A Constituição da República determina que a União não aplique menos que 18% da receita dos impostos em educação, e os estados e municípios, não menos que 25%. Contudo, o discurso de posse do ministro da Economia Paulo Guedes colocou governadores e secretários estaduais em alerta, ao afirmar que desvincularia esse retorno para essa área e a de saúde, caso a reforma da previdência não fosse aprovada.
“O fim do financiamento é hoje a principal ameaça à educação”, analisa o secretário da representação do governo do Maranhão em Brasília, Ricardo Cappelli. Ele foi um dos palestrantes da mesa “As ameaças ao sistema educacional brasileiro”, ocorrida na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), na quarta-feira (31/1).
“Com uma canetada, um burocrata do governo federal corta o investimento e estrangula todo o sistema educacional. É como se dessem um carro sem gasolina e dissessem: roda com ele. Assim, não adianta fazermos políticas públicas e assinarmos decretos: sem dinheiro para educação, os programas ficam inviabilizados”, ressaltou.
Há quatro anos, o estado do Maranhão tem investido na área: é atualmente o maior piso salarial inicial do professor de 40h no Brasil, de R$ 5.750; ampliou programas de alfabetização e de escola integral e conseguiu avançar no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) da 19ª posição para a 13ª no ranking nacional do ensino médio.
“Nossos programas educacionais, por exemplo, precisaram ser financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e Banco do Brasil. A ideia firme do ministro é avançar nos cortes dos recursos de educação e saúde. Um projeto severo que visa apostar no estado mínimo e reduzir a possibilidade do financiamento pelos estados. Se isso acabar, não temos como avançar”, lamenta.
“A luta dos educadores anteriormente era para ampliar o acesso à educação com o financiamento do pré-sal. Os esforços agora devem ser para que o mínimo de receita não se perca e a vinculação continue financiando os programas educacionais”, sugere.
Militarização e EAD
Para o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e cientista político, Daniel Cara, o que julga ser um direcionamento para diminuir os investimentos à educação é uma continuidade do que foi iniciado com a Emenda Constitucional 95, de 2016, que congelou os investimentos nessa área a um teto por 20 anos.
“Há um risco que a educação sofra com a chamada economia uberizada, onde duas instâncias são mediadas por uma terceira, sem que esta última tenha responsabilidades legais. Algo como o que aconteceu em 2016 quando a prefeitura de Ribeirão Preto pensou em contratar professores por aplicativo. Conseguimos coibir naquele momento, mas é algo que pode voltar”, analisou.
Segundo Cara, o governo de Jair Bolsonaro possui um caráter ultraliberal e ultraconservador, o que refletirá nas suas políticas educacionais. Um exemplo foi o anúncio da criação de uma secretaria no Ministério da Educação para fomentar colégios cívico-militares nos municípios. Essas instituições de ensino deixariam de ser responsabilidade da secretaria de educação e passariam para a pasta de segurança pública.
“A militarização é a resposta aos anseios do bolsonarismo, que acredita que a escola é um espaço de ‘doutrinação’ e ‘erotização’. Como seu pensamento é dicotômico, ele acredita que para ter disciplina é necessário acabar com a pedagogia”, analisa.
“A escola militarizada é diferente da escola militar justamente por sair da secretaria de educação e ser administrada por uma organização de segurança, como bombeiro, polícia militar ou civil”, explica. “É difícil acreditar que um PM pode educar uma criança melhor que um professor”, diz ele, que vê, no mundo, modelos similares apenas em Bangladesh.
Também está prevista pelo governo uma medida provisória que regulamentará a educação domiciliar. Nesse caso, os projetos passam a ser responsabilidade do Ministério da Mulher, da Família e Direitos Humanos, e não do MEC.
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