Doar sangue ainda não é um hábito incorporado na rotina do brasileiro. Dados da Organização Pan-Americana de Saúde, de 2015, apontam que somente 1,8% da população entre 16 e 69 anos no país são adeptos da prática. Número bem abaixo da média do Japão, Estados Unidos e nações europeias, que varia entre 3% a 5%.

Mas, afinal, qual o motivo da baixa adesão? “Ao contrário de outros países, o Brasil não enfrentou guerras, catástrofes e fenômenos naturais que exigissem da população a necessidade de doações frequentes para as vítimas. Isso acaba construindo um hábito e a consciência de que não há um substituto para o sangue”, opina a médica hematologista da Fundação Pró-Sangue, Renata Paula Panzani de Moraes Barros.

“Penso que há uma questão de educação, principalmente em relação às crianças, e também de informação. Ainda há muitos mitos relacionados à doação que precisam ser combatidos”, complementa Maria Angélica de Camargo Soares, coordenadora do setor de doação de sangue e sorologia do Hemocentro da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

A possibilidade de dor ou de mal-estar durante o procedimento são alguns dos medos que afastam possíveis doadores. “Passar mal, por exemplo, é algo muito raro”, tranquiliza Barros. Além disso, outro receio comum é do teste revelar problemas de saúde. “O sangue é testado para doenças infecciosas. Mas não há testes, por exemplo, de colesterol, triglicérides e afins, como alguns pensam”, desmistifica.

Todo o sangue doado é testado para doenças infecciosas transmissíveis, como hepatites B e C, HIV, sífilis e chagas. Na sequência, o material coletado passa por uma separação de hemácias, plasma e plaqueta. “As hemácias são geralmente usadas em dois dias e mantemos um estoque de plasma de um ano, no freezer. Já as plaquetas são direcionadas para pessoas em transplante de medula ou em quimioterapia, que enfrentam problemas hematológicos. Seu uso, em média, é após cinco dias da coleta”, diz Barros.

Impedimentos

Em linhas gerais, brasileiros entre 16 e 69 anos, com mais de 50 quilos, podem doar sangue. Os menores de 18 anos necessitam de autorização de um responsável. Após os 60 anos, a pessoa só poderá doar se já tiver feito isso antes.

“A restrição do peso tem como motivo a proporção de anticoagulante que é colocada nas bolsas. Cada bolsa coleta de 400 a 450 ml, e que tem menos de 50 kg não consegue colher esse volume. Assim, teríamos menos sangue e mais coagulante, o que inviabilizaria o seu uso”, explica Soares.

Além disso, há impedimentos definitivos, como ter alguma doença infecciosa crônica, e temporários. No segundo caso, a lista inclui resfriado (sete dias após o fim dos sintomas); gravidez e lactação; tatuagem (12 meses); cirurgia odontológica (quatro semanas); acupuntura (12 meses); e qualquer procedimento endoscópico (seis meses). “Pouca gente sabe sobre o impedimento causado pela endoscopia e pela colonoscopia. Isso faz muito doador perder a viagem”, adverte.

Segundo ainda Soares, outro mito comum é referente ao uso de antidepressivos e outros medicamentos. “Não há veto para antidepressivos. Em relação a outras medicações, avaliamos a presença da doença e seus sintomas, não o uso do remédio em si”, acrescenta.

Aos homossexuais, é necessário um período de um ano sem práticas sexuais – mesmo que essas sejam realizadas com preservativo e dentro de uma relação estável monogâmica. O mesmo não é pedido aos heterossexuais. Segundo Soares, a restrição ocorre baseada na maior incidência do vírus HIV na população homossexual quando comparada à heterossexual, registrada em pesquisas científicas.

Já para Lucas Siqueira, diretor adjunto Grupo Dignidade e da Campanha “Igualdade na Veia”, o veto reforça a ideia de “grupo de risco” – forjada nos anos 80, durante a epidemia de Aids. “Qualquer pessoa está sujeita a uma infecção sexualmente transmissível. Hoje, todo o sangue é analisado, e os testes possuem janelas imunológicas menores. Assim, não vejo outro motivo a não ser preconceito”, reforça.

Países como Argentina e Espanha já retiraram o impedimento. No Brasil, o Supremo Tribunal Federal analisa a alteração na legislação.

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