Em 12 de agosto de 1988, o mundo das artes perdia o artista plástico Jean-Michel Basquiat com apenas 27 anos. Três décadas depois, o jovem com ascendência afrocaribenha é referência nas artes plásticas e tem obras com alto valor financeiro. Em 2017, uma de suas telas foi vendida por US$ 110 milhões.

Segundo o antropólogo e curador da mostra “Histórias Afro-Atlânticas” (MASP/Tomie Ohtake), Hélio Santos Menezes Neto, a importância de Basquiat para as artes pode ser assunto das aulas de educação artística.

“Sua produção obrigou o mundo das artes a direcionar atenção para o que era realizado nas ruas, como o grafite, o piche e as colagens. Obrigou a entender essas linguagens a partir do que são: arte”, explica. “Além disso, as questões raciais e da população negra nos Estados Unidos perpassa grande parte da sua produção, podendo ser trabalhadas nas aulas de história”, complementa.

Qual a importância do Basquiat para as artes?

Hélio Menezes: Sua produção obrigou o mundo das artes a direcionar atenção para o que era realizado nas ruas, como o grafite, o piche e as colagens. Obrigou a entender essas linguagens a partir do que são: arte. Com isso, Basquiat denunciava que a arte não estava restrita a espaços de prestígios ou frequentados apenas pela elite, podendo se manifestar em todos os lados, como as ruas. Além disso, ele foi um artista negro em um ambiente povoado por pessoas brancas. Basquiat foi uma exceção a essa regra.

Quais técnicas o artista utilizava e que os alunos de educação artística podem observar?

Menezes: Basquiat começou a desenvolver sua carreira como artista visual e plástico no final dos anos 70 e início dos 80. Foi pintor em um período em que a pintura voltava a ocupar a centralidade nas artes norte-americanas. Antes disso, a serigrafia (reprodução de imagens em papel e madeira), da Pop Art, estava no auge. Ele utilizou linguagem e suportes variados. Produziu pinturas, desenhos, colagens, e transpôs técnicas do grafite para cartão postais, papelão, paredes e grandes telas. Sobre a sua identidade, muitas vezes, aparecem em sua obra desenhos sem contorno, preenchimento irregulares e manchas de cor. Há uma profusão de palavras e saturação de signos, como a coroa, que viraria quase que uma assinatura. Criou um alfabeto de signos próprios que são arranjados e se conectam e se unem. Signos e palavras que nem sempre são evidentes.

Quais eram os temas mais recorrentes em sua obra?

Menezes: Ele era filho de migrantes e tinha ascendência afrocaribenha. Foi autodidata em formação: ele mesmo empreendeu seus estudos sobre anatomia humana, história da arte, frequentava galerias e se relacionava com artistas de outras linguagens. Esse tipo de bibliografia formou muito dos temas que aparecem em sua obra, como o corpo humano, o corpo negro, temas religiosos, personalidades negras da música e dos esportes. A questão racial e a história da população negra na história dos Estados Unidos perpassa grande parte da sua produção.

Como abordar o Basquiat em sala de aula?

Menezes: Penso que a partir dos temas que eram caros para ele nos anos 80 e que continuam contemporâneos, por exemplo, como o racismo e a violência policial. Há uma técnica que o poder público usa para pintar por cima de grafites chamada “defacement”. Basquiat nomeia um quadro sobre o assassinato de um jovem negro pela polícia com o nome dessa técnica (Defacement – The death of Michael Stwart). É algo a ser pensado.

Ele também usava a sua obra para satirizar o próprio mundo das artes e a sua falta de diversidade. E, apesar de ser um artista caro e reconhecido, foi vítima de racismo no mundo das artes. O crítico Robert Hughes o chamou de “pequeno e maltratado talento” e atribui o seu sucesso ao fato de ser negro. Com isso, Hughes faz uma inversão perversa, porque é justamente por serem negros que muitos artistas não entram nas galerias. Sua negritude é usada inversamente como passaporte, como se ele não tivesse valor artístico. Esse é outro tema que pode ser pensado.

Por fim, ele pode ser utilizado nas aulas de história. Sua arte está além da sua biografia, conversando diretamente com fatos e com o momento histórico em que viveu. E isso pelo ponto de vista de alguém nascido na classe baixa.

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