro”, afirma Galli.

Essa postura está expressa no lema, “a segurança dos jornalistas é a segurança de todos nós”, que norteia as atividades do grupo, cujo principal objetivo consiste em ajudar a sociedade a evitar que outros jornalistas tenham o destino trágico de Vladimir Herzog, ilegalmente detido, torturado e assassinado em 1975.

Muito além da segurança pessoal dos profissionais que trabalham em veículos de comunicação, o coletivo também busca fortalecer a liberdade de expressão.

“A gente protege jornalistas e comunicadores, por entender que eles são agentes fundamentais para o funcionamento da democracia. Quando a atuação deles é comprometida, todo esse sistema político também é. Por isso que a segurança deles é, na verdade, a segurança de todos nós”.

Além do Instituto Vladimir Herzog, que encabeça a iniciativa, a rede conta, por exemplo, com a Artigo 19, organização internacional com forte atuação no Brasil, a Repórteres sem Fronteiras, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o Intervozes e pequenos coletivos espalhados pelo país.

“O Instituto Vladimir Herzog leva o nome de um jornalista que foi brutalmente torturado e assassinado, naquele que talvez seja o caso mais emblemático de violação de liberdade de expressão do país. Então, é obrigatório que a gente atue de alguma forma no sentido de garantir essa liberdade”, conclui Giuliano Galli.

Foto de um homem de cabelos curtos e escuros e barba curta na frente de uma parede com diversas fotos antigas
O jornalista e coordenador da área de jornalismo e liberdade de expressão do Instituto Vladimir Herzog, Giuliano Galli (crédito: Marcelo Abud)

Transcrição do áudio:

Música de Reynaldo Bessa de fundo

Giuliano Galli
A gente defende jornalistas, a gente defende comunicadores não por entender que essas pessoas são seres especiais, são seres privilegiados, mas, porque o jornalismo tem um papel fundamental no funcionamento da democracia. E, quando os jornalistas ou comunicadores são ameaçados, ou são agredidos, é porque a democracia não vai bem. Por isso que a segurança deles é, na verdade, a segurança de todos nós. E o nosso papel é justamente fazer com que a democracia vá bem, com que a democracia prospere e que toda a população se conscientize da importância da defesa da liberdade de expressão.

Meu nome é Giuliano Galli, sou jornalista e, aqui no Instituto Vladimir Herzog sou o coordenador da área de jornalismo e liberdade de expressão. 

Vinheta Instituto Claro – Cidadania
Marca sonora 

Música instrumental de Reynaldo Bessa permanece de fundo

Marcelo Abud
Por que várias entidades estão empenhadas na criação de uma rede nacional de proteção a comunicadores e jornalistas? Nesta edição, você acompanha como funciona e que resultados vêm sendo obtidos por esse coletivo. O Instituto Claro ouve o coordenador da área de jornalismo e liberdade de expressão do Instituto Vladimir Herzog, que está à frente dessa articulação, Giuliano Galli.

Giuliano Galli
Principalmente, a partir de 2013, que teve aquela onda de manifestações no mundo inteiro, as atividades jornalísticas passaram a ser alvo de ataques não só das pessoas que assumiram o poder, baseado nessas ideias de direita, mas também dos apoiadores desses governantes. Então, o cenário para o jornalismo no Brasil e no mundo é esse: quem faz circular ideias divergentes de quem está no poder vai ser atacado, vai ser tratado como inimigo.

Música: “Se liga aí” (Gabriel O Pensador)

A gente pensa que vive num lugar onde se fala o que pensa.
Mas eu não conheço esse lugar.
Eu não conheço esse lugar!
A gente pensa que é livre pra falar tudo que pensa, mas a gente sempre pensa um pouco antes de falar!

Marcelo Abud
Um levantamento divulgado em meados de 2019 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), aponta o Brasil como um dos países mais perigosos do mundo para jornalistas trabalharem.

Giuliano Galli
Ele fala, especificamente, sobre casos de homicídio de jornalistas. E esse, talvez, seja o levantamento mais preocupante para a gente. Porque nesse levantamento o Brasil é o sexto país mais perigoso do mundo, é o sexto país com maior caso de homicídios de jornalistas e só está na frente de países que vivem situações de crises políticas, crises de refugiados, crises institucionais, crises sanitárias. Então, entre os países que estão democraticamente estáveis, que estão politicamente estáveis, o Brasil é o pior país, segundo a Unesco, para o exercício da atividade jornalística.

Marcelo Abud
A rede nacional de proteção a comunicadores e jornalistas começa a surgir a partir da união de entidades de defesa dos direitos humanos e da liberdade de expressão.  

Giuliano Galli
Na verdade, a partir de 2013, a gente entendeu que precisava fazer alguma coisa que dialogasse diretamente com as pessoas que são agredidas, que são atacadas. O nosso movimento foi convocar pessoas, instituições e organizações que já atuavam nesse sentido, para entender de que forma a gente poderia contribuir sem repetir aquilo que já estava sendo feito. Depois de uma série de conversas, de uma série de divagações, nos foi colocada a necessidade de se fazer uma articulação entre as iniciativas que já existiam. Ou seja, tinha uma série de entidades que se dedicavam a produzir relatórios, tinham entidades que faziam defesa jurídica, entidades que faziam veículos de comunicação para denunciar os casos de agressão, mas não tinha ninguém que articulasse isso tudo para fortalecer justamente essa ideia de proteger quem está sendo agredido. Então, foi isso que a gente decidiu que deveria fazer: juntar essas organizações, juntar essas iniciativas para formar uma grande rede de pessoas, de organizações para garantir a proteção de jornalistas e comunicadores.

Música: “A música que todos deveriam saber a letra” (Conselho Nacional do Ministério Público)

“Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião, de transmitir informações e ideias, por qualquer meio de expressão.”

Giuliano Galli
Dentro dessa rede a gente tem, por exemplo, a Artigo 19, que é uma organização internacional, mas que tem uma atuação muito forte no Brasil; a Repórteres sem Fronteiras, o escritório da América Latina é parceiro nessa rede; a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, a Abraji, também está nessa rede; o Intervozes; e vários outros pequenos coletivos e pequenas organizações do Brasil inteiro, que também fazem parte dessa rede e são espécies de pontos focais, para que essa rede chegue de fato nas cidades mais afastadas dos grandes centros.

Marcelo Abud
Os primeiros encontros aconteceram em 2015. No final do ano passado, a reunião contou com representantes das 27 unidades federativas que compõem o país.

Giuliano Galli
A gente já tem recebido relatos de comunicadores que estão sendo ameaçados. A gente já tem conseguido se posicionar frente às ameaças que são públicas, que tiveram grande repercussão. Então, é uma rede que está em construção, mas já está em atuação também. E esse é o nosso principal projeto, atualmente do Instituto, em relação à defesa da liberdade de expressão.

Marcelo Abud
Giuliano Galli cita um dos primeiros casos em que a rede atuou na proteção de um jornalista.  

Giuliano Galli
No final de 2017, aqui no Taboão da Serra, uma cidade aqui da Grande São Paulo, um chargista de um veículo local estava sendo constantemente ameaçado. Ele estava fazendo uma série de charges denunciando o abuso da cobrança de uma taxa de lixo da prefeitura de Taboão da Serra. O nome desse chargista é Gabriel Binho e ele estava sendo ameaçado. Estava sendo ameaçado pelo prefeito, por alguns secretários do prefeito, até que teve um dia que ele estava voltando para casa de moto. Ele foi realmente atacado, realmente foi vítima de uma tentativa de homicídio e ele conseguiu escapar por detalhe. Na verdade, nesse momento a moto dele caiu, um dos tiros atingiu a moto dele, ele caiu do lado da estrada, fingiu que tinha morrido e o agressor foi embora achando que de fato ele tinha morrido. 

Áudio do Brasil Urgente, da TV Bandeirantes, com notícia sobre atentado

“O carro veio me pressionando pra me tirar da pista, eu acelerei a minha moto, quando eu acelerei ele bateu com o para-lama dianteiro e bateu na traseira da minha moto fazendo com que eu caísse. Aí ele já voltou efetuando os disparos. O primeiro disparo eu me deitei na vala; daí eu escutei mais dois disparos…”          

Giuliano Galli
O Binho, e a redação do jornal que ele trabalhava, nos procurou naquele período entre festas de final de ano, começo de ano, e eles vieram até a sede do Instituto Vladimir Herzog denunciar o que tinha acontecido. A gente estava justamente neste momento de conversa com outras instituições, de entender exatamente qual seria o nosso papel nesse grande movimento em defesa da liberdade de expressão e esse caso foi um condutor da nossa atuação. Porque ali a gente percebeu exatamente o que tinha que fazer e foi o que a gente fez.

A gente fez com que esse relato chegasse a grandes veículos. Então, a gente publicizou a tentativa de ataque que ele sofreu. O caso foi retratado pela TV Bandeirantes, pela TV Globo, pela TV Record e outros veículos. Paralelo a isso, a gente conseguiu falar com um representante do ministério público, que garantiu que o caso dele seria defendido juridicamente da forma necessária e de fato aconteceu isso. De fato, o Binho acabou se tornando uma pessoa referência ali na região dele, mas a repercussão rompeu os limites de Taboão da Serra e chegou no Brasil inteiro. Ficou constatado que a tentativa de homicídio partiu de um secretário do prefeito de Taboão, a justiça investigou o caso.

Giuliano Galli
Depois disso, tiveram outros casos de menor proporção, de menor gravidade, mas que a gente manteve esse modus operandi: de primeiro fazer com que o caso chegue ao conhecimento do público, porque isso causa um constrangimento, isso causa uma conscientização para a população, que é absolutamente fundamental. E, também, garantir a defesa jurídica e a proteção do profissional que é ameaçado.

Música instrumental de Reynaldo Bessa fica de fundo

Marcelo Abud
Além da segurança pessoal dos jornalistas e de todos os profissionais que trabalham em veículos de comunicação, a rede tem como objetivo fortalecer a liberdade de expressão.

Com apoio de produção de Daniel Grecco, Marcelo Abud para o Instituto Claro.

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