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Em julho de 2023, a Lei nº 14.624 alterou o Estatuto da Pessoa com Deficiência e instituiu o uso do cordão de fita com desenhos de girassóis como símbolo nacional para identificação de pessoas com deficiências ocultas. O acessório é feito com um tecido verde e, segundo a integrante da Comissão de Inclusão e Pertencimento do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo Viviane Pitta Salgado de Azevedo, proporciona segurança e conforto para quem o usa.

“Ele [o girassol] é um símbolo de resiliência, por isso que ele entrou como o símbolo de deficiências ocultas, e representa a solidariedade e compreensão. Mas tenho que ainda explicar para as pessoas, porque infelizmente a política de divulgação do colar de girassol não abrangeu o tanto que deveria atingir na sociedade”, lamenta Azevedo, que tem uma doença rara não visível – stiff person syndrome, a síndrome da pessoa rígida – e utiliza o cordão de girassol.

Azevedo explica que nem sempre é possível identificar visualmente uma deficiência. “Podem ser doenças raras, pode ser vinda de pessoas neurodivergentes que estão dentro do aspecto do TEA [transtorno do espectro autista], pessoas com transtorno de ansiedade, transtorno de humor”, completa.

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                        Viviane Pitta Salgado de Azevedo (crédito: acervo pessoal)

Para ela, é necessária uma grande campanha para que as pessoas entendam o que é e para que serve o cordão de girassol. “Eu acho que a gente tinha que ter mais força por parte do governo e por parte dos veículos de comunicação de divulgarem isso, essa importância do colar. Uma divulgação em massa em transporte público, em metrô seria sensacional”, analisa.

Azevedo aponta que essa carência e a facilidade de encontrar o acessório livremente em diversos tipos de comércio estimulam quem não precisa a comprar o cordão como simples adorno e suporte para crachá.

“Ele [cordão de girassol] é vendido em camelô, loja de papelaria, sem critério nenhum de bloqueio, a qualquer pessoa. Muita gente vai atrás da beleza, então acaba comprando, e aí invalidando as pessoas que realmente precisam daquilo”, alerta.

Clique no botão acima e ouça a íntegra da entrevista.

Atualizado em 29/02/2024, às 11h44.

Transcrição do Áudio

Música: Introdução de “O Futuro que me Alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Viviane Pitta:

Me considero uma pessoa portadora de deficiência física invisível, por isso que eu tento divulgar ao máximo o uso do colar de girassol, porque, na minha vivência diária, tanto no trabalho quanto o lazer, ele se faz necessário.

Sou Viviane Pitta Salgado de Azevedo, eu sou portadora de uma síndrome rara, chama stiff person síndrome. Fui recentemente reintegrada ao trabalho. Tenho 42 anos, sou funcionária da USP.

Vinheta: Instituto Claro – Cidadania

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:

Desde julho de 2023, o Estatuto da Pessoa com Deficiência instituiu o uso do cordão de fita com desenhos de girassóis como símbolo nacional para identificação de pessoas com deficiências ocultas.

Integrante da Comissão de Inclusão e Pertencimento do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, Viviane Pitta de Azevedo explica por que é importante que essa identificação aconteça.

Viviane Pitta:

As doenças ocultas são aquelas que as pessoas olham para o indivíduo e não conseguem ver aquela doença aparente, né, ela não vê aquilo na apresentação da pessoa. Ela pode ser: doenças raras, como a minha, ela pode ser vinda de pessoas neurodivergentes que estão dentro do aspecto do TEA, né, pessoas com transtorno de ansiedade, transtorno de humor, doença de Crohn.

São doenças que visualmente as pessoas não conseguem ver, diferente de uma pessoa com deficiência física aparente, cadeirante, pessoa que usa bengala.

Uma doença não aparente, ela dificulta pra sociedade a visibilidade e a importância da necessidade da pessoa de um tratamento diferenciado numa situação, então pessoa olha para uma pessoa com uma deficiência não aparente e acha que é uma pessoa neurotípica, sem problema nenhum, e aí não vai diferenciar essa pessoa. Então ela dificulta o convívio em sociedade, bem mais difícil de se viver no dia a dia.

Marcelo Abud:

Viviane é usuária do colar de girassóis há cerca de um ano e meio.

Viviane Pitta:

O colar de girassóis tem uma textura acetinada, né, tem um fundo verde, com flores de girassol com miolo, né, o centro amarronzado e as pétalas amareladas. Ele tem flores de girassol grandes e pequenas. Na ponta, ele tem um espaço para colocar o crachá e o meu, no caso, tem um QR Code gravado os meus dados médicos, no caso de emergência, e atrás a gente tem o meu CID – Código Internacional de Doenças – e o telefone do responsável, no caso de emergência também, pra pessoa contactar.

As pessoas que têm direito ao colar são pessoas que têm deficiências invisíveis e são diagnosticadas por médicos, né? Não são pessoas que acham que tem alguma coisa, são pessoas que passaram por um teste, exames médicos e foram diagnosticadas. Pessoas que têm um CID – Código Internacional de Doenças – laudado por um médico, né?

Marcelo Abud:

O girassol é um elemento visual para que pessoas com algum tipo de condição invisível sejam facilmente reconhecidas. Viviane lamenta que a maior parte das pessoas ainda desconheça a verdadeira finalidade do cordão.

      Viviane Pitta:

Ele é um símbolo de resiliência, por isso que ele entrou como o símbolo de deficiências ocultas e ele representa a solidariedade e compreensão. Ele acaba resguardando as pessoas que, às vezes, muitas pessoas não querem se expor, né? É muito constrangedor, a gente já tem uma deficiência e a gente chegar num lugar e ter que ficar relatando, abrindo laudo médico, enfim, porque a gente precisa pegar uma fila de prioridade.

Então, uma vez o colar reconhecido, né, as pessoas já batendo o olho, entendendo o significado do colar, isso já te coloca numa situação de mais conforto, porque não é preciso você ficar relatando qual o seu problema de saúde, qual a sua deficiência, e você já consegue ser atendido de uma forma mais correta que você precisa ser atendido.

O uso do colar traz essa facilidade porque a gente não precisa ter o diálogo de ficar se explicando, ficar se afirmando, comprovando que você tem a doença, e facilitaria muito se essas pessoas soubessem mais disso, na verdade. Mas tenho que ainda explicar para as pessoas, porque infelizmente a política de divulgação do colar de girassol não abrangeu o tanto que deveria atingir na sociedade, que eu acho que as pessoas ainda não sabem.

Marcelo Abud:

A falta de uma divulgação mais ampla sobre o que é e qual a importância do colar de girassóis faz com que muitas vezes ele seja adquirido como um acessório para, por exemplo, portar crachá.

Viviane Pitta:

Ele é vendido em camelô, loja de papelaria, assim, sem critério nenhum de bloqueio. Ele é vendido a qualquer pessoa. E o colar sendo assim, de fácil acesso para todo mundo, o que que acontece? Muita gente vai atrás da beleza, então acaba comprando e aí invalidando as pessoas que realmente precisam daquilo, né? Porque, além de a pessoa falar “Nossa, como é lindo o seu colar, ele é muito bonito”, ele não é bonito, né, ele é pra gerar conforto pra aquela pessoa que é portadora de uma deficiência oculta. É bem difícil isso.

Marcelo Abud:

Para evitar que o colar ou cordão seja usado de maneira inadequada, Viviane defende que haja um maior empenho na divulgação desse símbolo que identifica deficiências ocultas ou doenças raras.

Viviane Pitta:

Eu acho que a gente tinha que ter mais força por parte do governo e por parte dos veículos de comunicação de divulgarem isso, né, essa importância do colar. Eu acho que a gente tinha que ter uma campanha mais forte a nível nacional, divulgando todos os critérios e tudo isso que a gente já falou e toda a importância do colar. Eu acho que tinha que ter uma ampla divulgação nesses ambientes privados. Forçar esses ambientes a treinarem os funcionários a saberem também que o colar de girassol é tão importante quanto o do quebra-cabeça, que é pra pessoas neurodivergentes. E aí, em uma divulgação em massa em transporte público, em metrô seria sensacional, né?

E, além disso, eu acho que uma campanha com doação de colar, porque não é todo mundo que tem acesso, né, financeiramente, para comprar o colar e o crachá.

Então eu acho que a gente tinha que ter uma força com o governo para isso.

Marcelo Abud:

A entrevistada fala da experiência pessoal e relata uma das poucas vezes em que a função do colar de girassol que utiliza foi devidamente identificada.

Viviane Pitta:

Surpreendente que, na feira, tinha um deficiente auditivo do meu lado e eu estava com o colar. E tinha uma senhora. E o dono da barraca começou a explicar para a senhora que eu estava com o colar e que eu tinha prioridade no atendimento. E eu fiquei assim: “Nossa, ele sabe, meu Deus!”. Fiquei muito surpresa e muito feliz.

E aí ele explicou que eu tinha prioridade e ele sabia que o rapaz que estava do meu lado, que era deficiente auditivo, também precisava do colar. E aí ele pediu pra eu explicar pro rapaz onde ele conseguia um colar.

Eu fiquei muito feliz e me senti muito acolhida por parte desse feirante, carrego ele no coração depois que ele abordou com tanto carinho a mim e ao rapaz que estava do meu lado. E ele falou para mim que ele viu numa matéria na TV. Eu questionei pra ele, como ele sabia? E ele falou que ele viu numa matéria da TV. E eu fiquei muito feliz!

Música instrumental, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Marcelo Abud:

A utilização do colar de girassol é opcional e não altera os direitos e garantias previstos em lei para essas pessoas.

Marcelo Abud para o podcast de cidadania do Instituto Claro.

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